RETORNO AO PARAÍSO - POR QUE... II

RETORNO AO PARAÍSO

POR QUE...

PARTE II

Wagner pensa por um momento e lembra-se da mãe.

- Acho que eu sei do que você está falando... Da minha mãe, não é? A primeira pessoa que você... odiou...

Cláudio olha para ele sem dizer nada.

- Lamento tanto por isso, meu irmão. Mas esse ódio não pode ser computado nessa equação. Você era uma criança. Não tinha nem ideia de que sentia ódio ainda. Você nem sabia o que era isso...

- Eu não odiei sua mãe quando criança. Como você mesmo disse, eu não sabia direito o que sentia quando ela... me ignorava quando eu a chamava... de mãe... e gritava comigo quando eu insistia... Eu não sabia chamá-la de outro jeito... Ela só não me batia por que tinha medo da reação do meu pai, se ele visse ou descobrisse, e me mandava ir brincar e fica longe dela.

Os olhos de Cláudio lacrimejam e ele passa a mão pelo rosto, tentando conter a emoção.

- Eu a odiei mesmo... de coração... quando meu pai me disse que ela não era minha mãe... e eu já tinha quatorze anos, idade suficiente pra entender a dimensão disso. De tudo que eu passei. Naquele momento... eu descobri dentro de mim um sentimento diferente... Cheguei a odiar por um curto espaço de tempo... todo mundo... Christy, minha mãe verdadeira, meu avô, até meu pai... Todo mundo... Todos que tinha colaborado praquela... mentira que era minha vida.

Ele respira dolorido e fecha os olhos. Wagner também chora em silencio.

- Meu pai conversou muito comigo depois daquilo. Foi muito claro em dizer que me amava demais e que nada daquilo podia interferir na minha vida dali adiante. Que o que importava era o que nós dois íamos viver juntos depois; nós três e... futuramente com a nova namorada dele, Magda, a quem eu já tinha sido apresentado, numa visita que ele fez a ela em Tambaú. Ele não falava abertamente comigo, mas estava já decidido a se casar com ela pra... nos dar uma... mãe. Ele queria mudar e acabar com a tristeza que tinha sido a nossa vida até ali. Queria... dar um pouco de leveza e alegria pra todos nós, depois de tantos anos...

- E você perdoou todo mundo e, depois da Magda, a gente foi mais feliz... não foi?

- Eu já era feliz antes disso. Depois que sua mãe morreu, eu vivi. Depois que meu pai me contou a verdade... a partir dali... eu congelei meu coração. Não me permitia sentir mais nada. Nem tristeza nem alegria... por nada. Resolvi viver a vida que meu pai queria que eu vivesse. Ele tinha me feito... morrer e renascer de novo, apenas contando a verdade sobre mim. Eu já não era o mesmo Cláudio. Era só um adolescente que estava disposto a fazer o que tinha que ser feito, sem surpresas... sem emoções fortes. Meu primeiro propósito era estudar muito pra me formar médico no futuro e cuidar de você, como eu já te contei. Você era um molequinho magricela de cabelos encaracolados, manhoso e chorão, que vivia correndo atrás de mim aonde eu ia. Parecia um carrapato grudado em mim. Me fazia perguntas de vez em quando que eu não queria responder sobre... sua mãe... que você achava que era nossa mãe... Você tinha curiosidade de saber quem era aquela mulher da foto no seu quarto. Eu desconversava, te enrolava e mudava de assunto, chamando sua atenção para outra coisa qualquer, só pra te fazer mudar o foco da conversa. Você sempre se contentava. A minha palavra era mais importante pra você do que a do nosso pai.

- Você era como um pai pra mim... diz Wagner. - Ainda é...

Cláudio sorri e toca o rosto do irmão.

