Da Incompreensão das interpretações

O maior perigo que ronda as palavras não é o sentido que dizem ou deixam de dizer...Toda palavra tem limites muito aquém do que intencionamos comunicar.As palavras são superfícies turvas na claridade dos sentimentos que transbordam as possibilidades de serem transmitidos...

Além desse limite intrínseco do vocábulo de ser sempre pouco para expressar a imensidão de nosso pensamento, cada pessoa atribui às palavras significações pessoais advindas de suas experiencias particulares, o que contribui muito mais para só aumentar o abismo comunicativo.

Tomemos a palavra “ casa” como exemplo. Significa literalmente a construção física edificada com paredes e telhado onde pessoas se abrigam e fazem seu ugar no mundo.Entretanto, se perguntamos a diferentes pessoas o que “casa” significa para elas, as mais variadas respostas surgirão... Casa pode implicar subjetivamente um lugar de descanso, o espaço familiar, o carinho e afeto, ou brigas e discussões , lugar de tranquilidade, lugar de receios e medos , solidão, abandono, conforto, ou lugar onde tudo falta... Enfim, cada pessoa indagada sobre o que o termo lhe significa responderá de forma diferente , dependendo das experiencias pessoais que viveu neste ambiente....

Deste modo, a comunicação é um ideal inatingível ... entre interlocutores haverá sempre a barreira dupla da significação... por um lado, a ideia desejada pelo falante e que a palavra não é capaz de comportar; por outro lado, a barreira da interpretação pessoal do receptor , que até mesmo inconscientemente associará sua interpretações pessoais ao que é dito, compreendo ao seu modo aquela mensagem inicial , intenção que vai assim se tornando ,palavra a palavra, cada vez mais estranha ...

Faço muito uso, por exemplo, de uma frase de Shakespeare que,sei, gera interpretações completamente opostas : “ Os defeitos dos homens se escrevem no bronze, as suas virtudes, em água ..”

Como é possível interpretar esses dizeres?

Bem a maioria das pessoas que já indaguei dizem que interpretam como se os defeitos ficassem marcados por muito tempo, como uma escultura forte...marcam o perfil de uma pessoa e ali permanecem com rigidez e rigor, enquanto que as virtudes escritas com água se desmancham facilmente, ficam perdidas, sem consistencia....

Bem... para mim a interpretação é outra... escrever defeitos em bronze é trancá-los dentro uma substancia grossa na qual ficam contidos, guardados,resumidos... Não vão além daquele espaço em que estão detidos ... Por outro lado, escrever virtudes em água para mim é dar às virtudes

a fluidez, o escorrer, que permite que elas se espalhem, atinjam mais áreas, sejam alongadas, sejam propagadas.... O bronze fecha, acaba... a água escoa, transmite, leva a diante...

Minha intenção é apenas ilustrar a maior de todas as feras que habitam o reino medonho das palavras: a incompreensão está sempre presente nelas , pois as interpretações se fazem sempre de formas diversas... incomunicáveis....

Solução? Talvez o diálogo... (se tudo não piorar)... ou a aceitação da penumbra das palavras...

Carmem Teresa Elias
Enviado por Carmem Teresa Elias em 23/04/2010
Reeditado em 23/04/2010
Código do texto: T2214485
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