MISÉRIA GERA MISÉRIA ( O sinal vai abrir, mete a mão no teu bolso e me dê logo o papel.)

Trânsito lento, calor insuportável, paciência no fim, sinal vermelho, aquela vontade de estar em casa, desfrutar do aconchego do lar e de toda liberdade sem preocupação ou apego... Simplesmente relaxar, um vício que poucos compreendem e muitos desejam. Derrepente um pedinte se aproxima, cheio de cicatrizes e de pecados, mas que naquele instante se dizia totalmente liberto; se vê no direito de tomar vantagem da situação e me pede uma ajudinha.

-Quanto a mim, o que dizer, sou eu o responsável por tamanha desgraça? O causador daquele infortúnio? Ou simplesmente um refém dos ensinamentos religiosos que me instrui a dar esmolas, como se ao fazer isso terei uma pontuação extra e no dia do juízo final um bônus que me livrará do fogo do inferno... E agora o que fazer?

Insistentemente o pedinte, meio que apresado quer saber se vou dar ou não uma moeda. Cadê a justiça social? Cristo está ou não naquele pedinte, que tenho a certeza explora a minha índole e coloca os meus valores pessoais à prova. Sou eu agora uma vítima ou apenas devo dar o dinheiro e ir embora, feliz por ter feito uma boa ação!

-Digo a ele que não tenho moeda só papel.

Inesperadamente ele me responde: O sinal vai abrir, mete a mão no teu bolso e me dê logo o papel. Aquilo era um pedido de esmolas ou assalto? Então novamente, só que agora meio ríspido lhe disse: cinquentinha é muito amigão. Acelerei e fui embora. A consciência pesada, a sensação de impotência, triste por não ter crido naquele pedinte. E se o mesmo tivesse falado a verdade e fosse realmente usar o dinheiro para fins lícitos... O que fazer? Estraguei minha noite!

Em seguida, um pouco mais a frente paro noutro sinaleiro e por incrível que pareça mais um pedinte me intima. Só que agora, uma mulher e para maximizar a minha angústia, está com uma criança no colo e diz ter muita fome. Dar o papel, ou simplesmente ignorá-la, fingir não estar incomodado ou me render àquela situação... Que Deus me perdoe, mas a vontade que tenho é de estar bem longe. A criança chora, tive a impressão de que a mãe o tenha beliscado, talvez por isso a criança me estendesse os braços!

- E agora José?

Diante daquele novo apelo emocional, deveria ter dado o papel, mas não o fiz. Novamente fui embora com o sentimento de ter feito a coisa certa, pois não teria me sentido bem em ajudar a um e não ao outro. A vida besta segue, não me faltarão oportunidades de ajudar alguém que realmente mereça. Detesto moedas e por isso as guardo num cofrinho na esperança de que os pedintes não inflacione o discurso e passem a pedir somente o papel.

flavoide
Enviado por flavoide em 12/04/2012
Reeditado em 16/04/2012
Código do texto: T3608066