'E A FESTA ACABOU' - do livro "Giulia- Quando a Luz se apaga"

Aquilo lhe parecia tão sexy. O nó desfeito da gravata borboleta que pendia de forma displicente no colarinho desabotoado de sua camisa branca, ainda impecável. Tão sexy que, por segundos, ela perdera o fôlego enquanto ele, sem nenhuma razão aparente, a não ser pela essência de Lavanda que lhe chegara às narinas, virou-se para ela como se tivesse sido chamado pelo nome, então disse algo a um amigo, batendo em seu ombro, endireitando-se, e ainda cambaleante, começara a abrir caminho em sua direção. Estava rodeado por meninas tão ou mais atraente do que ela, Giulia pensara enciumada, contendo o riso e a fúria diante dos olhos dele. Os olhos que a fascinavam desde criança resplandeciam agora em sua direção. Os olhos cheios de meiguice e desejo e pitadas de algo a mais que somente ele possuía. Um jeito moleque atrevido e convencido naquele andar cheio de autoconfiança. Em pensar que, havia pouco, ele estava aos prantos, debruçado sobre a mesa, imaginando que sua noite havia se acabado quando tudo estava apenas por começar.

Por mais que tentasse, Giulia não conseguia mover os pés e desgrudá-los do chão diante daquele deus grego com a expressão mais inocentemente cafajeste que havia visto em toda sua vida. Ela era dele! Seu corpo todo gritava que ela era dele. Sua alma ansiava por seu abraço, seus afagos. Agora, ele era dela e de mais nenhuma outra. Só meu. Sussurrara quando sentira o tronco dele de encontro ao seu, suas mãos que se cruzavam nas costas dela, logo acima de seu cóccix, apertando-a contra si como a afirmar que ele seria dela e de mais ninguém. Mãos que a agarravam pelo pescoço, trazendo sua boca para perto da sua e mal ouviam as vozes desafinadas, em coro, aos gritos de 'La bamba se necessita', embora sorrissem, agora satisfeitos, da algazarra em que a festa, enfim, se transformara. As bocas famintas que se procuravam e se encontravam e se esqueciam de tudo o que havia ocorrido até ali. Nada mais, além daquele momento em diante, teria valor para os dois corações que batiam e uníssono. Beijavam-se escandalosamente em meio a um canto do salão, próximos à pista de dança. Ouviram os vivas dos pais exultantes e entusiasmadíssimos. Riram juntos, entre um beijo e outro. Eles estão demais hoje, comentara Giulia num curto intervalo em que pudera respirar para, logo em seguida, voltar àquela boca macia, perfeita, dentes brancos e os caninos vampirescos mais fofos do mundo inteiro. Não pensara em momento algum em Carlos. Não sentira saudades dele. Percebera, ali, nos braços de Nando que pertencia a ele e dele seria até o fim dos dias. O que sentia por ele era leve, alegre, lírico, longe das trevas, fantasmas, demônios. Ele era a realidade, a racionalidade, a praticidade de se viver um dia após o outro, sem se ocupar com o que viria logo a seguir. Ele era a cura para suas doenças, seus desvios de conduta. Ele a traria de volta ao mundo dos vivos quando o Sombrio teimasse em levá-la de volta ao Outro Lado. Nele se agarraria, em meio aos lençóis, de olhos cerrados, corpos unidos, em concha, mãos entrelaçadas e nada os separaria novamente. Quantos pensamentos um ser humano poderia ter dentro de um beijo? Para Giulia, milhares, pois não parava de pensar, enlevada, nas noites em que esperava pelo momento em que seria sua princesa e somente dele, quando, em sua adolescência, fora por ele esnobada. Agora, fitava as expressões desanimadas das meninas que havia pouco tempo, ocupavam seu lugar, ali, entre os braços fortes e as mãos salientes dele. E os beijos? Ahhh...que beijos demorados, molhados, ora delicados ora selvagens, dentes que mordiscavam-lhe os lábios inferiores, mãos que se embrenhavam em seus cabelos agora embaraçados, dedos que deslizavam até a ponta do decote. Um perfeito escândalo em meio ao populacho! Um horror! Ela ouvira um ruído vindo dele. Algo bem próximo a um riso misturado a um gemido. Uii! Ela o afastara com violência e os olhos que os buscavam com devassidão.

