Papel em branco

Tento encontrar as palavras para descrever a minha impossibilidade de reagir diante das situações que a vida apresenta. Cobranças de todos os lados. Está difícil reorganizar as idéias e decidir o que quero realmente. Fecho os olhos e milhares de pensamentos vêm à minha mente. E tudo pode ser resumido numa única palavra: vazio. Vivendo de modo mecânico, meu corpo já não tem a mesma sensibilidade. O olhar, antes destemido e cheio de ternura, não se fixa por muito tempo no mesmo lugar.

O encantamento deu lugar às preocupações, enquanto a coragem e a criatividade cederam seus espaços à acomodação e à insegurança. Tudo representa perigo, todos são estranhos. As coisas perderam sua finalidade, tornaram-se descartáveis. As atitudes estão impregnadas de um sentimento de inutilidade. E o que é o sentimento afinal? Acho que perdi essa noção há um certo tempo. Já não me comovo como antes. O coração está se deixando dominar pela indiferença e o espírito está cada vez mais ausente.

A poesia servia como uma anestesia, um alucinógeno de efeito contrário que me permitia enxergar o mundo de um modo novo, separando o sonho da realidade. Mais ainda, era o sangue que corria em minhas veias; era a lágrima não-contida, era o plano imaginário da realização; eram todas as imagens ao alcance dos olhos se transformando em versos. E onde estão esses versos? Dispersos em algum lugar entre a razão e a emoção, de onde não posso tirá-los. É como esmagar um mosquito entre as mãos: ele lhe tira o sangue e você lhe tira a vida...

Sentir o vento tocando no rosto, contemplar o amor, admirar o sorriso de uma criança ou me compadecer de suas lágrimas, tudo isso fazia com que eu me sentisse viva. Agora, abandono minhas esperanças num mundo idílico, que posso alcançar apenas através dos sonhos.

Pela lente da ilusão tudo é mais belo. Talvez seja hora de colocar os pés no chão e reavivar a luz da minha existência, que irradiava por todos os espaços, e que, tornando-se a luz de uma lágrima, brilha no escuro, solitária.

Escrito em 11/08/06

Joyce Amorim
Enviado por Joyce Amorim em 28/08/2006
Reeditado em 08/01/2008
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