A Saga de Godofredo Parte III – Baixa da Guarda Imperial

15.05.24

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Seu avô acordou lépido e feliz, deixando Godofredo animado, dizendo-lhe:

-Acordou como um passarinho, Herr Paul?

-Sim Gottfried! Deixe o Herr no passado, pois hoje pedirei a minha baixa da Guarda Imperial do Kaiser e iremos direto para Hamburgo nos inscrever em um transatlântico inglês, que colocou anuncio no jornal pedindo mão de obra. O mundo nos aguarda!

-Mas você, Paul, é militar graduado e guarda imperial no castelo do Kaiser, será fácil ser aceito. Mas eu, simplesmente um valete?

-Todo navio precisa de pessoas que saibam servir aos passageiros, e você por dois anos foi meu valete, atendendo-me com muita presteza, gentileza e atenção. Pedirei ao Comandante da Guarda, que lhe dê uma carta de apresentação. Agora me ajude a colocar esta droga de espartilho, que espero seja pela última vez.

Godofredo ajudou-o a vestir-se. Ele se aprumou frente ao espelho, deu uma piscadela e falou olhando-se firme no espelho:

-Adeus, serviço militar!

Bateu continência e os calcanhares e saiu em direção ao Comando da Guarda. Godofredo acompanhou-o atrás. Chegaram à entrada da antessala do Comandante, onde um administrativo o recebeu, perguntando qual o motivo da sua vinda. Ele respondeu:

- Cabo Sargento Paul Scholz da Guarda Imperial apresentando-se. Gostaria de falar com o Comandante, vim solicitar minha baixa do Regimento! - falando perfilado de forma firme e direta.

O militar olhou-o curioso, se levantou e foi à sala do capitão, deixando a porta aberta. Escutou a fala do subalterno e ouviu a exclamação do capitão:

-Como? Dar baixa, Herr Scholz? – vindo à porta recebê-lo.

Ele bateu continência ao ver o Comandante, que o acompanhou até a poltrona para que sentasse, quebrando o protocolo militar. E atônito, perguntou-lhe:

-O que aconteceu, Herr Scholz? Você é o preferido do Kaiser, o melhor atirador do Regimento, e quer sair? Algum problema pessoal? O Kaiser não vai gostar nada da sua saída.

-Herr Comandante, eu não tenho futuro no exército, pois para seguir carreira, teria que ser nobre para me graduar acima na hierarquia militar. Então, estou servindo há dois anos ao Kaiser, e chegou a hora de seguir minha vida. Redigi minha carta de pedido de baixa do Regimento e lhe entrego em mãos – retirando-a do bolso da túnica e passando-a ao seu superior.

O comandante leu a carta e respondeu-lhe:

-Vou ter que comunicar ao Kaiser, pois é uma situação delicada pela sua relação e importância para ele. Tenho audiência agora pela manhã e o informarei da sua solicitação. Por enquanto, você deve seguir com suas obrigações militares. O chamarei ao voltar.

Seu avô se levantou e bateu continência. Girou sobre seus calcanhares e se dirigiu à saída. Godofredo o aguardava ansioso, vendo que ele não estava mais tão eufórico como antes. Ficou calado. Ele lhe dirigiu a palavra:

-O Comandante vai consultar o Kaiser, pela sua preferência comigo, mas acredito que o meu argumento vá prevalecer, pois redigi uma carta explicando os motivos que entreguei a ele. Por enquanto, devo seguir com minhas obrigações militares. Vou ver minha escala, e peço que vá aos meus aposentos e prepare minha mala-baú, deixando as fardas dependuradas no armário. Depois, vá ao Paiol e pegue minha carabina, pois me foi presenteada pelo Kaiser. Vai dar tudo certo, meu amigo!

Godofredo foi fazer o que o avô pediu. Estava excitado, pois iria vivenciar as viagens que fez por vários lugares do mundo em transatlântico inglês, como disse sua mãe. Ao mesmo tempo, lembrou dos Krumin Lep, seus antepassados maternos, que viajavam para o Brasil em um navio.

