Reflexões de um eumesmista

Esse texto se destina à tarefa antiparadoxal, e ainda assim absurda, de propugnar a condição inescapável do eumesmismo, ou seja, a de sermos nós mesmos.

À primeira vista, tal intento pode parecer completamente despropositado, dada a constatação da impossibilidade de sermos qualquer outra coisa que não nós mesmos, no entanto, um breve olhar ao redor nos revela uma espécie de compulsão à camuflagem coletiva, ao modo dos gnus. Observando esses ungulados, notamos que o de trás segue o da frente onde quer que vá, acelera quando o anterior o faz, reduz sua velocidade e até pára a exemplo do precedente; aglutinam-se em manadas imensas compostas por inúmeras bestas similares na pelagem, na cor, nos modos e na mesma estupidez que os incapacita a qualquer ação diferente da imitação do antecessor, que por sua vez copia o que lhe precede na mais imensa demonstração grupal de falta de originalidade.

Não consigo encontrar nenhuma justificativa para tal, no entanto, aparentemente os adolescentes costumam ser tomados por uma espécie de adoração a tais animais que os torna ávidos pela diluição de suas individualidades e os leva a almejar as mesmas roupas, locais, gestos, falas... a mesma e única personalidade paupérrima que os compele a copiar uns aos outros. É certo que com o passar dos anos, com a maturidade, muitas pessoas acabam por se livrar dessa estranha personalidade coletiva que os guia cegamente a lugar nenhum, recuperando assim sua individualidade, tornando-se, realmente, uma pessoa individual, com suas próprias idéias, desígnios e vontades, no entanto, uma parcela considerável das gentes parece permanecer imersa nesse estado grupal por toda a vida, vivendo uma mera imitação, uma cópia, um simulacro vazio e insípido, despojado de qualquer emoção individual, de toda originalidade, sem qualquer inventividade, como uma novela repetida até as náuseas, copiada em cada cena, em cada diálogo.

Paradoxalmente, são indivíduos os que vivem essa vida espectral e alheia; supostamente tentam viver suas vidas, mas todo o seu desígnio revela apenas uma ânsia por abandonar sua própria vida e viver a do vizinho, copiando-o, tentando inutilmente ser o outro, que também é, por sua vez, mera imitação.

Dadas todas essas constatações, proponho apenas o óbvio e inescapável: sermos nós mesmos. Sejamos sempre nós mesmos e de forma consciente. Para isso basta apenas não tentarmos diluir nossa própria alma no emaranhado amorfo de uma coletividade desbotada pelo desejo de não existência implícito na tentativa de ser o que não se é.

Reine o eumesmismo generalizadamente!