Detrás Do Que Escondo

"Estou preso num discurso duplo do qual não posso sair.

De um lado, me digo: e se ela, por alguma disposição de sua

própria estrutura, precisasse do meu chamado?

Eu não ficaria, então, justificado de me abandonar à expressão

literal, ao dizer lírico de minha "paixão"? O excesso, a loucura,

não são eles minha verdade, minha força? E se essa verdade,

essa força, acabassem por impressionar? Mas, por outro lado,

me digo: os signos dessa paixão podem sufocá-la. Não seria então

preciso, precisamente porque a amo, esconder dela o quanto

a amo? Vejo-a duplamente: ora a vejo como o objeto, ora como

sujeito; hesito entre a tirania e a oblação. Envolvo a mim mesmo

numa chantagem; se a amo, sou obrigado a querer o seu bem;

mas com isso só posso me fazer mal. Armadilha: sou condenado

a ser ou santo ou monstro; santo não posso; monstro não quero;

então tergiverso: mostro um pouco minha paixão."

ENIGMA
Enviado por ENIGMA em 10/07/2010
Reeditado em 02/05/2023
Código do texto: T2370460
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