COMPREENDER A LÍNGUA PORTUGUESA SERVE COMO BASE PARA A COMPREENSÃO DO INGLÊS?

“A azul de madeira casa é grande” Ou “The blue wooden house is big”?

Se estivermos falando do ponto de vista da estrutura da língua inglesa, as duas opções estão corretas, evidentemente. Para nós, será preciso reorganizar a estrutura da frase para ficar compreensível. Ficaria da seguinte forma: “a casa de madeira azul é grande”. Nesse sentido, há uma estrutura do inglês que naturalmente se diferencia do português. A questão precípua a ser respondida então é a seguinte: compreender a estrutura da língua portuguesa serve para uma melhor compreensão da língua inglesa e outros idiomas? Veremos que a questão deve ser respondida pela afirmativa.

Mas, antes de qualquer coisa, sempre que formos falar de nossa língua devemos levar em consideração que todos já dominamos esse idioma no sentido de ser ele nossa língua materna. Ainda que a pessoa não saiba ler, como é o caso do analfabeto, ela se comunica perfeitamente com as outras pessoas. Por isso, a ideia de que “eu não sei nada de português” se referindo ao conhecimento do uso gramatical está errada. O que ocorre é que todos falam em sua língua materna perfeitamente conforme a gramática, a diferença fica na questão de saber ou não explicar gramaticamente este ou aquele uso linguístico.

Ninguém fala, por exemplo, “alegres meninas estavam as” querendo dizer “as meninas estavam alegres”. Isso porque nossa mente funciona de acordo com nossa lógica de comunicação. Essa lógica está ligada à nossa estrutura interna de pensamento, isto é, nossa estrutura linguística. Nesse processo, passam a coexistirem bases linguísticas que são comuns a todas as línguas. Comunicação - conforme é definida aqui - segue o princípio da compreensão. O erro comunicativo da fala, portanto, não está no “entre para dentro” ou no “coloque a bassoura no canto” porque seu principal objetivo é a comunicação. Assim como a fala, o erro da escrita, também, sempre estará relacionado com a questão da não compreensão, diferenciando-se daquela ( da fala) justamente pela rigorosidade mais intensa com a grafia. Portanto, é no aspecto da escrita que essa questão do erro se afigura com mais intensidade. De qualquer forma, fica evidente que nós brasileiros compreendemos a nossa língua perfeitamente, embora muitos não consigam explicar os diversos usos gramaticais dessa língua, como já foi mencionado aqui.

Sempre que vamos estudar inglês, somos levados a acreditar que o mais correto é o mergulho profundo em seu uso e um esquecimento quase que total do português. Penso – contrariando essa perspectiva – que os conhecimentos prévios que temos de nossa base linguística não só pode servir para a compreensão do inglês ou de uma imensidade de outras línguas, mas também para a compreensão de todo um contexto comunicativo.

Isso porque todas as línguas possuem uma estrutura. É nesse aspecto que quero me concentrar. A estrutura da língua portuguesa possui uma lógica linguística baseada na posição dos léxicos dentro da frase ou dos períodos. Esses mesmos termos ocupam lugares diferentes quando se trata do inglês. Entretanto, não se trata de algo aleatório, muito pelo contrário, esse movimento segue uma lógica e essa lógica deve ser o ponto de partida para a compreensão de qualquer língua. É justamente a esse ponto que me refiro quando digo que devemos utilizar nossos conhecimentos a nosso favor, e de posse deles compreender melhor outros idiomas e outros conceitos. E isso se aplica aqui. Vou ser mais claro.

Geralmente as línguas seguem uma estrutura baseada em duas grandezas específicas: o sujeito e o predicado. Sujeito é a parte da oração na qual se indica o ser ou coisa, predicado é a parte da oração a qual se atribuí uma ação, uma característica ou um estado a esse ser ou coisa. Exemplo: “A casa de madeira é azul”. (The wooden house is blue”, sujeito: “the wooden house”, predicado “is blue”) Sujeito: a casa de madeira; predicado: é azul. Portanto, sujeito é o termo ao qual se diz alguma coisa e predicado é o que se diz a respeito desse sujeito. Nossa compreensão sobre nossa língua e praticamente todas as línguas passa inevitavelmente por essas duas grandes estruturas. É dentro delas que tudo acontece.

Dentro do sujeito a palavra mais importante hierarquicamente é o substantivo, no predicado é o verbo. Isso porque no primeiro as palavras se ligam ao substantivo e no segundo giram ao redor do verbo. Por isso, dizemos que o núcleo do sujeito é o substantivo e o do predicado é o verbo.

Compreendida essa base comum a praticamente todas as línguas, podemos nos aprofundar na questão principal, a saber: se compreender a estrutura da língua portuguesa serve como base para a compreensão do inglês. Essa questão serviu sobremaneira para o título desse texto. Acontece que – semanticamente – ela envolve algo mais profundo que passa pelo aprendizado de um idioma diferente para o falante comum. Parado atônito diante da realidade linguística pouco experimentada na qual agora está observando para pronunciar as primeiras frases, o brasileiro se vê diante de duas escolhas: começar do zero em outro idioma e assim como uma criança produzir seus sons primeiro balbuciando sílabas no escuro, depois pronunciando palavras repetidas e ouvindo diálogos sem compreender ou, em contrapartida, não seria preferível começar de um lugar que o assegure olhar para o horizonte com a experiência de quem já domina um idioma – a sua língua materna –, que de posse do conhecimento de uma estrutura linguística já conhecida terá mais facilidade para conhecer uma nova?

