A INSTIGANTE ARTE DA VIDA - PARTE III (O PREÇO)

(Novela em 14 partes)

Pois bem, finalmente o prazo limite para o acerto de contas pela fantasia de princesa...

Diana despertou-se bem cedo, tomou seu longo banho de aromas e cremes e debruçou-se na janela, contemplando o tempo. A manhã era cinzenta, chuvosa, melancólica. Asfalto molhado, carros enfileirados num engarrafamento quilométrico que remetia à imagem de uma trilha metálica e multicolorida a se perder no infinito, indivíduos “fardados” com capas impermeáveis, outros ensopados, com humores nada convidativos, andando ligeiros no reinício de mais um dia de enfado e rotina, numa guerra brutal de sombrinhas entrelaçadas. (Nas grandes cidades, até sombrinhas se tornam armas...). Lojas abrindo, bares fechando e a chuva caindo, indiferente a tudo...

Trancando as janelas para o cenário sombrio, desceu para o café. Àquela altura, Ana já a esperava no escritório. Comeu uma maçã às pressas e dirigiu-se até lá. A porta se encontrava aberta; entrou, dizendo em voz baixa:

- Bom dia!

- Bom dia. Como sabe, preciso de sua resposta. Não há como protelar mais.

Um pouco tensa, mas decidida, respondeu:

- Apesar de não saber com precisão o que fazer, estou muito bem aqui. Quero tentar.

- Quer mesmo?

- Quero. Mas preciso de maiores esclarecimentos. Sinto-me galgando no escuro.

Ana Lara emanou um sorriso expansivo, desses de inclinar a cabeça e olhar para o céu, exibindo seu pré-molar de ouro que raramente revelava-se à luz do dia:

- Estou muito satisfeita, Diana. Não se aflija. No momento exato saberá como agir. Ainda essa noite você irá começar. De início, o que tem a fazer é ficar em seu quarto, repousando. Eu levarei o cliente até você. Estou certa de que se sairá bem; apesar de ingênua, você é astuta!

- Confesso que acho um pouco estranho receber homens no quarto. Sempre ouvi dizer que isso não é de bom tom.

- Se quiser de fato estabilizar-se na cidade grande, terá que se livrar desses princípios provincianos, dessas bobagens típicas de beatas frustradas, mal amadas. Relaxe, você vai gostar.

Diana chocou-se com tais palavras. Retirou-se em seguida. Estava amedrontada, mas a chama ardente da atração pelas mordomias queimava com fúria suas incertezas.

O dia se arrastava com persistência; o passar prolixo das horas feria, amolgava quão sessões de torturas impiedosas. Andando aflita por todos os cantos do casarão num vai-e-vem angustiante, contava cada minuto que se ia. A julgar pela satisfação de Ana Lara com o seu sim, a profissão na qual decidira se iniciar era mesmo promissora! Por outro lado, tudo poderia cair por terra se não obtivesse um bom desempenho, se não correspondesse às expectativas dos clientes; mesmo porque, o que faria, como procederia com os mesmos ainda eram incógnitas.

Em meio a sonhos e temores saltitando em seus pensamentos, houve, afinal, o regresso da noite. Obedecendo as instruções da senhora, subiu para o quarto, tomou seu banho de essências aromáticas e deitou-se, a ler um livro. Vale salientar que já havia lido mais de oito obras, aprimorava-se culturalmente; pelo menos esta conquista era verdadeira, definitiva, incontestável e intransferível!

Lá embaixo, no salão, homens de idades variadas dividiam os espaços, em companhia das belas hóspedes do lugar. Muitos eram ricos e iam se divertir ali, naquela região desprovida de aparatos para não levantarem suspeitas. Na verdade, as péssimas localização e aparência externa do âmbito eram propositais. E lá dentro, homens da lei, médicos renomados, empresários, herdeiros cobiçados numa disputa irracional por mulheres lindas e caras...

Sim, ao longo dos trinta anos de laboração, graças ao dinheiro que trouxera de Paris e à capacidade espantosa de engendrar oportunidades e pessoas, a poderosa cafetina conseguira montar uma estrutura ímpar de prostituição na cidade e sua fama já se expandia por outros estados. As mulheres com as quais trabalhava eram bonitas, instruídas e inteligentes, de rostos e corpos cultivados com esmero.

