As Duas Últimas Batidas De Um Coração

Por diversas vezes fiquei olhando a página em branco, tentado colocar em palavras tudo que vivemos juntas.  Milhares de momentos, sorrisos, alegrias e lágrimas me vinham à mente, num turbilhão emocionado e eu acabava desistindo. Então percebi que essa é a nossa história. Pertence apenas a nossa família e por mais detalhista que eu seja, não há como descreve-la em minúcias, apenas tentar relatar um pouco do muito que você significa para mim, doce amada Nevenka.  Da tua chegada em nossa casa, nada mais que uma bolinha de pelos, exigente e chorona, mimada desde sempre, até o teu último dia de vida, apenas uma certeza:
"Você foi e sempre será a minha filhinha, você nos fez muito felizes!"
 
    


Depois da cirurgia realizada em 5/7/13, já aos 17 anos e dois meses, vivemos mais 4 meses juntas.
Sim, ela passou a depender cada vez mais de mim, física e emocionalmente, sim era rara a noite em que ela me deixava dormir, mas quando amamos somos capazes dos maiores sacrifícios, por isso estabeleci prioridades.
Abandonei a academia, os passeios, viagens nem pensar. Como era bom acordar e vê-la ao meu lado, dormindo
tranquila na sua caminha... eu lhe dava bom dia e agradecia a Deus por ter te-la mais um dia comigo.
Nossa rotina diária era simples. Passeio pelo quintal, olhar uma flor, “conversarmos” sobre a jabuticabeira que parecia morta mas sobrevivera, coisas assim, tolas e doces, suaves e amenas...  (mamãe tagarelava o tempo todo com você né filha? rsrs)   Depois do seu almoço, medicação e o soninho da tarde,ver juntas a novelinha “O cravo e a rosa”.  A tarde, lanchinho, a noite seu jantar, muito colo, muito beijo, muita conversa, sempre juntas...
Se eu estava na sala, lá estava ela, ao meu lado. Quando eu subia para o quarto, já a trazia no colo.
Eu sabia, eu sentia, que apesar de aparentemente ela estar bem, a sua vidinha era como a chama de uma vela e estava se apagando aos poucos. Era vital usufruir de cada momento! Tudo o mais podia esperar porque eu teria o resto dos meus dias para sentir saudades.  E assim fomos vivendo, sempre juntinhas. Um dia ela acordou sem apetite, estranhei um pouco porque ela comia bem. Como de costume, subi para o quarto e a acomodei na sua caminha, pretendia entrar um pouco na Net.  Nisso, ela começou a latir, parecia sentir grande dor. Eu que sempre sou dramática e apavorada, nessas horas viro outra! Eu estava absolutamente sozinha, todos tinham acabado de ir trabalhar. Num instante arrumei uma carona até a clínica veterinária. Era o telefone fixo numa mão, ela no colo, gritando, o celular no ouvido, tudo ao mesmo tempo.
Chegamos a clinica e ela foi logo atendida. Ficou internada. Diagnóstico impreciso. Exames a fazer.
Depois que ela já estava segura, sendo medicada, me permiti chorar feito criança. Algo me dizia que ali começava a nossa despedida. Fiz algumas ligações, avisei
o que estava acontecendo. Ela permaneceu internada por três dias e meio. Eu a visitava de manhã e a noite, mas não via melhora.  Minha filhinha estava apática.  Mal se alimentava, não reagia, só parecia criar um pouco de “vida” quando eu a tomava nos braços e conversava com ela. Os médicos estavam tentando tudo que podiam. Ela ficou tomando Dopamina no soro, direto. O coração estava muito fraco devido a idade. Na visita de sexta à noite, eu e minha filha Michelly notamos que ela havia piorado, cheguei a chamar meu filho Thiago, já a caminho da faculdade para despedir-se dela. Logo ele chegou, junto com meu marido. Não havia quem não chorasse na sala, até a médica dela, diante de tanto amor. Ela passou de colo em colo. Beijamos, agradecemos muito por todo amor que ela nos dedicou, foi uma cena muito linda e ao mesmo tempo muito tocante que jamais esquecerei.
Sofri por mim. Sofri por ver meus filhos hoje já adultos, chorando a perda da cachorrinha da sua infância.
Mas ela sobreviveu aquela noite. Visitamos no sábado. Nenhuma melhora nem piora. Eu já dormia com a roupa ao lado, pronta  para correr para a clinica, sempre deixei claro que fazia questão absoluta de estar ao lado dela, caso piorasse. Por mais dedicados que sejam os médicos que cuidaram dela, não é a mesma coisa... Nevenka merecia uma partida digna e amorosa, junto aos seus.   Cada toque do telefone era um sobressalto, eu não estava mais aguentando. Falei com minha filha e no domingo decidimos traze-la para casa. A médica avisou que sem a Dopamina, em 2 ou 3 horas o coração dela pararia de bater. Assinei o termo, assumindo o risco, já que o caso dela era irreversível, então eu a queria comigo!
Não iria permitir que uma cachorrinha criada como filha morresse sozinha, numa “gaiola” fria de hospital, isso me mataria de dor! Nem sempre se tem essa opção, mas eu tive e não iria perder a chance de dar a ela uma calorosa despedida em família.  Contrariando as expectativas médicas, ela em casa melhorou muito. Passei a alimentá-la com seringas de “Salute”, uma espécie de “shake” altamente nutritivo. Comecei com a menor seringa que achei, mas no final ela já estava tomando duas grandes, além de água e o patezinho “AD” diluído. Os únicos cuidados eram pingar colírio porque ela não estava piscando, limpar sua boquinha e olhos com água boricada. Na clinica ela nem se movia mais ou sustentava a cabecinha. Em casa, cercada da sua família, do seu ambiente, cheiros, vozes conhecidas, ela ainda viveu cerca de uma semana. Sem dores, sem sobressaltos, apenas paz e muito carinho. Desde que a trouxemos da clinica, passei a viver ainda mais em função dela.  Eu sabia que eram seus últimos dias e queria curtir cada momento. Colocamos colchões na sala e cada noite era um filho que queria passar a noite comigo, para me ajudar a cuidar dela. Às vezes ela acordava de madrugada e eu aproveitava para alimentá-la ou dar água.  Nos três últimos dias de vida, passou a usar fraldinha ficou muito engraçadinha rsrs.  Aproveitava também para niná-la em meus braços, ficava horas cantarolando para ela de madrugada. Foi uma semana muito intensa. A Michelly veio almoçar em casa todos os dias para poder ficar com ela. O Thiago não teve cabeça para ir à faculdade, passava a maior parte do tempo livre em casa, assim como a Michelly.  Tirei muitas fotos, fiz muitos vídeos, fui me preparando para o desfecho. Tudo que eu pedia a Deus era que ela não sofresse ou sentisse dor. Mas foi tudo calmo até o fim. Na sexta-feira a tarde ela me pareceu com um pouco de dificuldade para respirar, meu coração ficou apertado. Meu maior medo era ela entrar em sofrimento e eu precisar tomar uma decisão que para mim seria muito dolorosa. Mas graças a Deus ela melhorou, ficou calma e assim passamos aquele final de tarde.
Na madrugada de sexta para sábado a Michelly trocou a fraldinha, eu dei água, limpei os olhinhos dela, adormecemos.  6.30 da manhã dei uma seringa de “Salute”, ela tomou tudo e cochilamos.
Nisso a Michelly me acorda: “Mãe, a Nevenka está estranha!”  Nós tínhamos aproximado os colchões, a caminha da Névis ficava entre nós duas.
Dei um pulo, assustada e toquei no peito dela, senti duas batidas bem fortes na minha mão. Sorri e disse:
“Calma filha, você está traumatizada! Ela está viva!”.
Mas no exato momento em que eu disse essas palavras, senti o corpinho dela amolecer em meus braços...
Doce amada, guardou para sua mãe, as últimas batidas do seu coração... Chorando muito a Mi foi chamar o Thiago, o BJ, logo a família inteira estava aos prantos. Enrolei-a no seu cobertor macio, sentei e fiquei um pouco com ela nos braços, ninando seu corpinho sem vida, as lágrimas pingavam silenciosas, caindo no rostinho dela.
Não houve alarde, nem desespero. Nevenka teve o desfecho perfeito, aquele que pedi a Deus para ela.
Partiu cercada de amor, de afeto, de cuidados. Partiu em sua casa, serenamente, sem dor, sem sofrimento.
Beijei e abracei muito. Mais uma vez agradeci por todo amor, toda lealdade, todos os anos felizes que ela nos proporcionou. Levamos o corpinho a clinica para ser encaminhado ao crematório. Ela ainda estava quentinha, parecia apenas adormecida, eu não queria perder aquele calor, queria guardar dentro de mim essa lembrança...
dei-lhe o último beijo e  entreguei-a nos braços da Dra. Anna que carinhosamente beijou sua testinha, chamando-a de “Guerreira”. Voltei para casa de braços vazios. Segurei seu cobertor e chorei, chorei, chorei... Abracei o vestidinho que ela costumava usar para dormir, tinha o cheiro dela...
Ainda durmo com ele... Ela se foi dia 2/11. Só agora consegui escrever sobre isso.
Ainda dói MUITO. A saudade é imensa. Nevenka foi mais que um cãozinho. Ela foi a minha companheira de todas as horas. Junto com ela, chorei e sorri. Sofri e fui imensamente feliz. Foram quase 18 anos juntas... é uma vida... ela foi uma verdadeira filha para mim...
Apesar das lágrimas que teimam em cair enquanto escrevo, das noites em que perco o sono revendo seus vídeos, da saudade imensa que sinto, eu faria tudo novamente!
Valeu a pena. Foi tudo muito, muito lindo!