- Aqui não, bobinho.

- Não consigo ficar longe...- ronronara ao seu ouvido, sentindo seus seios contra seu tórax. - Por onde andou? Por que me fez esperar tanto? - Ela poderia explicar cada passo de sua assombrosa trajetória, conquanto soubesse que ele preferiria não acreditar em uma palavra sequer. - Vc não me traiu, traiu? Ora, vejam só! O garanhão que seduzia somente pelo prazer em desprezar estava ali, em suas mãos, tão indefeso quanto uma criança, implorando por exclusividade. Aquele seu lado carente era, para Giulia, uma agradável novidade. - Me diz! - Apertara-lhe os braços, engrossando a voz, abrindo os olhos onde ela poderia se perder e nunca mais achar o caminho de volta.

- Claro que não. Sou sua. E vc? - Sua voz era baixa e cheia de receio. Queria fugir do inferno que a perseguia e descansar em seu colo, segura, protegida. - Vc se engraçou com alguma delas? - Apontara com o queixo ao grupinho que ainda permanecia logo ali atrás, unido, à espera de algum desentendimento entre o magnata das massas e a noiva do demônio. Afinal, elas a viram a conversar sozinha, gesticulando como louca. Algumas afirmaram tê-la visto deitada sobre o banco de pedra dos jardins, entre os arbusto, nua em pelo, possuída por alguma entidade maligna e invisível. Ouviam seus gemidos enquanto seu corpo se contorcia de prazer sob a luz da lua cheia. - Sabe que Isabella ainda tem esperanças, né? - Estavam abraçados agora e conversavam sem a menor pretensão em separarem seus corpos que pareciam grudados com uma cola super potente. Ela sentia seu membro rígido e ele fazia-lhe confissões que a ruborizavam. Riam-se gostosamente como dois amigos de volta da 'pelada' aos domingos, abraçados um ao outro, subindo a ladeira de volta à casa lilás, em dia de macarronada. - Estamos dançando? - Ela perguntara, pois o sentia a mover os quadris de um jeito desconcertado que só ele. Puxara ao pai. Como dançarino, era um exímio contador.

Os convidados mais exaltados, suados, eufóricos, exaustos, voltavam aos seus lugares, ávidos por mais bebida e comida como se estivessem em um restaurante e fossem pagar pelo que consumiam. No entanto, Fernando, mente brilhante, havia contado com todas as possibilidades e probabilidades e suas variantes. Com um ligeiro aceno ( e Giulia sentira um frisson a lhe percorrer o corpo eletrizado por conta daquele aceno e de seu poder de comando e aquele jeito de homem de negócios que a fazia ter desejos quase incontroláveis), Nando fazia surgir uma nova rodada de drinks e salgadinhos fumegantes e logo o povo tratava de agarrar os garçons indefesos e fazê-los esperar até que cada pratinho fosse devidamente preenchido com, ao menos, dois espécimes de cada croquete e, somente então, com os pratos cheios e um sorriso confiante, liberavam os meninos que pareciam exaustos aos olhos de Giulia. Um relance do crocodiliano viera-lhe à mente. Sentira um medo profundo de que ele surgisse do nada, da mesma forma como havia desaparecido. Procurara pelas mãos fortes e sempre protetoras de seu melhor amigo e não as encontrara. Meu Deus! Estava sozinha novamente. Agora, as luzes se apagavam por completo, enchendo-a de um terror absurdo. Levara as mãos ao rosto, debulhando-se em lágrimas Céus...o que é isso? Espantara-se ao olhar o chão. Primeira a escuridão...agora, as brumas. Não. Não quero voltar! Nando! Não quero voltar. Ouvira o as primeiras notas do piano e a voz inesquecível de Kate Bush, a mulher louca, vestida de branco que bailava de uma forma exuberantemente exótica e que cantava a história de um dos livros que Giulia amava. Na verdade, gostara mais do filme do que do livro, mas...por Deus! As brumas, o 'fog' tomava conta de tudo. Não conseguia enxergar nada à sua frente. De olhos cerrados, queria o quê?? De olhos cerrados, sentira a dor de Cathy, a protagonista do livro. Para ser franca, sentia-se a própria em todas as vezes em que ouvia a canção e punha-se a girar e a girar com os braços erguidos, mãos de borboletas, e no rosto, uma expressão de pesar em ter perdido seu grande amor. Queria voltar do mundo dos mortos, das neblinas, das charnecas e agarrar a alma de seu Heathcliff e levá-lo consigo. Era um amor louco e possessivo o dela. - Heathcliff! Heathcliff! - Giulia o chamava, deslizando por entre os montes onde os ventos uivavam. Uma visão e tanto a da bailarina com seu vestido branco, estilo 'noiva de Bram Stoker', rodopiando, correndo com seus pezinhos delicados e saltando em meio à pista de tábua corrida desocupada especialmente para ela. Somente por ela.