- Mas eu sofria por saber que as nossas vidas não estavam tão ligadas quanto eu gostaria. Você sabia tudo que eu pensava, justamente por ser tão ligado a mim. Você descobriu de primeira que eu... não estava tão apaixonado pela Tânia quanto meu pai e os pais dela imaginavam. Ninguém te ouvia quando você ficava zangado quando eu saia com ela. Achavam que era ciúme de irmão. Passou a hostilizá-la a ponto de não querer entrar na igreja no meu casamento... E eu sabia o que você estava sentindo, mas não podia mais impedir, infelizmente... Eu me casei, aos dezoito anos, e... dentro de mim mais alguma coisa morreu: a vontade de lutar pra ser feliz de verdade. Comecei a tentar ser feliz um dia de cada vez. Toda vez que chegava em casa e me deitava na cama pra dormir com Tânia, eu ficava olhando para ela dormindo do meu lado, sabendo que não tinha mais volta. Foi bom no início, nos dois primeiros anos... mas depois... ela começou a mostrar sua verdadeira personalidade... Além de depender muito da mãe, era fútil, nunca cozinhou um ovo em casa e se zangava comigo se eu olhava para minhas colegas de faculdade, quando alguma delas ia fazer estágio comigo na Santa Casa e ela ia comigo só pra me vigiar. Parei de me preocupar com isso e procurava ter paciência com ela. Me joguei nos estudos, terminei a faculdade e... minha relação com Tânia ficou ainda mais estagnada... quando eu recusei outra vez a proposta dela de ter um filho. Primeiro tinha sido porque éramos muito jovens e ela até concordou; depois por causa da faculdade e ela admitiu que esse momento era importante pra mim... depois... eu não tinha mais nenhum motivo plausível, mas eu não sentia mais nada por ela. Minha amiga amada do passado tinha se tornado somente a mulher com quem eu dormia na mesma cama e morava na mesma casa. Isso me matava um pouco todo dia, mas eu não tinha mais direito de reclamar de nada. Até que eu conheci a Mônica... me apaixonei e comecei... bem lentamente a odiar Tânia... Um ódio contido, silencioso, que eu não podia externar... por respeito aos pais dela, ao meu pai e a ela mesma, que não tinha culpa de nada.O erro era meu.

Cláudio se levanta e passa a mão pelo rosto. O peito aperta.

- Como você pode ver... Essa doença maldita que está dentro da minha cabeça, não está aqui por acaso. Eu disse ao Miguel, quando ele ficou indignado quando soube do meu diagnóstico, que ninguém passa pelo que não merece. Alguma coisa eu devo ter feito para estar passando por isso. Eu me revoltei com várias coisas e odiei várias pessoas a minha vida inteira, mas guardei isso pra mim. Isso se condensou e se transformou num pequeno tumor... aqui...

Cláudio coloca a mão na cabeça e fecha os olhos, começando a chorar. Wagner se levanta e envolve o irmão num abraço.

- O perdão não dissolveria essa coisa?

- Não tem mais como acontecer isso. Eu não culpo mais ninguém por nada, mas não tenho mais como perdoar com palavras... sua mãe e meu avô que estão mortos... e eu nem sei se quero. Talvez isso dificulte as coisas...

- Perdoa meu pai neles dois. Meu pai está vivo, Cláudio.

- Mas eu o amo demais e não posso perdoá-lo por nada. Eu já perdoei há treze anos. Ele se desdobrou para me fazer feliz o quanto pode. Pra ele não cabe mais perdão. Eu o amo demais.

- Quer dizer que... você não vai se curar?

- Não sei... Deus é misericordioso... Não sei...

Os dois ficam algum tempo abraçados e Cláudio volta-se para ele e sugere:

- Vamos dormir? Daqui a pouco amanhece e papai está vindo aí. Precisamos descansar. A maratona vai ser complicada.

- Vou ficar mais um pouco aqui...

- Tudo bem. Boa noite, meu irmão.

Cláudio beija a testa do irmão e entra na casa.

RETORNO AO PARAÍSO – POR QUE

PARTE II

OBRIGADA POR SONHAR COMIGO!

BOA TARDE!

DEUS NOS ABENÇOE A TODOS NÓS!

Velucy
Enviado por Velucy em 15/06/2018
Código do texto: T6365261
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