Os Nossos Lugares

Vó,

Sempre tentei te dizer como me doía todas as vezes que você não me enxergou verdade, porque estava presa as projeções de outras pessoas e as suas.

Queria te dizer o quanto foi difícil ter que te afirmar, apesar de todo o meu medo e toda minha insegurança que eu não seria capaz de realizar as expectativas que a senhora depositou em mim

Que mesmo que doesse, eu teria que seguir meu próprio caminho, andando com as minhas próprias pernas e fazendo minhas proprias escolhas, únicas e exclusivamente minhas.

Ainda que elas fossem o extremo oposto do que a senhora esperava.

Eu quis te contar, vó

Que eu estava crescendo e a senhora precisava deixar eu crescer.

Vi a sua dificuldade de segurar a minha mão e dizer:

" Vai, filha, eu te aceito assim, como você é. Não precisa mudar nada pra satisfazer as minhas projeções de ti."

Mesmo hoje, depois de notar que eu já não era mais aquela menininha que ia te ver todo final de semana e sentava no seu colo depois de te pedir a bênção e tagarelar sobre as coisas de criança que eu fazia, ou quando você se responsabilizou por mim, mesmo não sendo sua responsabilidade e lidou comigo e com todas as mudanças que adolescência meu proporcionou.

Você viu que eu já não era mais a menininha que ficava no seu colo tagarelando, porque além de estar crescendo e ficando mais pesada, eu também já não era muito de falar mais.

Eu estava mudando, nunca quem eu sou, ou a minha essência, mas estava me descobrindo e esse é um processo que não terminou e nunca termina.

Porque estamos sempre crescendo de um jeito ou de outro, tanto eu quanto você.

Engolindo as mágoas que a vida apresenta e larga na porta dos nossos corações, famintos por aceitação.

a aceitação que eu tanto quis de você, nem tanto das outras pessoas, mas, exclusivamente de você.

E naquele momento você não pôde me dar.

A verdade, vó

é que a gente precisou da distância pra conseguir enxergar mais do que queríamos uma da outra.

Foi com a proximidade pós-distância Que você conseguiu me olhar e me ver

Exatamente como eu sou

E pude olhar nos seus olhos e ver o quanto ainda continua resistente, sobrevivente

Ainda que da sua maneira tão diferente da minha.

Ainda é você, que ainda que taurina não se dê com taurina, sempre foi você que permaneceu, mesmo que eu já tivesse ido.

Foi quando notamos que éramos diferentes

e que por isso, ainda tínhamos muito pra aprender uma com a outra

Que agora nos descobrimos mais próximas e mais leves do que nunca

E nós colocamos no nosso lugar

Limpo

Simples

E honesto

De avó e neta.

Nicolle Viviane
Enviado por Nicolle Viviane em 14/06/2021
Código do texto: T7278733
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