Hoje alguém veio me dizer...

Hoje, alguém veio me dizer

Pra eu parar de amar

Pra eu parar de sonhar

Que coisas do coração são enganosas

Que caminhar nas nuvens é pisar em falso

É pisar em pedras de areia

Hoje, alguém quis me convencer

Que não é preciso escrever

Que não é preciso imaginar

Que não é preciso querer

Hoje, alguém quis me trazer à realidade

Que chorar de saudade é o mesmo que sofrer em vão

Vão dos buracos alma

Vão dos buracos dos queijo

Que povoam a lua dos insanos

Dos apaixonados

Dos poetas escrivãos

Quiseram me dizer que arriscar é perder

Que o que se tem a perder é mais do que tentar amar

Que o que se tem a arriscar é mais do que ficar olhando a vida passar

No comodismo do sofá de nossa sala

Nos seriados da TV a cabo

Vivendo e rindo a vida alheia

Chorando o final feliz de personagens protagonizando coisas aparentemente românticas demais pra você

Hoje quiseram me fazer crer que arriscar não é preciso

Que petiscar é pros fracos que não têm o que perder

Que a vida tem que ser ser seguida tal qual os protocolos das boas maneiras

Dos manuais de etiqueta

Que viajar pela Europa é coisa pra poucos

Como se a facilidade não fosse coisa pra quem planeja

Hoje quiseram me fazer crer que não posso sonhar com o que quero ser

Que devo sonhar coisas comum a todos

Que não posso querer viver em paz...

Numa casa, num bairro

Arborizado...

Com vizinhos que se cumprimentam

Com olás, boa tarde, como está?

Preciso mesmo cegar-me com a ganância?

Preciso mesmo morrer tentando viver?

Preciso mesmo viver pra comprar?

Não posso mais andar de patins?

Nadar na piscina do clube

Sorrir sem culpa pelos que choram?

Não posso mais sonhar com o amor que completa?

Com a vida sossegada nos embalos da rede no quintal?

Com o cachorro correndo atrás do meu filho

Fugindo da mangueira descontrolada pela força da água da rua

Hoje quiseram me fazer crer que arriscar não é preciso

Que temos mais dinheiro a perder

Do que sorrisos a ganhar!