Obrigada Senhor pelo privilégio de ter sido amada por um serzinho tão especial como ela e sobretudo, 
por não ter permitido que ela sofresse!


*Nevenka, doce guerreira, vou te amar para sempre!

Obrigada pelo presente mais lindo e precioso que já recebi nessa vida:
“As duas últimas batidas do teu coração”

Com amor,
Mamãe...
        



*Fotos de despedida...



De volta pra casa...





Um cheirinho no pescoço...



Simplesmente AMO essa foto! Olheiras profundas, dor sem disfarces, alívio em saber que minha missão foi cumprida!



Michelly e sua Nevenkinha. *Filha, vc foi uma grande  "Mãe", obrigada por TUDO!



Beijos misturados com lágrimas, do seu "Velho", Thiago..


Na cama da mamãe...


        

         Amor da mãe...

        

Últimas noites juntos...


           

          Almoço com a mamãe 


             

Usando fraldinha rsrs



Na sala, com a mamãe...

          

Nossa novelinha, último dia de vida...




Adorava o travesseiro da mamãe...






Juntas, até o fim...     
Gif de cachorro 



http://www.youtube.com/watch?v=5K4PGpXsOAI  *Safe & Sound


Nevenka: "Just close your eyes
The sun is going down
You'll be alright
No one can hurt you now" 

 
Carinhosa
Enviado por Carinhosa em 19/12/2013
Reeditado em 23/03/2015
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