- Vc exagerou na fumaça, cara! - Exaltava-se, preocupado, Nando ao lado do DJ que sorria, totalmente despreocupado com a brisa leve de seu cigarrinho de ervas cuja fumaça misturava-se ao fog britanicamente suburbano. - PORRA! PRESTA ATENÇÃO! - O DJ "Everything's gonna be alright' assentira com a cabeça e o cigarro no cantinho da boca. Olhe só que proeza! O rapaz ainda conseguia ostentar um sorriso sem deixar a guimbinha com a brasa acesa cair no chão. Fernando chegara a pensar que, caso isso acontecesse, seu amigo 'Bob Marley' teria uma síncope e enfartaria ali mesmo. - NÃO SE ESQUEÇA DA MÚSICA NA HORA CERTA! - Fitava o amigo com sangue nos olhos e, em resposta, recebera um aceno de cabeça onde se lia: "Podes crer! Tá tudo sob controle. Fica tranquilo, meu irmão". - Porra, me ouve! Tem que ser no momento certo, embaixo do azevinho. Cara! Vc sabe o que é um azevinho!? Eu te expliquei, caralho! A porra da folha ali pendurada! A luz tem que...PUTA QUE PARIU! Tu não vai estragar a minha surpresa! - Afastava-se dele e daquele sorrisinho irritantemente pacífico. - Vá tomar no cu! - Xingara a caixa de som, apressando os passos em direção a ela. Odiava vê-la chorar. Como dança bem a diaba! - Se alguma coisa der errado, eu te meto a porrada, filho da puta. - Ainda praguejava, a poucos metros dela.

- Heathcliff! It's me. Cathy! I've come home! - A fumaça dissipava-se aos poucos e os rostos que vira a fitavam com uma estranha expressão de assombro. - Vcs o viram!? - Avançava na direção dos convidados agora, de fato, assustados. Temiam uma reação violenta por parte da noiva de Lúcifer. - MEU HEATHCLIFF! Está na charneca??? Ou no vilarejo?? Digam! Digam!

- Celeste, querida, ela está surtando! Por Deus! Isso não é bom. - Enzo, mafioso, até tentara levantar-se do sofá onde se jogara após a maratona de danças e acrobacias ao som de seus ídolos, a fim de socorrer sua filha, largada em meio às brumas. Ele sabia o quanto aquela música a fazia sonhar e fugir da realidade. Chegaria a tempo de salvar Cathy que voltara a chorar e a sorrir e a girar uma outra vez, encantada com a saia que formava um perfeito sino em meio aos campos verdejantes, no entanto, as dores nas articulações e os pés espremidos em seus sapatos lustrosos os mesmos que negava-se a retirar peremptoriamente, o puxaram de volta à poltrona. Quedara-se ao desânimo, indignado com o sorriso complacente e compreensivo que Celeste lançava a ele. - Ela sofre, mulher!

