Desafortunadamente, momentos antes da publicação do meu primeiro texto sobre o assunto (no Jornal de Debates), a menina Eloá já havia sido fatalmente ferida.
Desde o final do seqüestro, discute-se muito sobre a ação da polícia. Mas a verdade é que é muito difícil tomar uma decisão quando o agente de um crime é um jovem com retrospecto que o classificava como “trabalhador” e “sem antecedentes criminais”.
O problema é que o Lindemberg, embora sem antecendentes criminais, sempre foi um criminoso em potencial: foi isso que ele revelou ao invadir o apartamento da ex-namorada, durante as negociações com os policiais e em seu gesto final de alvejar - com intenção de matar - as duas reféns. Esse seqüestrador assassino, ao longo dos cinco dias que durou o seqüestro, foi revelando sua verdadeira personalidade: mostrou que é um indivíduo inconfidente, sem palavra, portanto, em quem ninguém - homem ou mulher - pode confiar; mostrou que ele tem um egoísmo desenvolvido ao extremo, de modo que o(s) interesse(s) do(s) outro(s) deixam de existir, de importar para ele. E, no desfecho do seqüestro, deixou patente que se trata de um indivíduo vingativo, frio e calculista, a ponto de exigir que sua integridade física fosse preservada - antes de atirar, a queima roupa, naquela que tantas vezes disse que... “amava”.
Esse seqüestrador assassino, ao longo daqueles cinco dias nefastos, elevou o seu egoísmo ao máximo - e só o seu mundo, os seus sonhos de prepotência, de domínio sobre o destino dos outros passaram a contar. Aqueles cinco dias de seqüestro foi tempo mais do que suficiente para que qualquer trabalhador honesto, para que qualquer pessoa que não tivesse instintos criminosos latentes, dissimulados, refletisse e desistisse de seu intento inicial. Mas o seqüestrador assassino se sentiu vitorioso ao impor através da violência, do desrespeito à vontade alheia, sua presença à ex-namorada que não queria mais vê-lo ou falar-lhe; se sentiu poderoso ao tomar como reféns - não só Eloá e sua melhor amiga - mas os parentes destas, seus vizinhos, os agentes da lei...
O que uma pessoa faz quando tem algum tipo de poder em suas mãos revela o que ela realmente é: um bom cidadão ou um facínora. Lindemberg Fernandes Alves - o seqüestrador assassino - mostrou, de modo irrefutável, que é um facínora, um indivíduo perverso, vingativo, cruel e implacável.
Não se deve pensar que ele foi movido por amor, pois esse seqüestrador assassino é incapaz de amar: ele foi movido pelo egoísmo, pelo desejo de posse - pois sempre viu Eloá não como seu amor, mas como sua propriedade: para o seqüestrador assassino, Eloá não era um ser humano, mas algo sem interesses ou desejos pessoais e que devia ter seu direito à vida nas mãos dele - que jamais quis sua felicidade.
Durante todo o período em que esteve a exercer seu jogo de poder e posse sobre a menina Eloá, o seqüestrador assassino sempre criou desentendimentos, brigas, rompimentos e impôs reatamentos. Através da conquista, da posse, do domínio sobre aquela que era considerada a menina mais bonita da escola, ele procurou agigantar-se perante amigos e conhecidos como alguém que possuía um poder de sedução, de fascínio sobre a mais bela jovem da localidade - e que deveria ser o sonho de muitos que a conheciam. Para esse seqüestrador assassino, a menina Eloá era apenas um troféu, que ele adquirira e sobre o qual ele tinha total poder de decisão se continuava - ou não - a existir. Ele decidiu que ela deveria deixar de existir.
Desgraçadamente, mais uma vez, nós - a sociedade brasileira - não conseguimos impedir que um facínora impusse a sua vontade perversa sobre alguém inocente e indefeso. Isso é realmente consternador. Mais ainda quando sabemos que esse tipo de indivíduo jamais deixará de ter esse tipo de conduta com qualquer outra mulher com que ele se envolver, mas que as nossas leis - que muito mais conferem direitos do que deveres e, com isso, propicia a impunidade - farão com que o seqüestrador assassino saia muito antes de cumprir 30 anos de prisão. Isso é demasiadamente lamentável, pois patenteia a impotência da sociedade em combater a impunidade - pois se tem dado muito mais valor aos direitos dos facínoras - do que à segurança e bem-estar dos honestos, dos justos, dos indefesos.
É consternador, é vergonhoso - é revoltante.
Mas, de todos esses fatos extremamente lamentáveis, temos de ressaltar como exemplo de solidariedade e verdadeira amizade a conduta da jovem Nayara Silva. Pressentindo que sua melhor amiga corria sério risco de morrer, a menina Nayara arriscou a própria vida para tentar mudar o curso da trágica história e, de algum modo, impedir o desfecho trágico que todos assistimos através da mídia. Nayara é um ser humano digno do nome - uma jóia rara na selva de desumanidade, insensibilidade e indiferença para com o sofrimento alheio. Enquanto todos se protegiam, ela foi ao encontro de um perigo real, na tentativa de oferecer proteção àquela por quem tem amizade. É uma amizade que certamente se eternizou. Enquanto o homem adulto só mostrou egoísmo, covardia, premeditação, espírito vingativo, inconfidência, frieza e crueldade, a menina Nayara foi exemplo de altruísmo, coragem, de espírito protetivo, de amizade sincera, de caráter íntegro - de verdadeiro amor.
Nayara, quando você souber do desaparecimento de sua amiga Eloá, muito provavelmente se sentirá impotente por não conseguir impedi-lo. Mas, tenha certeza de que pelo menos o que estava ao seu alcance você fez, você não se omitiu, não se escondeu, e se expôs a um perigo real para pelo menos tentar reverter um quadro que dificilmente terminaria de modo diferente, porque tratava-se de um assassino que apenas estava à espera de um momento oportuno para perpetrar seu crime. Como se costuma dizer - a ocasião faz o ladrão - o que se aplica a todos os demais criminosos em potencial.
Nayara, que você jamais deixe-se mudar, desvirtuar e se transformar em mais um zumbi que vagueia insensivelmente pela face da Terra. E muito agradecida por me fazer saber que ainda existe seres humanos como você.
A você, Nayara, todo o meu respeito e consideração!