Perdão ou amor de conveniência?

               Fico a pensar às vezes sobre esse perdão que está tomando conta do mundo hoje, sobretudo nas igrejas. Já ouvi uma vez que depois que inventaram a “desculpa” todo mundo faz o que quer. Basta em seguida pedir perdão e estará tudo resolvido.
               As pessoas tendem a banalizar demais tudo quanto vê. Já vimos a banalização do sexo, das bebidas alcoólicas, das drogas. Mas aí começa a banalização também daquilo que se diz. Por exemplo, uma pessoa passa perto de outra conhecida e diz “Oi! Tudo bem?” e a outra responde “Tudo bem e você?”. Na realidade não está tudo bem. Ela está com uma tremenda dívida lhe tirando o sono todas as noites; sua mãe está com câncer e seu filho tem uma doença crônica; antes mesmo de sair ela esteve chorando por horas... Claro que o que estou sugerindo não é que saiamos por aí abrindo nossa vida particular a todos quanto conhecemos, mas que deixemos sempre que possível de lado certas formalidades que não dizem nada sobre nós. O poeta é reconhecido justamente quando libera do fundo de sua o alma o sentimento mais verdadeiro.
               Um outro exemplo dessa banalização são os cumprimentos “ Bom dia! Boa tarde!” e “Boa noite!”. As pessoas usam esses cumprimentos sem sentir nada de fato. Apenas dizem por estarem condicionadas pelas regras dos bons costumes. Claro que é muito bom ser recebido por um cumprimento assim, mas melhor ainda será se ele for sincero e não mera conveniência.
               O que mais me preocupa, entretanto, é o que tem ocorrido com o perdão. A pós-modernidade tem sido para todos de uma flexibilidade intensa. Frequentemente vejo a seguinte pregação de diversos líderes religiosos: Irmãos, vocês não podem permanecer em pecado. Se brigaram com seu irmão e quiserem cear ou apresentar uma oferta a Deus, Ele não receberá. Vá até seu irmão, peça perdão e depois volte e faça sua entrega a Deus. Se não for possível, peça perdão agora a Deus e depois a seu irmão. Bom, essa mensagem não está de todo errada. De fato, aquele que quer ter um relacionamento com Deus não pode permanecer no pecado e também não pode ofertar a Deus sem se retratar com seu irmão. No entanto, esse pedido de perdão não deve ser simplesmente para poder ofertar a Deus naquele dia. Dessa forma, não seria sincero e muito menos pela motivação correta, que é o amor. Um pedido de perdão deve fluir do coração arrependido que percebe o mal que fez ao outro. Um pedido de perdão deve ser uma manifestação da alma, primeiramente, e só em seguida se transformar em uma ação oral. Quando isso acontece, antes mesmo das palavras chegarem aos lábios, é possível notar o arrependimento e, melhor ainda, o amor nos olhos da pessoa; isso quebranta nossos corações, e quando a pessoa faz, de fato, o pedido de perdão, na realidade já liberamos dentro de nós esse perdão, e apenas o expressamos em palavras.
               Dessa forma, o perdão deixa de ser um mero mecanismo que funciona automaticamente naqueles que dizem conhecer o cristianismo, para se tornar um lindo sentimento que fortalece a intimidade e os elos entre as pessoas envolvidas. Passa a ser expressão de amor, de respeito, de carinho. Um perdão sincero mostra que não estamos indiferentes a dor que provocamos no outro, mas que também estamos entristecidos por tê-lo magoado, pois o amamos. Compreendem? Davi foi chamado homem segundo o coração de Deus e uma de suas principais virtudes era a sinceridade.

“O amor seja não fingido. Aborrecei o mal e apegai-vos ao bem.” (Romanos 12.9)