- Acalme-se, Don Vito Corleone. O espetáculo ainda está por começar...- Beijava-lhe a bochecha, aconchegando-se a ele, cabelos em completo desalinho e...feliz.

- Cathy...- Giulia, num rodopio o vira atrás de si. Estacara de imediato. Sua saia farfalhava, suas mãos tremiam. Seu rosto era um perfeito retrato do desespero. Olhos borrados e os filetes negros do rímel misturados ao lápis, escorriam por suas faces lívidas, olhos vagos. - Sou eu, seu Heathcliff. - Estendera-lhe os braços, já amargamente arrependido por ter pensado que aquela música lhe traria alegria e equilíbrio. Ora, homem! Equilíbrio!? Desde quanto Giulia foi sinônimo de equilíbrio!? Abrace-a. Conforte-a e faça o que tem de ser feito! AGORA! - Me perdoa. - Falava baixinho e abraçava tão fortemente que ela chegara a sufocar, entre soluços e palavras desconexas.

- Não me deixa mais, Heathcliff...

- Sou eu, Nando. Lembra?

- Claro sim! - Dera um tapa em sua própria perna e rira aos gritos. - Não sou louca. Me abraça, me beija, me tira daqui! Não suporto mais esses olhares estranhos. O que pensam que eu sou??? Uma bruxa??? Um demônio??? Heim??? E por que vc bebeu tanto, Fernando Tomazzini!? Achou que eu não havia percebido?? Hã?? Hum?? - Ele estava prestes a desfiar o rosário das desculpas que o levaram a beber um pouquinho além da conta, quando, de súbito, a música tão ansiada e combinada com seu amigo 'Everything's gonna be alright' chegara na hora exata. Até que a erva não danificou seus neurônios, pensara a respeito do DJ, enquanto sorria satisfeito.

- Ei! Para de falar e me ouve! Para...para de se remexer e de apontar esse dedo pro meu nariz. Para...Giulia. GIULIA. - Ele a calara num beijo caliente. Arquejos de surpresa, espanto, euforia e alguns soluços de ódio vindos lá do fundo do salão.

- Dança comigo? - Ela ainda recuperava o fôlego, olhos entusiásticos e um sorriso radiante. Em pouco tempo, ele tentava conduzi-la em seus braços, rezando para não pisar em seus pés, pois sabia o quão perigoso aquilo poderia ser. Da última vez, o erro custara-lhe dois dias sem poder andar direito. Ela esmagara seus dois dedos do pé esquerdo. "Eu sempre tentei te ensinar a dançar e vc preferia sair com as peitudas e agora vc vem e me machuca! TOMA!" - Tô indo bem? - Perguntara baixinho, receoso. Ela ria de jogar a cabeça para trás. Ouvira seus pensamentos. Reconhecia seu medo. - Vc não tá lendo...

- Tô! - Outra risada histérica. Largava-se ao lado dele, sentindo totalmente segura. E que vcs vão pro diabo que os carregue! Lançava seu olhar diabólico sobre os que a fizeram sofrer naquela noite, sem ter a menor noção do horror que estaria causando a eles, pois, se tivesse a menor noção, além do olhar, lançaria um feitiço sobre a corja de maledicentes. - Não vou te machucar, meu amor. Te amo. Sabe que essa é a nossa música, não sabe? - Ouviam "The first time ever i saw your face", a versão de 1972, cantada por Roberta Flack. - Quando eu vi seus olhos pela primeira vez...

- Amor...- Ele debochara. - Isso foi aos dez anos. E vc, tinha seis.