Com isso, volto para o objetivo desse texto. Para ser mais claro, citarei três coisas específicas: adjuntos adnominais, complementos nominais, e adjetivos. Mas o que isso tem a ver com o que vinha sendo explicitado? Pode questionar o mais criterioso dos leitores. Esse é o ponto central de nosso debate. Lembram do exemplo que dei no início? “A azul de madeira casa é grande” Ou “The blue wooden house is big”? Pois então, há no mínimo um aspecto conclusivo a ser observado aqui: que a mesma lógica das posições dos adjuntos e complementos nominais do português, embora em posições distintas do inglês, se aplica perfeitamente ao estudo da língua inglesa.

Exemplificando: adjuntos adnominais e complementos são palavras que giram ao redor de um substantivo ligando-se a ele em concordância. Ambos se encontram principalmente naquela parte da oração que chamamos de sujeito. No nosso exemplo anterior “a casa de madeira é azul” temos “a casa de madeira” como sujeito da oração (“a” é adjunto adnominal, “casa” é o núcleo do sujeito, “de madeira” é complemento nominal). Temos então adjunto e complemento ligados ao substantivo, isto é, ao núcleo do sujeito. Para o português essa é a estrutura comum, quer dizer, sempre que aparecer expressões como essa as posições dos léxicos sempre vão ser as mesmas. O mesmo sentido das posições dos adjuntos e complementos também serve para o inglês – diferenciando-se simplesmente na posição que eles ocupam na frase (não obstante, a aplicação da lógica da estrutura interna serve para todos os casos). Em outras palavras, sempre que houver no inglês a expressão “the wooden house” as posições dos termos que se ligam ao núcleo do sujeito sempre será a mesma. No sujeito “the wooden house”, “the” seria um adjunto adnominal e “wooden” o complemento nominal, “house” é o núcleo do sujeito, o nome, isto é, o substantivo).

Ao comparar “a casa de madeira” – tradução em português – com “the wooden house” percebemos que no português os adjuntos circulam ao redor do núcleo do sujeito, no inglês eles aparecem à esquerda desse núcleo. Assim, não importa a quantidade de adjuntos adnominais e complementos que possam aparecer na sintaxe da língua inglesa, formalmente, eles sempre vão estar à esquerda do núcleo do sujeito.

Vejamos os exemplos:

“The blue house”.

“The wooden house”.

“The blue wooden house”.

O núcleo do sujeito em todos os exemplos acima é “house”. Isso faz com que todos os outros termos que estão à sua esquerda possam ser chamados de adjuntos adnominais ou complementos nominais. É como se o sujeito em inglês pudesse ser lido de trás para frente em português com exceção do artigo que fica fixo no início “a casa de madeira azul”.

Essa estrutura não vale apenas para os adjuntos adnominais e complementos. Podemos mudar a ótica de observação e, morfologicamente, para um melhor entendimento, dizer que a análise dessa estrutura serve também para os adjetivos, os modais, os verbos auxiliares, entre outros. Para não fazermos uma análise muito extensiva observaremos a seguir apenas a questão dos adjetivos.

ADJETIVO é a classe de palavras que tem como objetivo dar uma característica ao substantivo. Na estrutura do português, os adjetivos, assim como os adjuntos adnominais, podem oscilar sua posição em alguns casos. Na expressão: o relatório técnico. “o” é artigo, “relatório” é o núcleo do sujeito e “técnico” é um adjetivo por apresentar uma característica do substantivo. Percebam que saímos da análise sintática onde estávamos observando os adjuntos adnominais, agora estamos dando outros nomes para esses adjuntos porque estamos agora tratando da análise morfológica, isto é, estamos dando nome às classes gramaticais para percebermos que no inglês os adjetivos sempre precedem os substantivos, em outras palavras, assim como os adjuntos adnominais, no inglês, os adjetivos também sempre vão aparecer à esquerda dos substantivos.

Exemplos:

The technical report.

The good report.

The blue report is good.

Em todos esses casos os adjetivos precedem os substantivos e essa estrutura também pode ser aplicada a inúmeros outros exemplos. Assim, temos: subject (sujeito) - “the blue report”. Predicate (predicado): “is good”. Como vimos, o que vier antes do núcleo do sujeito, sintaticamente, recebe o nome de adjunto adnominal “adnominal adjunct” ou complemento. E em nosso exemplo, dentro desse sujeito – morfologicamente – há o adjetivo “blue” que também deve sempre ser colocado à esquerda do substantivo (nesse caso antes de “report”).

Podemos ficar por aqui, embora haja muita coisa ainda a ser dita. O fato é que, como vimos, todas as línguas têm sua estrutura própria e quando paramos para refletir sobre essa estrutura com base nos conhecimentos que já temos de nossa própria língua fica mais clara a compreensão de toda essa evidenciação. Nesse sentido, compreender a estrutura de nossa língua é o primeiro passo para compreendemos diversos outros idiomas.

Leon Cardoso
Enviado por Leon Cardoso em 08/10/2020
Reeditado em 09/10/2020
Código do texto: T7082484
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