Amor...

Durante a vida toda, escutei coisas positivas sobre o que é o amor. Diziam que as pessoas quando amam, flutuam ao invés de caminhar, enxergam estrelas em noites de neblina e todo o mundo muda de cor. O universo do amor é perfeito, cor-de-rosa e tem o aroma das manhãs de primavera. O ser amado ganha status de semideus e estará eternamente ao nosso dispor. Lembro-me daquele álbum de figurinhas que tinha um casal de bonequinhos pelados e cabeçudos sempre acompanhados por frases que começavam dizendo “Amar é...” e vinha algo bonitinho em seguida. As menininhas são instruídas a acreditar que o amor é lindo, perfeito e todas as que forem boazinhas terminarão suas vidinhas ao lado do seu príncipe encantado, como nas fábulas ocidentais distorcidas.

Porém, a fábula amorosa começa a se desmoronar quando surge o tal príncipe encantado montado num cavalo branco, todo imponente e com uma aura iluminada. As luzes da aura apagam-se quando o tal príncipe resolve deixar a princesinha desolada no castelo enquanto sai com o resto da corte para jogar e encher a cara em alguma taverna imunda onde nenhuma dama seria bem vista. Depois esquece o cavalo branco e todo o estrume, por ele produzido, para ela limpar, pois o príncipe resolveu que um carro, com dezenas de cavalos, é muito mais importante que qualquer princesa. E aí começa o efeito bola de neve onde pequenas cenas do cotidiano tornam-se insuportáveis e uma avalanche está sempre pronta para te soterrar. Coisas idiotas como largar a toalha molhada na cama, mijar na tampa da privada, jogar videogame com o controle remoto da televisão e tantas outras que fazem a convivência ser impossível. É nessas horas que percebemos que o príncipe não passava de um sapo cururu que achava que poderia transformar o seu mundo em um grande brejo e você passa a se perguntar: O que estou fazendo com este ser?

Daí você reflete, analisa toda a situação, os prós, os contras, todos os seus conceitos sobre o que é amor e percebe que o príncipe encantado não passa de uma visão adolescente de “Romeu & Julieta”, que realmente é linda, mas dentro do universo Shakespeareriano. Depois entra numa fase neurótica que consiste em achar que o mundo é um grande brejo e você está atolado nele até os joelhos. Começa a ficar cética e passa a criar situações bizarras que vão desde um auto-isolamento-feminista-xiíta até um pseudolesbianismo, que no fundo tem o mesmo contexto: Todo homem é um merda e o amor é uma flor roxa que nasce no coração dos trouxas.

Mas um dia, a flecha do cupido lhe atinge novamente. Você acha que vai começar outra sessão do “vale a pena ver de novo”, que vai quebrar a cara novamente e fica com os dois pés atrás antes de embarcar num possível relacionamento. Começa a formular dezenas de pensamentos tolos no sentido de “não cometerei mais os mesmos erros”, porém fica tão concentrada nisso que não consegue curtir o momento e nem assimilar o que teria de bom ou ruim na situação. Conclusão: Acabou-se o que era doce e você ficou chupando o dedo. Mais uma vez, o mundo fica restrito ao seu umbigo e volta a ser reflexiva. E depois de vários tropeços, tombos e arranhões na alma, começamos a ter maturidade suficiente para entender sobre o que é o amor e toda a concepção errônea que criamos acerca dele.

