Resgatando...

Belo Horizonte, 12 de outubro de 2006

Dia de Nossa Senhora Aparecida

Com minha mãe ‘starei

No céu, no céu...

De: Antônio de Oliveira

www.caed.inf.br

Para: Antônio Rodrigues (“post mortem”) c/c para a família

A vida é tecida de incidências, coincidências, ciências, lembranças, crenças.

Incidências acontecem.

Coincidências podem acontecer.

Ciências tentam explicar o acontecer.

Lembranças são águas passadas mas em refluxo.

Crenças tornam coincidências relevantes e delas fazem entrelaçamentos intrigantes: registrando-as, documentando-as, recortando-as, emoldurando-as, reverenciando-as, divulgando-as, cultivando-as, quiçá mitificando-as ou mistificando-as.

Uma cultura vale porque existe.

Cada um de nós e de suas circunstâncias. Circunstâncias que deixaram marcas, que fizeram história, para um presente patente, de um passado latente.

Circunstâncias a tornar o solitário solidário.

Antônio Rodrigues, você se foi.

E algumas coincidências, ultimamente, chamaram minha atenção.

Vimo-nos, pela penúltima vez, em 13 de maio de 2000, no 10.º Exsecordis.

Você estava alegre (sempre o foi) e bem disposto.

Depois, vimo-nos, pela última vez, no dia 18 de agosto de 2006.

Achei você bastante acabado (preciso mirar-me mais ao espelho...), como se diz, mas é claro, não manifestei isso, a não ser em casa, discretamente.

Além disso, seu sogro estava hospitalizado, em estado grave.

Lúcia fazendo companhia a ele, no hospital.

Isa, Isabela e eu fizemos questão de visitar você para agradecer seus préstimos quando Bela – fazia dois anos – fora trabalhar em Divinópolis.

Naquela noite você nos presenteou com o DVD do Lex Luthor, uma espécie de troféu familiar. E lembrou nome de colegas, Pedro Paulo, Romão, Galdino e outros, e ainda brincou, desafiando a morte, dizendo que haviam falado nisso (ou nela) e que você dissera:

– “Chega essa boca pra lá, não vou primeiro de jeito nenhum”.

E foi, no dia 6 de outubro (2006), do seu jeito, é claro.

Hoje seu corpo (“restos mortais”) repousa no Parque da Serra.

Veja, Rodrigues, estou abrindo meu arquivo confidencial. E nem sei bem por quê. Talvez para lembrar um passado longínquo, de internato, quando fomos colegas contemporâneos. Talvez uma mensagem catártica, com um efeito salutar e benéfico provocado pela conscientização de uma lembrança fortemente emocional de tempos idos. Parece que o homem, não apenas a mulher, é, primeiro, um ser emocional e, num segundo momento, intelectual, racional. No fundo, todos fomos (ou somos) pássaros feridos, pois o que nos foi ensinado o foi com tanta certeza dogmática que hoje nos deixa perplexos diante da certeza maior, a certeza da morte. E que – doce certeza! – nos era retratada como passagem desta para a melhor. Apesar de tudo ou por tudo, enraizou-se em mim um princípio, o da tolerância, ideológica, religiosa...

Ninguém é dono da verdade, não é mesmo? Estarei certo e verdadeiro?

Ah, recordações recorrentes e renitentes! Mas, diga lá:

– Onde (onde, para nós, se refere a lugar físico) hoje você está, você tem certeza de tudo? Será que tudo valeu a pena?

De novo, incidências, coincidências, ciências, lembranças, sobretudo crenças. Crenças e coincidências... Hoje – mais uma coincidência – mantenho contato com Rodrigo, seu filho, na Fumec. E, por meio dele, estou me comunicando com vocês, em mais um rito de passagem...

Aliás, inquilinos do tempo, somos todos passageiros no trem da vida,

até o destino final.

Em paz!... Amém

fernanda araujo
Enviado por fernanda araujo em 06/07/2009
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