Imediatamente apareceu no convés do navio alemão de imigrantes, o mesmo que ele presenciou o embarque dos parentes em Hamburgo. O vento era forte fazendo o barco balançar fortemente. Não havia pessoas no local. Foi ao interior da nau, entrando pelos corredores. Era um navio misto, carga e passageiros. Estes, se aglomeravam por todo ele, com suas sacas, baús, malas e tralhas. Poucas cabines possuía a embarcação.

Procurou-os por todo o barco, sem sucesso. Foi à ponte de comando perguntar ao Capitão sobre eles. Subiu as escadas e entrou na cabine. O capitão olhou-o com curiosidade, pois não era comum um civil aparecer por lá.

-O que procura, Herr? - perguntou-lhe o Comandante do barco.

-Procuro a família Krumin Lep, embarcados em Hamburgo. Sou parente e soube que estão neste barco, mas não os encontrei. Como faço para saber deles, Herr Comandante?

-Vá ao Encarregado Administrativo do navio, no segundo convés, que tem a lista dos passageiros, Herr.

-Obrigado Herr Capitão! Estamos em que trecho da viagem?

- Cruzando o Atlântico em direção a Nova Iorque. Devemos aportar lá em três dias.

Godofredo agradeceu e foi ao responsável pelo controle dos passageiros, que lhe informou que os Krumin Lep estavam em uma das poucas cabines existentes, também no segundo deck, de número 14. E lá foi, e ao chegar, encontrou com seu bisavô Jean saindo dela. Dando de encontro com seu bisneto, o reconheceu:

-Ah, mas não é o Herr que estava em Hamburgo no nosso embarque e que nos falou do clima no Brasil? Mas que coincidência estar aqui no mesmo barco. Em que posso ajudá-lo, Herr?

Godofredo ficou sem palavras ante o inusitado do encontro. Depois de alguns segundos de hesitação, respondeu ao Barão:

- Mas que coincidência mesmo Barão, encontrá-lo com sua família no mesmo navio. Estou indo para os Estados Unidos, tenho parentes lá. Segue para o Brasil, não é mesmo Herr Barão?

-Sim, estamos indo sim.

Neste instante, saiu da cabine, curiosa com a conversa a sua avó, Alide, interessada no assunto, surpresa em encontrar com Godofredo. Seu pai disse-lhe:

-Minha filha, que coincidência encontrar com nosso amigo que nos alertou sobre o clima no Brasil em Hamburgo, e parente de Herr Gottfried que salvou nossos pais da Revolução Francesa.

Sua avó o encarou com curiosidade. Godofredo ficou totalmente indefeso e estático, mas ao mesmo tempo, pensou que situação interessante, sua avó materna a caminho do Brasil, e ele ir com o avô rodar o mundo de navio, sabendo que eles se encontrariam ao longo desta epopeia nos Estados Unidos, alguns anos depois e que talvez presenciaria tal fato. Então escutou a vozinha esganiçada de Cons. na sua cabeça, dizendo-lhe:

– Volte para Sanssouci, seu avô já tem a definição e está indo para os seus aposentos.

Ouvindo a mensagem de Cons., simulou uma dor de cabeça, pedindo-lhes licença , dizendo que iria a sua cabine cuidar da inesperada dor. Saiu em direção ao convés, e ao fechar a porta, se escondeu em um canto e sumiu, voltando instantaneamente para o dormitório do avô. Disfarçadamente, lustrava as botas do avô quando ele chegou.

Entrou sorridente e alegre como acordara – um passarinho, e disse a Godofredo:

-Gottfried, estamos livres! O Kaiser me liberou e me presentou com uma pistola “Luger Parabellum” com cabo de madrepérolas pelos meus serviços – mostrando a caixa da arma. Aqui, sua carta de apresentação dada pelo Comandante e assinada pelo Kaiser. Amanhã, vamos à Hamburgo. Prepare-se!

Obra de ficção e qualquer semelhança é mera coincidência

Fernando Ceravolo
Enviado por Fernando Ceravolo em 14/05/2024
Reeditado em 14/05/2024
Código do texto: T8063283
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