Primeiramente, vou me apoiar no pai dos burros para continuar. Segundo o Aurélio, amor é: 1-Sentimento que predispõe alguém a desejar o bem de outrem. 2- Sentimento de dedicação absoluta de um ser a outro, ou a uma coisa. Devemos entender que amor é um sentimento universal. Podemos amar qualquer pessoa ou coisa, o que muda é a forma e a proporção. Há pessoas que amam seus animais de estimação por ter perdido o sentido em amar outras pessoas, há outras que amam pessoas que nem conhecem e vivem para ajudá-las sem que elas saibam, outras amam o trabalho, o dinheiro e coisas materiais. Porém, há outras que amam outras pessoas. Um alguém especial, amigos, família, tudo e todos que fazem parte do nosso mundo e queremos bem. 4- Inclinação sexual forte por pessoa doutro (ou do mesmo) sexo. Em nossa sociedade ocidental, o sexo tem um valor imenso e atualmente tem pesado muito mais do que apenas como uma ação procriativa para continuar espalhando nossos genes pelo mundo. Sexo é uma delícia. Sexo com quem amamos é ainda melhor, pois envolve muito mais do que o ato. Envolve cumplicidade, intimidade e outros sentimentos que complementam o universo do amor. Sexo serve também como termômetro das relações. Claro que no começo da relação, os hormônios estão em polvorosa e transamos até não dar para dar mais, mas com o tempo, outras atividades a dois passam a preencher as lacunas provocadas pela diminuição no ritmo sexual, mas não interferem na qualidade das transas. Porém, é pelo sexo que percebemos que as coisas vão ou não vão bem. Diminuição no interesse, queda de qualidade são fatores que costumam indicar que o relacionamento não anda bem das pernas. Geralmente, quando o sexo é afetado é porque a relação já desandou há algum tempo. Afinal, somos seres carnais e muitas vezes conseguimos transar por transar e muitas relações se sustentam justamente pelo sexo bem feito. 5-Afeição, amizade, simpatia. Amar uma pessoa não significa apenas gostar, mas admirar, respeitar entender e tentar aceitar seus defeitos. Amor não é apenas estar perfumado e belo para o outro, mas é acordar e se deparar com um ser descabelado, com mau hálito e a cara amassada. Isso quando não passa a noite inteira peidando e roncando em seu ouvido. Amar é entender quando o sexo não está legal e não culpar o outro pela falta de desempenho, mas ajudá-lo a resolver isso. Amor é cumplicidade e união, mesmo quando os pensamentos são diferentes, mas o outro está sempre disposto a ouvi-los e vice-versa. Amar alguém é, antes de tudo, uma demonstração de amor-próprio, afinal quem não se gosta não consegue atrair outra pessoa positivamente. Parece clichê, mas é verdade. Quem vai querer uma pessoa cheia de recalques e tem problemas com a auto-aceitação? Pensando bem, tem pessoas que querem sim. São justamente aquelas que têm os mesmos problemas de aceitação e não assumem para si mesmos. Acreditam que podem “salvar” o outro, mas na verdade, precisam se resolver. Mas isso é assunto para outro momento… Amar é ter um puta orgulho da pessoa que está ao seu lado. Não é no sentido de carregar um troféu ao lado para provar sua capacidade de conquista, mas de justamente cultivar a relação e mostrar isso para meio mundo.

Resumindo: É se entregar a um nobre sentimento, independente da pessoa ou causa e receber a devida recíproca pela sua entrega. É achar graça quando o outro te chama por apelidos idiotas e reclamar quando faz algo que te desagrade. Amar não é só dizer dezenas de vezes por dia “Eu te amo” e esperar resposta em seguida, mas é ganhar uma flor roubada de um jardim e ouvir: “Não tinha um puto, mas trouxe isso pensando em você.” Amar é legal, faz bem pra pele, mas causa rugas por causa dos sorrisos e das caras emburradas e/ou enfurecidas que fazemos freqüentemente. Amar é algo tão simples que a gente faz questão de complicar.

Mas quem sou eu para dizer o que é certo ou errado? Para afirmar e pregar sobre algo? Bem, eu sou uma garota como outra qualquer que, atualmente, acredita ter chegado numa concepção aceitável sobre o que vem a ser o tal amor. Pelo menos, graças a ela, estou conseguindo curtir um relacionamento que está muito longe de ser perfeito, mas estou curtindo pra caralho.

PS: Este texto é dedicado para aquele a quem eu não digo “te amo” diariamente, (o q eu não faço por que tenho medo dele não responder), o que também não significa que eu não esteja sempre pensando nele.