Neblina e a Ninja capítulo 7: Sequestro

 

CAPÍTULO 7

 

 

SEQUESTRO

 

(No episódio anterior vimos como Neblina, por meios tecnológicos, localizou o novo esconderijo de Ninja e seu bando para além dos limites de Nova Brasília. E descobriu que a quadrilha contava com a ajuda de três panteras negras, que tentaram cercar a vigilante quando ela investigava nas proximidades do covil dos bandidos. Entretanto, o despeito e ciúme de policiais ante a presença da mascarada irá atrapalhar as investigações.)

 

 

“Z” dessa vez não estava localizável e por isso Neblina dirigiu-se à Chefatura de Polícia. Isabela recebeu-a num pequeno gabinete, já que Madeira e outros figurões lá não se encontravam.

- O Madeira vai chegar a qualquer hora, Neblina, porque pretende fazer uma reunião daqui a pouco. Ele está na penitenciária interrogando presos.

— Mas se já estão na penitenciária, que têm a ver...?

— São dois traficantes que estavam foragidos e foram recapturados com a blitz de hoje. Os métodos do Madeira são muito antiquados, mas dão resultado.

— Sim, eu vejo que ele está se esforçando... você acha que esses dois têm contato com os Bandidos Negros?

— É muito provável! Neblina, essa mulher está espalhando os seus tentáculos por toda parte! Nunca vi isso! Ah, mas quero lhe dizer que lhe aprecio muito.

— Obrigada!

— Acho você formidável. O que fazem certos colegas com você é canalhice...

— Não diga isso, Isabela. Olhe, por favor, não temos tempo a perder. Eu descobri algumas coisas...

Neblina contou o que havia ocorrido e concluiu:

— Há pouquíssimo tempo para tentar alguma coisa. Tem que ser feito um cerco em movimento de pinças, com veículos-lagartas que penetrem no bosque para cortar a fuga da quadrilha...

— Mas Neblina, eles tiveram tempo bastante para fugir!

— Tem que ser dado um alarma imediato. Talvez se consiga alguma coisa.

De repente uma tela na parede começou a piscar. Isabela apertou um botão. A tela iluminou-se — e a figura ominosa da Ninja apareceu.

— Ora vejam! Que bom lidar com mulheres!

Isabel reagiu de imediato: — O que você quer? Como entrou em nossa frequência?

— Não foi fácil. Ah, aviso para não tentarem nenhuma brincadeira extra-muros. Terão muito o que fazer intra-muros. A propósito, cadê o idiota do Inspetor Madeira?

— Não está no momento.

— Quando ele chegar, pergunte-lhe pela filha.

Neblina ergueu-se.

— O que você quer dizer?

A Ninja riu.

— Será ótimo treinar ninjutsu com ela. Por que você não passa para o nosso lado, Neblina? Você tem qualidades... teria futuro comigo.

— Você está louca.

— Como quiser. Quem não é por mim é contra mim. E quem é contra mim eu aniquilo. Até mais ver.

A transmissão foi interrompida.

Neblina voltou-se para Isabela:

— Suponho que a tela principal esteja desligada.

— Sim, porque o Madeira fechou o gabinete... aí cai aqui. Mas se o que ela disse é verdade...

Um policial apareceu e avisou que a equipe de madeira estava chegando. Neblina sentia-se contrariada. Fizera uma descoberta importante: as feras treinadas da Ninja. Mas esta voltara a atacar antes que a descoberta pudesse ter utilidade.

Que terrível adversária!

 

 

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Quando Isabela deu o recado a Madeira, este empalideceu e correu para abrir o seu gabinete. Quando todos se dirigiram para lá, Lustosa voltou-se para Neblina:

— Por onde você esteve?

— Tenho um relatório a fazer... que aliás já fiz à Isabela. Mas agora há outra prioridade.

— É bom que você explique direitinho onde esteve!

Neblina, à entrada do gabinete, olhou firme para o polícia:

— Não sei o que você quer dizer. E nem me interessa.

— É bom tomar cuidado, mascarada!

Neblina já entrara, sem dar maior importância a Lustosa. Robson, sobrinho de Madeira e também detetive, dirigiu-se ao colega:

— O que você está querendo, Lustosa? Provocar a moça sem motivo algum?

— Você não fala como policial!

Robson ia responder quando Madeira, aos berros, pediu e impôs silêncio.

Inicialmente o inspetor-chefe ligou para casa. Apareceram dois rostos femininos aflitos.

— Que houve, Gilda?

