O silêncio das raposas...

É muito comum ao se ler um poema, um texto, alguém dizer: parece que foi escrito para mim. E foi. Drummond vai além. Diz que as alegrias são particulares, as dores, universais.

Depois dos embates mais terríveis da vida, desenvolvi uma estratégia. Ao receber uma ofensa, quando alguém espuma de ódio, procurando um alvo qualquer, ou mesmo tentando me ferir com palavras cruéis, meu espírito coloca um escudo intransponível e nada me atinge.

Muitas vezes, as pessoas ficam chocadas diante de minha serenidade, quando alguém me ataca com acusações infundadas, pessoas amigas, ou até mesmas da família, movidas por sentimentos equivocados ou dores atrozes, escolhe-me, aleatoriamente como receptáculo do veneno que lhe que lhe corrói o espírito. Paciente, eu as olho com pena ou até com carinho, aceitando sua fúria. Elas precisam de uma pessoa ali na sua frente, como porto, para suas embarcações desgovernadas.

Não é uma virtude. Apenas uma tática conseguida com o exercício da vontade. Em geral, os resultados são bons. O agressor, pretenso inimigo, choca-se com a serenidade inesperada.

Estou cansado. De há muito ter que usar tal exercício. O amadurecimento propicia paz? É o que chamam de sabedoria, ou apenas a clarividência de optar pelo essencial, ignorando o acessório? Enfatizando minha teoria, penso em personificar as raposas como criaturas, cheias de poder e silenciosas. Assim deveriam ser os homens. As reações violentas, as respostas ásperas são perigosas.

O silêncio é uma opção e uma força.

Ora, a filosofia não é nova. A célebre frase de Sócrates, filósofo grego, de 300 a.C, continua válida: Arrepender-me de algumas coisas que disse, mas jamais do meu silêncio.

Diante de uma ofensa, de um ataque verbal, o silêncio rechaça o furor com reflexão. O que se cala, pensa, analisa. Não é movido pela raiva incontrolável. Aliás, a reflexão contida é o antônimo da fúria desordenada. A primeira é filha do raciocínio, a segunda, bastarda do instinto. Uma é humana, a outra , animalesca.

Na verdade, homens e mulheres são, instrumentos de corda, que, ao simples toque, produzem sons belos os estridentes, harmônicos ou desafinados. Não se sabe se há um grande músico que pode manuseá-los com arte.

Como somos animais racionais, é preciso usar esse privilégio, pró réu, se permitimos que sejamos reféns de nossos instintos, sermos vassalos e não senhores. A vitória é ascender a escada de Jacó e não descer aos nossos porões.

Assim, a descoberta de sermos donos de nós mesmos não é grande, nem a panaceia para todos os males. Contudo, o silêncio pode ser uma boa arma, o exercício para dominar nosso "Livre arbítrio". Pois, sejamos raposas silenciosas, enfrentando nossas lutas, com dignidade.

Dalmo Arraes
Enviado por Dalmo Arraes em 10/12/2014
Reeditado em 21/12/2014
Código do texto: T5065151
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