Sobre poesia (E um pouco de babaquice)


Como nasce uma poesia? O que é poesia e o que não é poesia? Essa é uma discussão longa e certamente, improdutiva. Pelo menos pra mim, poesia está em todo lugar, e a melhor, é aquela que sentimos intacta, de maneira bruta e pura, como uma pedra de mármore, antes de ser esculpida. O que fazemos com a pedra, depois, pode ser muitas coisas. Pode ser uma grande estátua, ou uma sucessão de enganos do cinzel. Mas mesmo os enganos, são um testemunho do estado da mão de quem esculpe. E por si só, é também poesia.

E para tudo isso, para todo o nascimento da arte de se escrever o desnecessário, basta a inspiração. Essa, uma palavra que de certa forma me incomoda. Eu não acredito muito em inspiração na acepção mais romântica. Há quem diga que ela vem como uma brisa suave que infla o peito e tem de ser expressa com urgência. Não é bem meu caso. Inspiração pra mim é como um cavalo furioso que mete as quatro patas em meu peito. E que me obriga a cuspir para o mundo tudo aquilo que me tornaria doente se não falasse. É como aquela cusparada de sangue após um cruzado de direita. Se é  poesia ou não, se tem valor ou não, isso é escolha de quem lê. Pra mim, é antes de tudo, um ato fisiológico. Uma necessidade.

Nada mais despropositado do que atribuir valor a uma poesia. Qual unidade de medida pode dizer se um poema é bom ou ruim? Poesia tem um propósito  principal: atingir o leitor. Seja na alma, seja no corpo. Se não atinge, não diz nada a quem lê. Mas ainda assim, o valor de uma poesia depende também dos olhos que leem. Pra dar um exemplo no campo da música, há quem se emocione ouvindo Mozart. E há quem veja naqueles sons todos, um amontoado de notas que não dizem nada e produzem sono. Então pode-se entender que cada cabeça terá uma leitura e cada leitura poderá ser uma grande descoberta ou apenas ajuntamento de palavras sem sentido. E as palavras não necessitam de arcabouços para serem monumentos. Pois já li muita besteira metrificada e muitas coisas belas em versos livres...e vice versa. (Obviamente dentro de minha preferências).

Qual é então, o sentido da poesia no mundo? É o que eu também estou tentando descobrir quando escrevo. Gosto da experimentação, do desafio, e acho que a arte poética se presta muito convenientemente a isso. Assim como todas as artes, o poema deve ser um reflexo de seu tempo, sem, contudo ignorar o passado. A herança dos grandes poetas é o que nos permitiu chegar até esse estágio. O que não quer dizer que necessariamente tenha de escrever como eles. Até posso. Mas aí, é uma questão de eu achar pertinente.  Mas ter uma função delimitada como num procedimento operacional padrão, isso, acho que a poesia não tem.

No fim das contas, acredito que esse próprio texto é por si só desnecessário. Tentar justificar ou entender essa ou aquela arte é um exercício inútil. A grande qualidade dela reside em sua não-funcionalidade. Arte é expressão. Quem poderá de fato, determinar o valor do sentimento ou do conhecimento técnico aplicado em uma obra? E isso me faz lembrar também de outra coisa que muito me incomoda ás vezes: a expressão do sentimento. Posso afirmar com toda certeza que muitas vezes não tem sentimento nenhum envolvido no que escrevo. É apenas um exercício morfológico. Claro que é mais que normal que suscite em quem lê sentimentos de amor, asco, ódio, paz.....mas com certeza, porque o poema funciona como um catalizador para o sentimento do leitor. E nesse caso, o recado é um só: não confundir a obra com o autor. Ele pode estar querendo dizer muitas coisas, inclusive: nada. Se me perguntarem o que considero então uma boa poesia, eu direi: é aquela que, independente de ser sentimento ou exercício técnico, me faz pensar ou me emociona.

Exposto tudo isso, dou por encerrado esse que deveria ser um texto sobre a arte poética. Na metade dele, percebi sua própria dispensabilidade. Como já me disse um amigo há um tempo, chega de justificativas. Eu quero é poesia. Tanto escrever quanto ler.

 
EDUARDO PAIXÃO
Enviado por EDUARDO PAIXÃO em 26/03/2012
Código do texto: T3576125
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