Reflexos da alma...

No caminho folhas secas, nos olhos: almas secas. Um garoto sorria e uma mulher levava sacolas, muitas, cheias, e não havia um homem sequer que se oferecesse para levar, uma senhora de uniforme varria a rua, três homens conversavam animadamente, era a cidade... Sentada na praça central, entre transeuntes focados em seus destinos, iam apressados. Jovens se deixavam por ali, na condição de rebeldes que gritavam, com roupas e acessórios, algo de desviante: puro teatro. Uma musica ao fundo, os hippies vendendo e fazendo artesanatos, um pedinte, um tristonho, um sério, a normalidade de ser único e incomparável em um mundo onde todos são invisíveis.

Sentada com o livro na mão, estava pensando no que dizia nas paginas brancas, impressas com a tecnologia atual, mas feitas, em sua gênese, por meios mais arcaicos, por mãos que hoje jaziam em ossos ou talvez nem isso, “ecos de antigas palavras”, sabedoria que ressoa, gera sensações, emoções, move entranhas, angustia, causa um além...

O vento nos cabelos, o momento de fuga, a vida passando, o relógio correndo, o desejo de não se sentir sozinha em um lugar tão cheio de pessoas, era sórdido, mórbido, trágico, a condenação: obrigados a viverem perto, sufocados na proximidade e há anos luz de distancia subjetiva, era a distancia simbólica, algo do real interno, a construção do que somos estava abalada, pois o “nós” era apenas a menção longínqua de uma realidade, que não cabia, era um grande número de “eus” independentes que iam se arrastando com suas carcaças pesadas de auto-suficiência ilusória....

A agonia se misturava com a poesia, tinha vontade de dançar na chuva, chorar, tinha vontade de gritar algo sem sentido, surtar para variar, reelaborar suas construções mentais, enlouquecer, ou conseguir ver de outro ângulo, pelo prazer de viver outra vida... Angustia doentia ou mero momento de crise existencial: isso era o que menos importava, estava se sentindo viva, e isso importava, mesmo que não fosse linda, ou super inteligente, mas estava ali, agora, vendo um instante do espetáculo da vida, com sua falta de nexo, cadeias de organização imaginária, uma alienação conjunta, uma confortável mentira: a incerteza de existir na falta de sentido, com afetos sem afagos, só fatos que afogam em nuvens de fumaça, ou na tragada profunda: ópio. Altas doses de álcool sorvidos em um segundo, na tentativa de fugir de si mesmo, ou de esquecer do que se estampa em cada milímetro do corpo, da alma, inescapável...

E nos últimos instantes da crise de realidade, um sorriso de canto de lábios: espera a eternidade e respostas: do outro lado, ou simplesmente antecipar? (Achar o vácuo?)

T Sophie
Enviado por T Sophie em 14/02/2009
Reeditado em 15/02/2009
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