O Fundamento de Deus Permanece

 
Por João Calvino
 
“Todavia, o firme fundamento de Deus permanece, tendo este selo: O Senhor conhece os que são seus; e: Qualquer que profere o nome do Senhor, então que se aparte da injustiça.” (2 Timóteo 2.19)
 
Sabemos sobejamente bem quantos escândalos têm procedido da apostasia daqueles que uma vez professaram a mesma fé que nós. E isso é especialmente verdade no caso de homens que são muito populares e de extraordinária reputação. Se alguém dentre o vulgo apóstata, não nos sentimos muito sensibilizados. Mas aqueles a quem os homens têm em alta estima, os quais se tornam colunas na Igreja, não podem fracassar sem envolver outros em sua ruína, principalmente se sua fé não contar com outro apoio. Essa é a preocupação de Paulo aqui, e ele diz que essa não é razão para as pessoas piedosas perderem o ânimo, ainda quando assistem o fracasso daqueles que acreditavam ser firmes na fé. Com o fim de confortá-los, ele realça que a leviandade ou a perfídia dos homens não pode impedir a Deus de preservar sua Igreja até ao fim. Primeiro, ele nos traz à memória a eleição divina, à qual ele chama figuradamente de fundamento, significando com isso sua firmeza e constância perene. Tudo isso visa a provar a certeza de nossa salvação, contanto que façamos parte dos eleitos de Deus. E como se dissesse: "Os eleitos de Deus não dependem de eventos mutáveis, senão que repousam num sólido e inamovível fundamento, já que sua salvação está nas mãos de Deus. Assim como Toda planta que meu Pai celestial não plantou, será arrancada [Mt 15.13], também uma raiz que foi fixada por sua mão não pode ser arrancada pelos ventos ou tempestades." Portanto, lembremo-nos, antes de tudo, que, a despeito de toda a fraqueza da carne, os eleitos, não obstante, não correm esse risco, porque não estão firmados em sua própria capacidade, mas estão fundados em Deus. E se os alicerces que os homens lançam são firmes, quanto mais aquele que é lançado por Deus mesmo! Estou cônscio de que alguns tomam isso como uma referência à doutrina: "Que ninguém julgue a verdade da doutrina pela infidelidade daqueles que a professam"; mas é fácil de se inferir do contexto que Paulo está falando da Igreja de Deus e dos eleitos.
 
“Tendo este selo”. A palavra signaculum tem provocado muito mal-entendido, porquanto há quem a tome no sentido de marca ou impressão; eu, contudo, usei a palavra sigillum, um selo, que é menos ambígua. Pois, evidentemente, o significado de Paulo é que a salvação do eleito está sob a proteção secreta de Deus, como um sinete [selo], pois a Escritura declara que eles estão "inscritos no livro da vida" [SI 69.28; Fp 4.3].
 
“O Senhor conhece os que são seus”. Tanto a palavra selo quanto a cláusula seguinte nos lembram que não devemos julgar segundo nossa opinião pessoal se o número dos eleitos é grande ou pequeno. Porque o que Deus selou ele deseja que seja mantido como um livro fechado para nós; também, se pertence a Deus saber quem são seus, não deve causar estranheza que às vezes um grande número deles se mantenha desconhecido a nós, ou se ainda chegarmos a equivocar-nos na tentativa de fazer uma seleção. E preciso que atentemos bem para a razão do apóstolo em falar de um selo; é para que, ao nos depararmos com tais casos, nos lembremos do que João disse: "Saíram de nós, mas não eram dos nossos” [1 Jo 2.19]. Disto procedem duas vantagens: que a nossa própria fé não será abalada, e, se as coisas sucedem de forma inesperada, não desfaleceremos, como às vezes sucede. Em segundo lugar, estando certos de que, apesar de tudo, a Igreja estará a salvo, suportaremos mais pacientemente que os réprobos tomem o seu próprio destino para o qual foram destinados, pois o número com o qual Deus se apraz permanece intacto. Portanto, sempre que suceder alguma mudança súbita, contrariando nossa expectativa e esperança, lembremo-nos uma vez mais de que "o Senhor conhece os que são seus”.
 
Então que se aparte da injustiça. Ele havia encarado o, escândalo provocado pela apostasia, dizendo que o mesmo não devia causar excessivo susto entre os crentes; e agora continua usando tais hipócritas como exemplo para ensinar-nos a não escarnecermos de Deus por uma profissão simulada do Cristianismo. É como se ele dissesse: "Visto que Deus pune os hipócritas por exporem sua perversidade dessa forma, aprendamos a temê-lo com consciência sincera, para que o mesmo não nos suceda. E assim, qualquer um que invoque o nome de Deus, ou seja, que professe pertencer ao povo de Deus e queira ser reconhecido como um membro seu, que se mantenha longe de toda e qualquer impiedade. Pois aqui, invocar o nome de Cristo significa gloriar-se em seu título e em pertencer ao seu rebanho, assim como em Isaías 4.1 invocar o nome de um homem sobre uma mulher significa que a mulher deve ser reconhecida como sua legítima esposa, e em Gênesis 48.16 invocar o nome de Jacó sobre toda a sua posteridade significa que o nome da família está sendo preservado em sucessão ininterrupta, visto que ela [a posteridade] descende dele.

 
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João Calvino
Enviado por Silvio Dutra Alves em 18/08/2014
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