A filosofia e o risco

"A palavra crítica deriva do grego 'krino', que significa julgar e cujo significado etimológico vem da atividade dos agricultores, ao separar os grãos dos resíduos, apartando, entre outras coisas, a palha do trigo, o alimento do desperdício. A tarefa da filosofia está tradicionalmente ligada a este sentido etimológico da palavra 'crítica'. (...).

O filósofo precisa de coragem para desenvolver sua tarefa crítica. Seu questionamento tolera o risco de alterar a apazível estabilidade das crenças predominantes num campo filosófico, numa cultura ou numa sociedade. Esta coragem tem rasgos metafísicos e gnosiológicos muito ecentuados, já que o questionamento do conhecimento abre um caminho de imprevisíveis conseqüências para nosso modo de ser 'no' e conhecer 'o' mundo. Também tem um caráter ético, ao assumir o desconforto e a responsabilidade derivados da não-aceitação despreocupada do conhecimento. Além disso, implica, também, um risco e um perigo políticos. A crítica, quando se torna profunda e radical, incomoda e provoca, já que, diante da ordem, é subversiva. Por isso, a crítica pressupõe coragem e persistência diante do risco. O caso de Sócrates é, mais uma vez, paradigmático. Ao questionar as bases das crenças e práticas estabelecidas, o crítico as enfraquece, mostra seu caráter contingente e eventual. Torna-se, assim, perigoso para a ordem dominante" (CERLETTI, A. A. A filosofia no ensino médio. In: CERLETTI, A. A. & KOHAN, W. O. A filosofia no ensino médio: caminhos para pensar seu sentido. Trad. N. G. Azevedo. Brasília: Editora da UnB, 1999, p. 81 e 83).

"O requisito fundamental da atitude crítica é a coragem; sua maior inimiga é a covardia, mesmo quando adquire a forma moderada da preguiça intelectual. O caminho mais fácil é sempre aceitar o que é conhecido. Não apenas economiza esforço, como também coloca a responsabilidade em outrem" (DEWEY, J. Construction and criticism. In: BOYDSTON, J. A. (Ed). The later works of John Dewy. Carbondale: Southern Illinois University Press, 1985, v. 5, p. 134).