Eu e Lice: Cinco coisas - parte 03 (capítulo 09)

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Leitor, retome o fim do capítulo anterior.

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(Eu) Lice gritava. Sua voz saía pouco, mas ainda assim um som era emitido. Totalmente em vão. Cristo nenhum salvaria a menina. Aliás, Deus não salvou Victor. Santa Luzia não impediu que Lice ficasse cega. Ninguém respondia as preces de Dona Rosa. Uma tamanha injustiça!

Voltando a história, o homem tentava pressionar sua boca para que nenhum som fosse emitido. Quando uma pressão mais forte se sucedeu, a menina mordeu-lhe um dos dedos. Mordeu-lhe com o máximo de força que podia exercer naquele momento. Um rio de sangue desceu pelas mãos do homem.

Impiedosamente, Sérgio bateu violentamente a cabeça da menina no chão. Era demais para o cão. Zulu, movido por um impulso descomunal, avançou para cima do homem, que logo o agrediu com um ponta-pé.

Santo Zulu. Graças a ele, Lice conseguiu correr. Cambaleando, sangrando, mas mesmo assim, correndo, mesmo que sem direção. O homem se pôs a persegui-la.

A menina chegou a um lugar tomado de palhas, com um rastelo num canto. O homem a empurrou por trás e Lice caiu sobre as palhas.

Passando a mão para o lado, a garotinha sentiu o rastelo.

Aquele rastelo parecia um tridente. Tridentes são símbolos associados ao demônio, a Satanás. Mas, antes de serem associados a seres do mal, eram ligados a Deuses antigos.

Movida por forças sobrenaturais, talvez da mística do rastelo atridentado, Lice lançou, com o pouco de força que lhe restava, aquele tal objeto. Os Deuses (ou os Demônios) abençoaram o lançamento. Houve um silêncio.

(Lice) Esperei um pouco, levantei e saí. Meu corpo sangrava. Sangrava bastante, mas conseguia andar um pouco, mesmo que bem mal. Do lado de fora, ouvi um grito distante. Era de minha avó.

Ouvi também um choro profundo dela. Profundo mesmo, igual bebê. Ela me abraçou e continuou a chorar. Seu Tito, que aparentemente estava ao seu lado, abraçou a nós duas.

- Lice... perdão, meu amor.... a vovó te ama! - não conseguia mais chorar. Minhas lágrimas haviam secado, eu acho.

Algum tempo estranho, e depois Seu Tito falou.

- Rosa, vamos... hospital. Ela precisa... atendida, está perdendo muito....

(Eu) Nos braços da avó, Lice adormeceu.