- Ora, cale-se! - Escondera o rosto na curva perigosa entre seu pescoço e o ombro. - Não faz diferença...- Murmurava, de olhos fitos no teto e suas luzes brilhantes. - Em todas as vezes que olho pra vc, eu vejo o sol que ilumina meus dias. E, a primeira vez que vc me beijou...- Ele a ouvia e se lembrava de cada momento narrado por ela com tanta emoção! - Eu realmente senti a terra tremer ou era meu coração que não sabia o que fazer. - Ele então encostara sua testa à dela, francamente emocionado pela voz serena e baixa da moça que o enlouquecia. Ele a fitava com tanta ternura. - E...- Sua voz embargara. Engolira em seco e, com os olhos turvos, continuou. - Quando fizemos amor pela primeira vez, eu senti uma alegria tão intensa que eu tinha a certeza de que seria para sempre...'til the end of time'.

- Eu te amo, Giulia.

- Eu te amo, Fernando. Não duvida disso, por mais estranho que tenham sido esses dias e eu realmente não me lembro deles, não duvide que eu te amo, mais do que qualquer outra pessoa nesta vida. - Ele quisera perguntar "Mais até do que Carlos?" - Ela o fitara com os olhos flamejantes e assentira com a cabeça. - Mais do que qualquer pessoa nesta vida. - Beijaram-se de forma calma, tranquila, repleta de carinho e seus medos se dissipavam dentro daquele beijo, embora Giulia ainda fitava com certo desconforto aquele grande ramo de visco suspenso do teto em uma fita de seda vermelha. Tentara se conter a fim de não estragar o clima tão perfeitamente sereno, mas...- PELO AMOR DE DEUS, FERNANDO!

- O QUÊ!? - Ele recuara, espantado e, por Deus, se o pobre sofresse do coração, teria enfartado ali, naquele momento. Como assim 'se ele sofresse'? E quanto aos resultados dos exames negligenciados por ele na ocasião da luxação no joelho? - Que porra de mania de me assustar! - Ele a puxara de volta ao seus braços, encostando-se ao seu corpo com violência. Ela o apreciava deveras quando a tratava daquela forma. Sorria. - Por que o escândalo?

- Aquela coisa ali pendurada, Fernando! Aquele pedaço de guirlanda! Acorda! O Natal já passou faz tempo! Foi vc, não foi!? Foi vc quem pôs essa bosta aqui em cima???

- Deixa de ser burra!

- Burra é o cacete!

- Burra sim! Isso é um a-ze-vi-nho!

- Fo-da-se! Azevinho ou não é ridículo pendurado aqui em cima. Na boa, cara??? Parece macumba! - Era ele, agora, quem uivava de tanto rir. Afastara-se dela e quase cairia se não houvesse se apoiado à mesa ali ao lado. - Não ria! Não vejo graça. O que significa isso? - Braços ao longo do corpo enrijecido, mãos em punho e os olhos semicerrados.

- Amorzinho...

- NÃO ME CHAME DE AMORZINHO!! - Agora o casal chamara a atenção das moças que deixaram de soluçar e apuravam a audição para não perder uma palavra sequer de um possível rompimento. - Vc sabe o quanto eu odeio sarcasmo e ironia. - Ela o segurava pelo colarinho da camisa social. Fitara seu pomo-de-Adão. Ai, meu Deus. Seu pomo-de-Adão a tirava do sério. Não saberia dizer se o esbofeteava ali mesmo ou se metia a língua naquele estranho e excitante ovo abaixo de seu queixo que o tornava tão apetitoso. - Fala, sabichão! Que bosta é essa!? - Erguia o braço tão imponente quanto a Estátua da Liberdade.

- Trata-se de uma tradição grega, amor. - Ahh...eu amo os gregos, meu bem. - Reza a lenda que se duas pessoas estiverem embaixo de um desses - Apontava para cima. - Devem se beijar para trazer sorte. Entendeu? - Ah...dito daquele jeitinho tão suave e aquelas covinhas que a enlouqueciam...

