Mensagem de fim de ano

Sua vida está uma merda? Está devendo para Deus e o mundo? Já hipotecou a alma pro diabo? Quer matar seu chefe? Quer arremessar sua sogra em um abismo?

Não se desespere. Chegou o final de ano. Chegou o momento em que tudo parece que vai melhorar. Os corações se inflam de amor (não é doença de Chagas). As carteiras se abrem como pernas de prostitutas perdulárias. Os fígados são sacrificados com a bebedeira. A obesidade se instala por conta das ceias. As decorações luminosas para matar epilépticos se instalam pelas casas, pelas ruas, pelas árvores e se possível, até nas roupas de cretinos imbuídos do espírito natalino, que entrou por algum orifício do corpo. E o que dizer das músicas? Esse inferno de sons de sinos, harpas desgraçadamente paraguaias, crianças desafinadas, padres sonolentos......Momentos em que muita gente gostaria de ser surdo.

Bem, sinto informar que esse momento de privação de sentidos, tão comum ás festividades de fim de ano passam muito, mas muito rápido. E o que sobra do espírito de amor e fraternidade do natal e do ano novo? Sobra a ressaca, o rombo no cartão de crédito, centenas de imposto para se pagar, sobra a sogra que não morre nem por intervenção de um matador de aluguel, o cunhado malandro e nosso total desinteresse pela miséria alheia. Se o natal é o período em que doamos o que há de antigo em nossos armários, para nos sentirmos melhor em relação à nossa omissão ao longo do ano, assim que acabam-se as festas, voltamos à velha condição: indiferentes o mundo dos outros, desejando secretamente a morte de todos os miseráveis.

O fim de ano é o período que da a exata dimensão do quão canalhas somos. Nada é mais dissimulado do que a reunião de uma família que secretamente se odeia em torno de uma mesa. E mais dissimuladas ainda são as confraternizações de colegas de trabalho. Colegas esses que gostaríamos de ver mortos na mesa, no lugar do peru.

Realmente, não sei que magia é essa que o fim de ano tem, que reverbera nos corações e torna a todos um bando de bobos alegres. Talvez muitos creiam que o fim de ano significa a morte dos problemas anteriores e o início de uma vida melhor. Não é. Os problemas continuarão os mesmos ou piores. A vida continuará desinteressante, nos tornaremos cada vez mais idiotas, continuaremos votando nas pessoas erradas, continuaremos gordos e cada vez mais, adeptos do rasteiro senso comum.

Creio que o politicamente correto contaminou de tal forma as mentes das pessoas, que, se já era feio falar mal do natal e do ano novo, hoje passa a ser crime. Mesmo que todos concordem que papai Noel é a maior invenção do marketing mundial, que o nascimento de Jesus nesse período seja uma data arbitrária impetrada pela igreja católica e que a celebração dos valores familiares seja uma grande bosta.

Repudio profundamente essas datas festivas, cheias de tias solteironas fazendo comidas iguais ano após ano, cheias de crianças manipuladoras que exigem traquitanas tecnológicas cada vez mais caras, cheias de maridos bêbados e imbecis que terão seus vídeos vergonhosos expostos na internet e de aspirantes á vadias com suas garrafas de sidra fazendo todo tipo de imbecilidade.

Se eu acredito num mundo melhor, inspirado nos valores da fraternidade? Sim. Desde que haja uma hecatombe nuclear antes. Caso contrário, sempre será essa mesma imbecilidade, ano após ano. Acredito que a cretinice seja algo que passe geneticamente pelas gerações. Pais babacas e fracassados educam seus filhos monstrinhos, para serem grandes filhos da puta, mas que pelo menos, uma vez no ano, que sejam altruístas e exerçam o desprendimento. E não vai mudar. Desde que o mundo comemora esse festival de bizarrices que são o natal e ano novo, com um velho imbecil vestido de vermelho, com um trenó puxado por renas (!), nos enganamos de bom grado, crendo que o amor vence tudo. Não vence porcaria nenhuma. O amor de fim de ano, é o mesmo ódio do ano todo, só que afogado em bebida e em adulações.

Faço então o que sempre fiz nesse período de festas hediondas: tomo um comprimido, fico bem longe de todo mundo e vou dormir. Se possível, durmo até o carnaval. Que é uma espécie de natal, só que com escola de samba e prostitutas.