— Já íamos ligar para você! Mas estávamos amarradas e amordaçadas...

— E Sonia?

— Eles a levaram!

— Eles quem?

A outra mulher, governanta da casa, quis falar mas rompeu em soluços. Afinal Gilda conseguiu dizer;

— Dois Bandidos Negros! Não sei como penetraram... e disseram que vão entrega-la à Ninja! Oh, meu Deus!

Madeira tirou um objeto do bolso da calça.

— Isso é que não! Ela usa localizadores e vamos encontrá-la antes que a tirem da cidade!

Madeira deu rápidas ordens: enviou um batalhão à sua própria casa (mais tarde saberia que os dois guardas haviam sido mortos) e reunindo o estado-maior iniciou a operação-resgate. Neblina teve de admirá-lo. A garota usava micro-aparelhos de sinalização nos sapatos, na fivela do cinto, na pulseira, em vários locais enfim. Algo com que os sequestradores não contavam. Tais aparelhos não eram fabricados no Brasil e tinham de ser importados. Terêncio Madeira gastara muito dinheiro com a segurança da família.

Neblina colou-se a madeira.

— Deixe-me ir com o senhor. Tenho algo a lhe contar no caminho.

— Está bem, mas não quero que interfira nas ações policiais. Você não usa armas!

Neblina não respondeu e entrou no hovercraft-lagarta sentando-se entre Barracuda, que tomou a direção, e o Inspetor-Chefe. Isabela, Robson e Cordeiro entraram atrás.

Madeira ligou o seu rastreador eletrônico, encaixando-o no amplificador do veículo. O sinal verde começou a pulsar, movendo-se pela tela, em clara indicação. O hovercraft seguiu pela sonoite de Nova Brasília.

No mundo subterrâneo o dia e a noite eram reflexos do exterior, portanto semi-artificiais. A energia sugada ao Sol era polarizada para formar o dia mas apagava-se lentamente à noite.

A caravana seguiu rapidamente e cercou um conjunto num bairro pobre, a pouca distância da muralha sul. Neblina tivera tempo de contar a sua aventura.

— Nesse caso — observou Madeira, que, aflito com seus problemas, não interrompera até o fim — essa mulher dispõe até de feras a seu serviço.

— Espero que não sejam mortas — respondeu Neblina secamente. — São animais inocentes.

— Espere aí, menina. Não entendi como você espantou os bichos — objetou Barracuda.

— Pode-se usar autoridade moral sobre animais ferozes. Dá certo com cachorros...

Robson opinou: — Tem que haver muito sangue frio. Mas esses leopardos deviam ser domesticados... devem estar acostumados ao comando da Sybilla. O seu comando, naturalmente, foi semelhante.

Neblina sabia que não era bem isso, mas não discordou: questão de modéstia. Outro assunto a preocupava:

— E o governo da Rumênia? Já deu as informações que nós pedimos?

Madeira demonstrou irritação na resposta:

— Sei que chegaram informações confidenciais que estão à espera que o Jujuba volte da Bahia. E não as passam a nós, da polícia! Pode isso? Ah, sim, parece que vêm alguns agentes rumenos colaborar conosco.

— Isso é bom.

Chegaram em frente a um alto e complicado prédio de Vale Seco. Madeira, certo de que sua filha estava ali, comandou a operação de cerco. Era um quarteirão pequeno, mas que se ligava por pontes aéreas a outros blocos. Madeira ligou o rastreador, largo como um violão, e examinou os sinais eletrônicos e os números que apareciam na tela. Numa diagonal indicada por uma linha verde na tela tridimensional, a distancia até Sonia seria de dezoito metros. Só que a linha estava enviesada para a esquerda. Madeira moveu-se o bastante para endireitá-la, ajustou um visor no aparelho e determinou a janela do apartamento onde sua filha se encontrava. No quinto andar.

Afastando-se do aparato policial que já criava o maior tumulto, Neblina aproximou-se de um beco por onde subiam encanamentos e estudou a situação. Esperava passar despercebida, mas escutou passos e voltando-se, avistou Lustosa.

— Então! Quer dizer que você domina leopardos! Essa é a sua nova mentira!

— Não tenho tempo a perder com o senhor, Inspetor Lustosa.

Assim dizendo ela puxou uma curiosa máquina de dentro de sua capa: um aparelho comprido como uma pequena bengala, mas muito mais fino; pressionando um botão ela lançou um fio-arpão nas alturas; o mesmo se perdeu numa platibanda lá por cima e a mascarada subiu após, levada pelo impulso. Por um instante paralisado pelo espanto, Lustosa logo se recuperou e sacou uma arma primitiva:

— Ah, traidora! Vai se juntar à quadrilha! Eu sabia!

