RP - TESTAMENTO - PARTE 23

TESTAMENTO

PARTE XXIII

Gart inicia a leitura. Respira fundo e começa:

- “Querido neto, Garret. Meu garoto. Não sei como você vai receber essa notícia, não agora que estou escrevendo essa carta, mas saberei quando você estiver lendo, pois já não estarei mais com você fisicamente, apenas em espírito”.

Gart sente a garganta apertar e para de ler.

- Se não quiser, não precisa ler em voz alta. Lê só pra você, Wagner diz, também emocionado.

- Espera só um pouco... Gart fala, com a voz saindo apertada da garganta. Respira novamente e continua:

- Acredite. Não soube disso muito antes de você. Meu filho não quis comunicar a mim o seu nascimento antes de voltar à Inglaterra, depois de uma viagem de seis meses à Escócia. Queria fazer surpresa, mas não teve nem tempo de pisar em solo inglês. O jato em que estava com minha nora Lenina, caiu e tirou a vida dos dois, antes mesmo de eles chegarem a Londres.

O que fez você sobreviver ao acidente, só Deus sabe, pois foi Ele quem o salvou das chamas quando o avião caiu. Ninguém, além de você, sobreviveu ao acidente. O aparelho caiu numa serra próxima a Cumbrian no norte da Inglaterra e foi totalmente destruído. No início, ao tomarem conhecimento do sinistro, as autoridades da região perderam as esperanças de encontrar algum sobrevivente, pois o avião levava trinta passageiros e todos eles foram encontrados carbonizados em meio aos destroços. Mas, algumas horas depois do início do resgate do aparelho, você foi encontrado quase morto, enrolado em cobertores, no meio da neve. O que ajudou no encontro foi o vermelho vivo dos cobertores. Procuraram saber quem, dentre os passageiros, eram seus pais, mas não havia registro em Glasgow de ter embarcado nenhum casal acompanhado de nenhuma criança com idade inferior a seis meses. Todos os parentes das vítimas foram interrogados, inclusive eu e sua avó, e todos afirmaram não saber de criança nenhuma. Ninguém sabia de nada a seu respeito e o trouxeram para Londres. Sua avó ficou muito doente com a fatalidade e resolveu, já que havia perdido nosso filho, receber você no Orfanato Saint Laurent como sendo mais um de seus netos postiços, como ela dizia.

Você ficou muitos meses internado num hospital se recuperando, cuidado pelos melhores médicos que pudemos encontrar em Londres e protegido pela fé de Stace. Por tudo isso, mais uma vez você conseguiu sobreviver. Foi também por isso que você sempre foi o predileto dela, no meio dos outros garotos do orfanato. Infelizmente, Stace morreu sem saber a verdade. O neto postiço que ela tanto amava, era seu neto legítimo.

Gart para novamente, emocionado. Wagner está com a testa apoiada nas mãos e também chora em silêncio. Gart continua:

- Há dois anos, apareceu aqui em Londres, vindo me visitar, um ex-colega de escola e amigo de meu filho, Ted Lawson. Ele dizia que havia encontrado Stephen em Glasgow, na época da viagem dele ao país e que tinha sido inclusive convidado para ser padrinho de seu filho recém-nascido. E a alegria de ter reencontrado o amigo foi tanta que ele quis aproveitar a oportunidade e deixar com ele algum vínculo que os fizesse se reencontrar depois algum dia. Lenina tinha saído grávida de poucos meses da Inglaterra e a gravidez foi descoberta na Escócia. O fato foi muito comemorado, mas eles não quiseram nos contar nada para fazerem surpresa quando voltassem para casa. Ted Lawson veio à Inglaterra para rever o afilhado e acabou por saber que o amigo não estava mais entre nós. Quando ouvi essa revelação, tudo foi se juntando na minha cabeça. A criança encontrada na neve era o filho do meu Stephen que milagrosamente havia sobrevivido ao acidente. Era você. Senti vontade de morrer pela segunda vez, já que sua irmã, minha neta Christy, havia me dado um profundo desgosto no passado, fugindo para o Brasil com um homem que eu não aprovava. Não tive coragem de revelar a você a verdade em vida. Não sabia como você reagiria ao saber que tinha sido trazido para trabalhar nesta casa, sendo meu neto, mesmo que eu ignorasse o fato, e fui covarde o bastante para nem tentar. Todo tempo, sabia que você era algo especial para mim e para Stace. Ela sentia isso também, só não sabíamos o que era. Perdoe-me a ignorância involuntária e pela covardia de não ter coragem de dizer ao meu guarda-costas que ele era meu neto, filho do meu filho amado e que eu não tive chance de amar por causa de um acidente estúpido. Uma fatalidade. Portanto, deixo a você os bens de seu pai e minha bênção. Seu avô. Stanley Tybald Aubrey Russel.”

Gart dobra a carta lentamente. Wagner se levanta e se aproxima dele.

- É muito bonita sua estória.

Gart ergue os olhos molhados para olhar para ele e pergunta:

- Bonita? O que tem de bonito perder os pais num acidente e ser criado num orfanato por dezoito anos?

- Ficar vivo. Você sobreviveu a um acidente horrível onde ninguém ficou pra contar a história. Isso não é fatalidade nem acaso. É milagre.

Gart se levanta também.

- Não posso te dizer que eu não estou feliz por isso, Wagner... mas isso não me faz esquecer o que eu passei naquele orfanato.

RETORNO AO PARAÍSO – TESTAMENTO

PARTE 23

OBRIGADA E BOA TARDE!

DEUS ABENÇOE A NÓS TODOS!

Velucy
Enviado por Velucy em 13/03/2018
Código do texto: T6278582
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