O Perfume do meu Sertão- O trem chega na estação!

16 Capítulo

A noite se vai ao som da viola de Adamastor, tudo está em paz no sertão. O sol surge em meio às serras e as garças se apinham nas árvores em torno do grande lago. Lúcia acorda cedo, mais cedo do que as galinhas está com uma animação que dificilmente se vê. Sebastiana arruma o cabelo da filha e faz um bonito penteado. A megera se sentindo a rainha da cocada preta, se veste com um vestido bem cortado, se admirando no espelho colore as bochechas com carmim. João Miguel pede que Emílio tire os cavalos da estribaria para um longo banho. Eulália também está animada, ajudando a cozinheira Maria debulhar feijão verde, enquanto Adamastor mata algumas galinha gordas no quintal. João Miguel coloca um terno, no qual usa penas para eventos especiais e toma banho de água de cheiro. Emílio sobe na carroça e guia até a porta do casarão, João Miguel com pressa grita Lúcia.

João Miguel: Lúcia chega de arrumação e vamos! Hoje não é o dia do casório!!!

Lúcia: Já vou!!!

Lúcia desce as escadas do casarão, com o nariz mais empinado que a rainha da Inglaterra, pega a sua sombrinha verde e abre com toda delicadeza. Como deve se esperar de uma dama.

Na estação de Pedra Azul, Neuza não se contém de tanta felicidade, começa a pular. Seu Jair controla a moça dizendo que todos estão reparando nos seus modos ridículos. Neuza pouco preocupada continua a pular e sacode as mãos. É grande a movimentação, na pequena estação de trem, um vai e vem de pessoas, desce e sobe de caixas e malas, uma grande fila se faz na bilheteria para a compra de passagem para a capital. João Miguel chega à porta da estação, Lúcia desce da carroça e mede todos os que estão ao seu redor, como se fosse superior a tudo aquilo. Neuza avista João Miguel de longe e aponta escandalosamente.

Neuza: Olha lá meu pai, não é o ricaço!?

Seu Jair: Se controle Neuza, não se lembra que o fazendeiro acha que somos ricos?

Neuza: É mesmo!

João Miguel se aproxima dos amigos e abraça calorosamente Seu Jair. Lúcia encara Neuza como se fosse uma juíza. Neuza não entende nada, e abraça a megera apertando a moça até lhe tirar a fôlego.

Seu Jair: Meu amigo, essa é a minha filha no qual lhe falei... Neuza!

Neuza: Olá senhor João!

João Miguel: Nossa a sua filha é muito graciosa compadre, nem sei como ainda é solteira.

Neuza: Não sou mais senhor, estou noiva!

João Miguel: Mas que notícia maravilhosa, quem é o felizardo?

Eu conheço?

Seu Jair prevendo a saia justa, distrai o fazendeiro apontando para o trem ao longe.

Seu Jair: Meu filho chegou!!!

A Maria fumaça vem de vagar, desfilando pelas dormentes. Enche o céu azul com a sua fumaça branca. Entre os vários vagões, especificamente no da segunda classe, se encontra André. O jovem de coração bom veste um palito cinza, surrado de velho e sapatos com o solado desgastado. Na cabeça guarda grandes ideas e abriga um chapéu de palha. Nos olhos o rapaz transmite uma esperança grandiosa e revela o estigmatismo.

O trem chega à estação e o apito assusta à todos que esperam ansiosos nas plataformas. Neuza não se controla e começa a chorar histericamente. Lúcia olha para Neuza com uma cara de reprovação. As pessoas as poucos descem dos vagões e André com as suas malas pesadas, procura com o olhar seu pai. Neuza então ao ver o irmão, sai em disparada correndo e pula em cima do coitado. André esquece as dores da viagem e se entrega ao amor da irmã. Lúcia vê o jeito do rapaz e percebe que não toma banho algum tempo.

Lúcia: Esse é o meu noivo?

João Miguel: Sim, e faça uma cara de feliz.

André anda com dificuldade e Neuza pega uma das malas do irmão, Seu Jair emocionado abraça o filho e mata a saudade que o sufocou a tanto tempo.

Seu Jair: Meu filho voltou!!!

João Miguel se aproxima e logo se apresenta ao rapaz.