Quando se equilibrou na cornija, Ana olhou para baixo no momento em que Lustosa disparou um dardo soporífero que atingiu o ombro esquerdo da garota, rasgando o traje negro e fazendo escorrer o sangue.

Espantada, Neblina apressou-se em sair do campo visual do atirador. Assim, não viu o que aconteceu em seguida lá por baixo.

Tendo visto o ocorrido, Robson alcançou Lustosa e gritou:

— Meu Deus! O que você está fazendo?

— Tentando pegar essa criminosa, é claro! Não vê que ela vai se juntar aos seqüestradores? Não vê que ela tentou afastar a polícia para a Vila de Gnaisse enquanto levavam a sua prima?

Robson deu um soco na boca de Lustosa, jogando-o ao chão.

— Imbecil! Idiota! Louco! De que lado você está? Se ela cair no sono lá em cima, pode despencar e morrer! E se isso acontecer eu mato você!

Cuspindo sangue, Lustosa levantou-se com esforço, mas furioso:

— Entendi a sua. Apaixonou-se pela mascarada. Já não enxerga mais nada.

Quando os dois iam se atracar, a “turma do deixa-disso” apareceu. Informado confusamente do que houvera, Madeira olhou para cima, não viu sinal de Neblina e fuzilou o olhar para Lustosa:

— Não admito ações individuais que prejudiquem a ação em conjunto. Vamos cumprir o que viemos fazer e depois conversaremos.

— Mas...

— Nem mais uma palavra sobre esse assunto, Lustosa, ou mando lhe prender por insubordinação!

Enquanto isso, a mascarada sentou-se num pequeno terraço baixo, espantando uns pirus-pirus que nidificavam por lá. Sentindo-se tonta, abriu um compartimento de seu cinturão, retirou uma cápsula magenta, quebrou-a com os dentes e engoliu o conteúdo. Depois pegou uma cápsula grená e esmagou-a sobre o ferimento. Ficou então imóvel, aguardando um pouco o efeito.

Seu pensamento voou para o trem submarino, que talvez estivesse trazendo reforços para a Ninja.

Neblina ergueu-se.

Em suas pesquisas, à procura de um método, encontrara velhas revistas e filmes que falavam de um justiceiro mascarado, um cruzado de capa, conhecido como Batman – criado por certo Bob Kane, nos Estados Unidos, em 1939. Batman era um personagem interessante, embora suas aventuras fossem com frequência ridículas e absurdas. Inventara uma espécie de arpão, ou “bat-corda” como chamavam, que lhe facultava mover-se nos ares, de prédio a prédio. E usava o “cinturão de utilidades”, que era o que o nome dizia. Ideias boas mereciam ser aproveitadas. As histórias de Batman não explicavam como sua corda-arpão se prendia nas cornijas, platibandas e terraços, mas a tecnologia

moderna podia cuidar dessa parte com a coesão molecular. Neblina tratou de se movimentar para cima, até o sexto andar, e enquanto se aproximava da cena do crime podia ouvir o alto-falante de Madeira, dando ultimato aos Bandidos Negros:

— Vocês têm de se render! O prédio está cercado! E ai de vocês se machucarem a minha filha!

“Ora vejam, afinal o Inspetor Madeira é humano!”

Agarrando-se numa gárgula de pedra-sabão, Neblina fitou a paisagem lá embaixo. Não queria demorar, pois até poderia ser alvejada por algum morador assustado com a sua presença. Do andar inferior partiu uma série de rajadas contra a polícia. Os policiais usavam escudos protetores, mas aquela atitude dos seqüestradores mostrou a Neblina a gravidade da situação.

Eles não pretendiam se render.

Na varanda do apartamento visado um sujeito de uniforme negro mirava a rua, oculto entre jarrões de magnólias. Onde estaria o outro?

Neblina firmou a bat-corda, agarrou-se nela e desceu como um raio, caindo em pé, diante do inimigo.

Os Bandidos Negros estavam suficientemente alertados sobre a capa estelar de Neblina. Sabiam que não deviam disparar energia sobre ela. Contudo o susto, o pânico, desorganizam tais premeditações: o bandido voltou-se e disparou sobre a mascarada.

Neblina cobriu-se com a capa.

