Anjos da luz
( Marta Rodriguez)

Era véspera de Natal.
Por volta do meio dia tocou a minha campainha, mas não dei atenção pois eu estava atrasada com o almoço - e logo mais chegariam os amigos e parentes para o jantar -  e estava no meio dos preparativos.
No primeiro momento não fui atender, pois esperava que, quem quer que fosse, desistisse e fosse embora.
No segundo toque, gritei um tanto nervosa - que já estava indo -  que esperassem!
Peguei o pano de pratos e fui atender, enxugando as mãos apressadamente.
Do lado de fora do imenso portão de grades grossas e altas, estava um menino bem arrumado aparentando seus onze anos de idade, branquinho de olhar perdido.
Perguntei-lhe o que desejava, com voz meio áspera.
Ele, muito educado, porém com voz tímida e mansa, perguntou-me se havia algo para ele comer.
Eu respondi que não havia terminado de preparar o almoço, pedi-lhe desculpas e virei-lhe as costas.
Antes mesmo de entrar, voltei a olhá-lo, ele ainda parado no portão também me observava, quando me disse:
- Poderia, por favor, me oferecer um pouco de água, senhora? Estou com muita sede!
Pedi-lhe que aguardasse um momento e entrei apressada para buscá-la.
De volta ao portão, com uma garrafa e um copo, servi-lhe a água, sem mesmo abrir.
Assim que ele terminou de beber, olhou para o lado e perguntou a um outro menino se ele também queria.
Foi então que eu notei que havia mais um menino aparentando seus quinze anos de idade.
Ele estava sob a copa de uma árvore de flores brancas e cheirosas que há anos vive em minha calçada.
Ele bebia a água lentamente dando a impressão que não queria que ela terminasse nunca, como que se eu tivesse todo o tempo do mundo.
Enquanto isso lembrei que na noite anterior eu havia preparado, para o jantar, cachorro quente; e perguntei-lhes se queriam um lanche!
Ao dizer-me que sim, perguntei-lhes se poderia prepará-lo com maionese, vinagrete e purê de batatas.
Ambos balançaram a cabeça em sinal afirmativo.
Voltei correndo para a cozinha e  preparei o lanche com todo carinho!
Enquanto eu preparava o lanche, o meu coração parecia querer saltar do peito, pairou sobre mim uma sensação estranha, por alguns momentos me senti preparando o lanche para os meus filhos. A  paz e a felicidade me tomou!
Segui para o portão, o abri e os servi.
Enquanto comiam perguntei-lhes se estavam perdidos, de onde eram e o que estavam fazendo ali com sede,  com fome...
O mais novo olhou para o outro e voltou a olhar-me com olhos tristes.
De imediato preocupei-me!
Arrepiei-me ao ouvir as palavras do mais velho...
- Que Deus te abençoe senhora! Estás alimentando dois irmãos que não têm para onde ir, estamos sozinhos neste mundo de nosso Deus.
Nossos pais se foram, seguiram por um caminho de luz, não pudemos acompanhá-los...
Antes de partirem nos pediram que seguíssemos os nossos caminhos e que não muito distante encontraríamos um lar onde o amor maior existe e que seria lá que deveríamos passar a noite de Natal!
Viemos de muito longe, estamos exaustos e sem rumo, há dias estamos numa procura sem fim por um lar que nem conhecemos, e por uma família que nunca vimos...
Desde então estamos buscando encontrar a luz que nos oriente o caminho de volta para casa...
Em lágrimas e desesperada os convidei para entrarem, mostrei-lhes o sofá e pedi-lhes que se sentassem e aguardassem.
Fui correndo até a cozinha verificar as minhas panelas e quando voltei, não havia mais ninguém. Sobre a mesinha de centro havia um bilhete escrito em dourado...
“Abençoada seja esta irmã que abriu as portas do seu lar para a luz divina entrar,
dedicando um pouco do seu precioso tempo para ouvir a voz do necessitado!
Abençoada seja a mão que alimentou os seus irmãos com amor no coração!
 Senhor, multiplicai o banquete que nos foi ofertado neste dia que antecede a noite de Natal!
Que neste lar, continue reinando a paz, o amor e a compaixão pelo próximo
 em cada coração que aqui entrar!
Assinado,
Anjos da luz e da prosperidade..."