Entre carícias, gemidos, risos, beijos e toques, a noite ia acontecendo. Ana Lara, aproximando-se de um dos frequentadores assíduos da casa, um homem alto, forte, grisalho, de aparentes quarenta e cinco anos, falou-lhe com regozijo:

- Tenho um presente pra você esta noite!

- Presente?

- Na verdade, não é bem um presente. Custar-lhe-á muito mais do que costuma pagar!

- Quanto?

- Dez vezes mais...

- Tudo isso? Pelo preço, devo crer que se trata de coisa realmente muito boa!

- Não tenha dúvida. Você sabe que eu não decepciono nunca.

(Gargalhadas se fizeram ouvir...).

- Mas diga logo, Ana; onde está a mulher?

- Você promete que não se enfartará?

- Sem volteios, Ana; por favor, diga logo!

- Como quiser. É que tenho lá na suíte cinco estrelas uma virgenzinha belíssima, a mais bonita da casa; morena, como você gosta, com menos de vinte anos, esperando especialmente por você, intacta!

O homem, de olhos arregalados e resfolgando como um bicho faminto, exclamou:

- Virgem? Não posso acreditar!

- Mas seja cuidadoso com ela; é muito doce e despreparada!

- Claro, claro!

- Acompanha-me, por favor. – e num ímpeto: - primeiramente, vamos acertar.

O cheque foi emitido sem questionamentos. Subiram então. O homem estava trêmulo, não se contendo de desejo e ansiedade! Chegando ao quarto de Diana, Ana Lara, com três leves toques na porta, fez-se anunciar. A bela princesa não tardou em atendê-la:

- Ana! – sussurrou, demonstrando certa tensão.

- Este é o Dr. Anoaldo Siqueira, um afamado juiz da cidade; ele veio conhecê-la.

Diana cumprimentou o ilustre cavalheiro. A cafetina afastou-se devagar, a fim de deixá-los a sós e disse num tom de cinismo, no momento em que já fechava a porta:

- Fiquem à vontade.

Imediatamente, o tal homem pôs-se a arrancar as roupas numa demonstração de loucura abominável, com olhos assustadores, vidrados, fixos na moça, exclamando áspero e ávido, como se num delírio:

- Meu Deus, jamais vi coisa tão linda!

Diana, trêmula, com respiração e coração acelerados, encostou-se na parede, premindo-se contra a mesma, dominada pelo pânico ao se ver diante daquela criatura asquerosa que a fitava com ares insanos. Chorava muito! Aquilo era o inferno! Percebendo não haver como se livrar da situação, desejou a própria morte com uma ardência que necrosava! E ele, àquela altura completamente nu, avançou feroz! Ela gritou:

- Solte-me, solte-me!

- Sinto muito, menina; eu paguei, e muito caro, por você!

- Como pagou por mim? Solte-me, solte-me!

- É bom que seja tão rebelde; fica bem mais excitante!

Mal terminando de pronunciar estas últimas palavras, envolveu bruscamente a moça em seus braços, beneficiando-se de sua força máscula, beijando-a com fúria! Diana, entre lágrimas de pleno desespero, berrava:

- Ana Lara, socorro! Socorro, socorro!

E nada! A sua grande protetora não apareceu para salvá-la. Só então começou a entender o que de fato acontecia. Descobriu que o interesse de Ana girava única e exclusivamente em torno de sua virgindade. Por isso, as indagações da mulher sobre o assunto. Punia-se, não se conformando por ter sido tão parva! Mas já era tarde demais...

Dr. Siqueira, com todo o seu desejo animal, rasgava os trajes da jovem, indiferente aos golpes de socos e pontapés que recebia. Pouco a pouco a despiu, deixando-a à mercê do seu sexo. Lançou-a à cama, dominou-a com os braços e deitou-se sobre ela, violentando-a sem piedade, entre urros de prazer!

E vestígios de sangue e gozo no lençol selaram a noite...

Marco Aurelio Vieira
Enviado por Marco Aurelio Vieira em 01/10/2010
Código do texto: T2532538
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