- Ah, tá. - Ele novamente a puxara com violência e arrancara-lhe um daqueles beijos cinematográficos.

- Uau...acho que vamos ter muita sorte. - Proclamara, sorridente. Um daqueles sorrisos abobalhados.

- Não tô bem...- De súbito, ele caíra de joelhos, troncos curvados, com as mãos que se enfiavam nos bolsos da calça sob o olhar atônito de Giulia. Enzo 'Corleone', em vão, lutara por se levantar do sofá macio que o engolia. Deveria ajudar o filho!

- Ele está passando mal, Celeste! - Ela o detivera com a mão em seu braço e um olhar enigmático. Erguia um cacho de uvas verdes e engolia as uvas, uma a uma, com tamanha calma que realmente o indignava ao extremo. Estava es-plen-do-ro-sa. - O que há com vc, criatura!? É seu filho!

- Só mais uns minutos e tuuudo será explicado, meu bem! Quer uva?

- Por quem sois! - Exclamava abatido, impotente, com uma uva na boca. Hummm...Deliciosa.

- Perdão, amor. Levanta! Deixa que eu te ajudo. - Ela o segurava pelas axilas, empregando toda sua força por reerguê-lo do chão. Estranhara a indiferença dos tios que pareciam estátuas a fitá-los com uma ligeira apreensão em seus olhos fixos neles. - Vem...levanta! Faz força! - Então ela se dera conta de que ele já não se apoiava em ambos os joelhos...apenas em um. - Puta que pariu! - Exclamara, confusa. - E ele a segurava pela mão.

- Giulia Tomazzini...

- Ai, Jesus. - Ela balbuciara, olhos arregalados, fitando-o de cima para baixo. Novos arquejos de surpresas, palmas antecipadas e fortes soluços e desmaios lá no fundo do salão.

- Quer se casar comigo? - E vc me faz esse tipo de pedido aqui, no meio dessa gente??? Sabe como eu sonhei com esse dia??? Deus do céu! Pai amado! Se isso for um sonho é melhor o Senhor me matar porque quando eu acordar, eu mesmo dou conta do serviço! Ai...não tô bem...não desmaie, imbecil. Diga sim! Sim! Diga sim! Olha lá as sirigaitas rezando pra ele desistir. DIGA SIM! DIGA SIIIIM!!! Ajoelhara-se no chão gelado e sussurrara contra seus lábios.

- Claro que sim!

Recostados no sofá, Enzo e Celeste estavam exuberantes! Eram a expressão perfeita da Felicidade. Seus filhos, enfim, se uniriam.

- Serão felizes como nós fomos, amor. - Dissera Celeste, relaxada, olhos fitos no teto de luzes piscantes. Sonhava com netos correndo por entre os corredores e cômodos, aos 'sábados de pizza'. - Parece um sonho...

- Sim. Serão felizes. - Ele concordara, olhos distantes, sorriso vago, fitando as luzes piscantes acima de sua cabeça que descansava no espaldar no sofá. - Sonhava com os dias em que brincava com seu carrinho de rolimã de madeira e as descidas super dinâmicas e arriscadas nas ladeiras de seu bairro. De súbito, retirava os sapatos lançando-os longe de si. - Tá doendo...

- Tudo bem, amor. - Ela se aproximou, coração acelerando. - Por que jogou o sapato assim...com raiva?

- Tô tão cansado...- Choramingou. - Posso deitar no seu colo?

- Claro, amor! Já vamos pra casa. A festa acabou. - Declarara, orgulhosa. - Estou louca pra deitar na nossa cama e pregar os olhos!

- Posso dormir com vc?

- Enzo! Que pergunta!

- Obrigada, mamãe. Tô com medo dos trovões...

Morgana Milletto
Enviado por Morgana Milletto em 28/09/2019
Código do texto: T6756396
Classificação de conteúdo: seguro