Crimes
Tenho pensado muito a respeito do fato de que somos criados no crime. Quando falo de crimes não me refiro, necessariamente, aos que têm comovido a opinião pública, mas aos crimes privados, aqueles próprios da natureza do homem que nascem nele subjugados por uma coberta de conceitos vazios, e, por serem vazios, aos poucos vão sendo alimentados por uma educação rudimentar e insustentável. Eu, em especial, digo que fui criado entre feras que debatiam assuntos e diferenças banais por meio de um ódio visceral. O discurso era entrecortado por imprecações e desejos fatais. Nunca num século tão promissor à ciência e à técnica se viu tantos desvios. Talvez por isso mesmo, por se dar tanta atenção aos detalhes técnicos de nossa sociedade tecnocrata, não logramos mais a expectativa de um século do pensamento. Quando muito, poucos ainda comem das migalhas que nos foram deixadas pelo nosso passado. Mas estas migalhas, infelizmente, não preenchem o pensamento dos que têm muita fome. Somos nós, os que ainda querem pensar, um novo tipo de maltrapilho, mendigos à soleira de um mecanismo opressor, persuadidos para a morte sem ao menos nos cuspirem na cara.