Detrás Do Que Escondo
"Estou preso num discurso duplo do qual não posso sair.
De um lado, me digo: e se ela, por alguma disposição de sua
própria estrutura, precisasse do meu chamado?
Eu não ficaria, então, justificado de me abandonar à expressão
literal, ao dizer lírico de minha "paixão"? O excesso, a loucura,
não são eles minha verdade, minha força? E se essa verdade,
essa força, acabassem por impressionar? Mas, por outro lado,
me digo: os signos dessa paixão podem sufocá-la. Não seria então
preciso, precisamente porque a amo, esconder dela o quanto
a amo? Vejo-a duplamente: ora a vejo como o objeto, ora como
sujeito; hesito entre a tirania e a oblação. Envolvo a mim mesmo
numa chantagem; se a amo, sou obrigado a querer o seu bem;
mas com isso só posso me fazer mal. Armadilha: sou condenado
a ser ou santo ou monstro; santo não posso; monstro não quero;
então tergiverso: mostro um pouco minha paixão."