À queima-roupa o efeito foi devastador, espantoso. A reverberação tingiu a varanda de violeta, de púrpura, de rubro, de amarelo. Neblina firmou-se no chão e por uma fração de segundo, como numa radiografia, seu esqueleto tornou-se visível. Quando tudo acabou a jovem estava de pé, incólume, e um cadáver carbonizado e retorcido jazia a seus pés.

Ela não perdeu tempo em lamentá-lo: correu para a vidraça e estilhaçou-a, penetrando no jardim de inverno. Viu-se diante de outro Bandido Negro, um sujeito magro e musculoso, assustado, segurando uma garota manietada e amordaçada. Ele encostou a arma na testa da prisioneira e ameaçou:

— Não se aproxime! Senão eu acabo com ela!

Neblina começou a falar de maneira lenta e patética, num tom que não escondia uma incrível ironia:

— Você é tão covarde assim... a ponto de se esconder atrás de uma refém indefesa... imobilizada... para não ter de enfrentar uma mulher que o desafia? Vamos... solte a moça... guarde essa arma... e me enfrente como um homem! Se é que você é homem!

Com os olhos esgazeados, o meliante volveu o olhar para a esquerda e a direita, sem propriamente um objetivo no gesto e, com certo desespero, fitou sua refém. Numa súbita decisão, lançou brutalmente a jovem ao chão.

Sonia caiu contundindo-se no chão duro, gemendo sob a mordaça. O bandido guardou então a arma no coldre e com um grito de guerra pulou sobre Neblina. Esta aparou os primeiros golpes e abriu caminho para acertar uma cutelada na testa de seu adversário. O outro, furioso, avançou e forçou o recuo de Neblina, que se aproximou, de costas, da parede. O Bandido Negro pulou, atravessou a barreira de Neblina e atingiu-a na frente do queixo com um “uppercut”. Recuando, Ana aparou a si própria, na parede, com a omoplata esquerda, pulou agilmente para o lado e, em manobra de envolvimento, viu-se quase às costas do sujeito, a quem atingiu com um golpe de mão aberta na nuca. Abaixou-se então, escapando do braço atirado contra si, ao qual agarrou, aproveitando o impulso do oponente.

O sequestrador voou e caiu estatelado. Nesse momento ele puxou a arma porém Neblina chutou-a certeiramente, fazendo-a voar longe, indo espatifar um jarro de porcelana tailandesa.

O bandido tentou se erguer e Neblina acertou-o com o “yppom” — o golpe de misericórdia — encerrando a luta.

A jovem heroína respirou fundo e retirou, de um bolso interno de sua grossa capa, um par de algemas de superalumínio. Abaixou-se e rapidamente algemou o bandido. Depois tratou de socorrer Sonia, que se recostara a uma poltrona.

Com destreza Neblina libertou as mãos de Sonia e ajudou-a a remover o lenço da boca. Sonia, uma jovem que em antiga gíria chamariam “um avião” — e agora, por falta de aviões, uma locomotiva — e que contrastava com a figura grave e seca do pai — abraçou-se chorando à sua salvadora.

— Neblina, você é maravilhosa! Nunca vi ninguém lutar tão bem quanto você! Nem ninguém com tanta coragem! Se você soubesse o medo que senti...

— Obrigada, está tudo bem agora. Seu pai está lá embaixo.

— Oh, mas você está ferida! Seu ombro...

— Isso não importa. Vamos lá no peitoril avisar que está tudo bem.

Elas se ergueram. No chão, o preso começava a gemer.

— Papai fala muito mal de você, Neblina. Mas de agora em diante ele passará a falar bem... ou irá se haver comigo. Você agora é da família.

Neblina sorriu.

— Talvez seu pai tenha a sua dose de razão... de certa forma eu sou uma intrusa...

— Nunca! Você é a pessoa certa no lugar certo! Depois do que eu vi e ouvi... puxa, seu discurso ao bandido...

— Não olhe, Sonia. Esse cadáver não está bonito.

 

 

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A demonstração de poder de Neblina irá acirrar a cólera da Ninja com a morte de mais um cúmplice e a captura de outro. E a façanha da vigilante mascarada muda radicalmente seu relacionamento com a polícia, até então muito difícil. Agora, o Inspetor Madeira é seu aliado, porém Neblina descobrirá no próximo episódio que tem um inimigo na imprensa.

 

 

Miguel Carqueija
Enviado por Miguel Carqueija em 27/07/2023
Reeditado em 27/07/2023
Código do texto: T7847461
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