UM VERDADEIRO AMOR NUNCA MORRE

Autor: Glynne Pomposo da Silva

O texto publicado na “Revista de Liturgia” Edição de set/out 1999 começa assim:

Desejo que este relato possa ajudar meu irmãos e minhas irmãs a renovarem sua aliança de amor na vida matrimonial, principalmente os mais jovens. Isto já será uma grande graça de Deus. Deus que é pai e mãe na unidade do amor.

Vivi durante vinte e oito anos um casamento que considero cristão, acrescidos dos cinco anos de cinco anos de namoro e noivado, que sempre considerei incluídos . Passados esses seis anos e meio do falecimento de Célia, busco sem cessar, encontrar o caminho que Deus quer me indicar.

Deus...”criou o homem e os abençoou...” “Por isso, o homem deixa o seu pai e sua mãe para se unir à sua mulher, quando então passam a ser uma só carne” (Cf: Gn 1,27-2,24).

Conta a mitologia grega que os deuses criaram um ser e o fizeram homem e mulher. Mas essa criação estava se tornando tão poderosa que ameaçava o poder dos próprios deuses. Temendo o poder de sua criação, os deuses separaram os deuses separaram o ser original em homem e mulher. Desde então, cada homem e cada mulher procura a sua outra parte que seria a sua outra metade. Pois somente assim poderá se sentir, outra vez, um ser completo e único, mais forte e poderoso, bem mais semelhante ao próprio Deus que os criou.

Essa fábula é repetida, talvez inconscientemente, nas expressões populares como “cara metade”, “banda da laranja” e outras que refletem a convicção interior dessa verdade divina e humana: mulher e homem se completam no amor e se tornam as duas metades de um ser único, indivisível, unido por Deus que é o próprio amor, pois “Deus é amor, e quem permanece no amor permanece em Deus e Deus nele” Cf: 1Jo 4,16)

Aqui começa a grande história de amor:

Quando nos encontramos num bailinho, em fins de abril de 1959, não houve essa novelesca atração irresistível. Dançamos (ela dançava muito melhor que todas as outras), conversamos, eu dela me agradei, ela de mim se agradou e marcamos p primeiro encontro. Não apenas por mera atração física, mas nos sentimos unidos muito mais do que seria possível entender de pronto (aos mais jovens devo explicar que, no nosso tempo, ninguém “ficava”; dificilmente uma moça permitiria, sequer, um beijo num primeiro encontro). Mesmo assim, eu comentei com numa amiga: desta vez, acho que acertei; parece que é a mulher da minha vida, aquela que estava procurando nos meus namoros.

Logo nas primeiras semanas do namoro, fizemos um pacto: eu seria só dela e ela seria só minha. Eu seria o mais importante para ela e ela seria a mais importante para mim. E nada, nem ninguém poderia interferir ou se sobrepor a um de nós. De forma prática, iríamos para festas e bailes juntos, seríamos sempre sinceros e verdadeiros, fiéis na construção de um amor verdadeiro.

Brigamos feio uma única vez. Retomamos após o carnaval.

Estudantes, pouco dinheiro, tivemos que esperar muito tempo para concretizar nossa união definitiva. Mas sonhávamos com a nossa própria família, nosso lar e, sobretudo, com o dia em que ficaríamos sempre juntos.

Casamos e fomos morar com minha mãe e dois irmãos menores. Meu pai faleceu e não tivemos outra alternativa, pois eu fiquei responsável pela família.

Logo nos vieram três filhos e depois duas filhas. Convivemos a maior parte de nossa vida com a minha mãe, que dela se tornou uma mãe tão amorosa e verdadeira, que minhas irmãs tinham ciúmes.

Durante os anos de nossa vida em comum éramos inseparáveis. Andávamos sempre de mãos dadas. Certa vez, uma amiga comum (metida a psicóloga) deixou escapar: que achava falso aquele gesto e que ele nada representava. Que pena! Ela não conseguia entender que juntar as mãos, para nós dois, representava uma segurança e uma força enorme, porque nos sentíamos uma só pessoas.

De fato, quem nunca sentiu a força que dois amantes transmitem um ao outro ao se darem as mãos, não tem capacidade de ver interiormente os valores deste tão sublime gesto. Vós precisávamos um do outro a todo tempo. Eu dela e ela de mim.

Muitos casais como nós, chegam a essa identidade, a tal ponto que quem ouve a opinião de um, na maioria das vezes, não precisa ouvia a opinião do outro, pois elas são iguais.

Isso, em nada alterou a nossa individualidade. Por vezes, alguns casais se tornam até parecidos fisicamente, que muitas pessoas pensam serem parentes próximos ou até irmãos. Me perdoem os arautos do individualismo (machistas, feministas, etc), mas a personalidade de casais q eu se completam, funde-se em uma nova personalidade. É um novo ser, mistério de amor inexplicável e incompreensível para quem nunca o viveu. Quando o Apóstolo Paulo afirma: “Já não sou eu que vivo, MAS É Cristo que vive em mim” não quis ele dizer que perdeu a sua identidade e personalidade por amar tanto a Cristo a ponto de nele se fundir. Esta é exatamente a obra do amor: unir tão intimamente, que já não se pode ver um sem ver o outro. “Quem me ~e, vê meu Pai”; ”Eu e o Pai somos um”. Como entender tais afirmações sem vivenciá-las?

Creio que, em Terra dos Homens, o escritor definiu bem o amor humano: “Amar não é olhar um para o outro, mas, juntos, na mesma direção”.

Logo após a morte da minha esposa, lá na porta da Igreja Matriz, eu afirmei aos meus amigos: De hoje em diante vocês irão me aturar com apenas 50% vivo, pois a minha outra metade havia morrido.

A fidelidade que nos unia era do coração e não de possíveis delizes ou erros, que são humanos. A fidelidade verdadeira nasce da consciência de que o outro lhe é essencial, faz parte de você mesmo. Trair um amor verdadeiro é como trair a si próprio.

Mais importante do que ser feliz, é fazer o outro feliz. Esse me parece ser o segredo de um casamento verdadeiro. Se eu a amava tanto, somente a felicidade dela poderia me fazer feliz e vice versa.

Nem de longe, quero que alguém pense que nossa vida foi um eterno mar de rosas . Fomos tão humanos e falhos como qualquer outro. Nunca fomos pessoas especiais ou diferenciadas. Nossa única diferença em relação a alguns outros casais é que o nosso amor era real e concreto e que estava acima de nossos interesses individuais. Vivemos um apara o outro, unidos na construção de uma família fraterna. Nunca nos dividimos por questões econômicas. Nossas divergências em termos de atitudes com os filhos sempre foram partilhadas, prevalecendo o bom senso.

Quem não morrer para a sua individualidade e não renascer para uma nova vida comum, pode até Ter um casamento duradouro e estável, mas não terá muita chance de viver um amor conjugal verdadeiro e completo, pois a verdadeira felicidade está no outro, na luz do amor universal. DEUS!

Antônio Oliveira
Enviado por Antônio Oliveira em 08/04/2008
Código do texto: T937503