João Miguel: Então esse é o famoso André. Muito prazer meu rapaz, seu pai me falou muito bem de você!

André: Mu...mu...mu...muito, prazer.

Neuza: Nossa meu irmão, como está magro.

Lá na cidade não tem comida?

André: Muito tra...tra...trabalho.

Seu Jair: Esse rapaz é o meu orgulho, esforçado. Nem precisa trabalhar, mas mesmo assim faz questão!

André olha para Seu Jair sem entender a afirmação do pai, o rapaz não tem um gato para puxar pelo rabo.

Seu Jair: Meu filho, essa é Lúcia. Uma flor de pessoa e será a sua futura esposa!

Agora que o rapaz não entende nada, mas logo vê a beleza da moça, pega a mão da cobra e lhe beija com toda cortesia.

André: Muito prazer.

Lúcia: O prazer é meu André.

João Miguel: Bom, a conversa está muito boa, mas vamos logo para a fazenda. Sebastiana está cuidando de todos os preparativos para o almoço, vai ser de lamber os beiços!

Seu Jair: Vamos compadre, as minhas tripas estão dando nó!

Hahahaha!!!

André cansado da viagem e com medo do que o pai estaria aprontando, olha para Neuza e aperta a mão da irmã.

Neuza: No caminho te conto tudo.

Ao sair da estação de Pedra Azul, João Miguel avista o delegado Ataulfo passando com toda a sua paciência.

João Miguel: Óh! Delegado!!!

Lúcia não acredita no que vê, não consegue ter um minuto de paz.

Ataulfo: Grande João Miguel! O que faz em Pedra Azul?

João Miguel: Vim buscar o meu futuro genro na estação.

Ataulfo: Esse rapaz? Parece ter um bom caráter!

Seu Jair: Tem muito caráter, é um advogado formado com todas as honras!!!

Ataulfo: Isso é bom, é o futuro do nosso Brasil!

João Miguel: Mudando de assunto, o senhor delegado aceita o convite de almoçar em minha casa!?

Faço questão que o amigo esteja presente em um momento tão especial!

Ataulfo: Mas é claro que aceito. Estava voltando da delegacia e estou com a tarde totalmente livre.

Neuza: Então vamos todos!

Em Pedra Azul os amigos conversam besteiras, na fazenda José pega em segredo a espingarda de Adamastor e sai em direção à mata, para caçar uma onça. O rapaz passa pela vegetação densa atravessa o riacho e desce o barranco, se afastando das terras de João Miguel. Ao alto da copa do Jequitibá, uma moça observa a concentração de José, parecendo ser uma expectadora de toda aquela história. Em um momento se descuida e deixa um galho cair, bem em cima da cabeça do rapaz, então José aponta a espingarda para o alto e vê uma índia. Baixa a arma e pergunta.

José: Quem é você?

Índia Inhatambé: Não se lembra?

Sinal que a poção deu certo!

José: Está louca?

Índia Inhatambé: Eu que lhe pergunto o que faz aqui?

O seu lugar é junto com os brancos!

José: Não é da sua conta índia.

Índia Inhatambé: Quando o homem branco vem tirar algo da floresta, é sim da minha conta.

José: Como sabe que vim atrás de algo na floresta?

Índia Inhatambé: Pelo simples fato de estar empunhando uma arma!

José: Estou atrás de uma onça, preciso levar viva para João Miguel.

Índia Inhatambé: Fez pacto com o coisa ruim!?

José: Fiz um trato, se levar uma onça viva poderei morar na fazenda.

Índia Inhatambé: Entendo, como eu faço parte dessa história, vou lhe ajudar!

José: Como?

Não entendo.

Índia Inhatambé: Não pense muito meu rapaz, sua cabeça vai sair fumaça e não quero um incêndio aqui.

Hahaha!!!

A índia pula da grande árvore, e profere algumas palavras em tupi. Logo os ventos se agitam no meio da mata e vão de encontro ao corpo da índia. O que eram mãos se transforma em grandes garras, o que eram cabelos se transforma em pêlos o que eram um rosto de mulher se transformam em uma onça.

Vinicios Gonsalo
Enviado por Vinicios Gonsalo em 02/11/2014
Reeditado em 02/11/2014
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