PLENA-MENTE

Acho a felicidade tão vazia... Meu modo é pela dor, sempre. Não me sinto plena quando estou feliz, e isso pode até parecer masoquismo, ou burrice, mas é que essa maldita utopia cultivada pelos otimistas não me completa, não traz o que deveria trazer - que pra mim é a percepção maior do que estamos fazendo nessa porra de vida. Ok, é evidente que não vou passar o resto de meus dias sofrendo, mas peraí! achar que tudo isso aqui é um mar de rosas é demais pra minha cabeça de louca. E além do mais, acho um porre gente que vive se esquivando de sentir.

Minha dor extravaza o limite do meu corpo, não tem forma, não é enlatada. Ela simplesmente é dor, e dói onde tem que doer. Sinto muitas dores. Muitas. Dor de desgosto, que é quando vejo pessoas enganando a si próprias. Não, fulano, o caminho não é por aí, se auto-enganar não faz chegar antes... Dor de saudade, que é quando eu torço o coração pra ver se pinga mais alguma gota da pessoa, e nada do pingo cair - de repente o coração ficou seco. Dor na alma, que é quando cai a ficha de que fodeu de vez e não se tem mais nada a fazer. Dor de alegria - e essa é uma das minhas preferidas - que é quando a alegria é tanta tanta que em minutos se desfaz e vira uma melancolia só. É como uma droga de efeito instântaneo, mas que guarda um alerta: seu consumo não deve ser demasiado pois o usuário corre o risco de se sentir alegre para o resto da vida - e um viciado em alegres dores teme mais que a própria morte a perigosa possibilidade de sentir-se eternamente alegre. Tem até dor no bolso, que é quando se paga por alguma coisa mais do que ela realmente vale. Tem a dor de sentir-se preterido. A dor de não sentir nada. A dor de saber-se tudo. Dor de só desejar uma coisa: a morte. Dor de, de repente, querer tudo e descobrir-se na mesma hora impotente...

Sempre que posso escolho o caminho mais difícil. Não é tortura, é só a minha natureza. E não aceito indicações de caminhos cuidadosos para a felicidade: com ela eu esbarro pelos meus caminhos doloridos. Também existe sorriso na dor.

Mas essa é só a minha opinião. Em plena madrugada, sem dor.

Sampaulo, 1° de Setembro Dois Mil e Oito.