Quem tá andando?

Olhei no relógio: estava atrasado.

Atropelamento fenomenal de todas as coisas, passando depressa sem se deter para não impressionar... A ordem é depressa e não devagar. A ordem é sofrer e não saciar. A ordem é morrer pra depois revidar. A ordem é perder e nunca ganhar. A ordem é obedecer e nunca conquistar. A ordem é sentar e jamais levantar.

Olho pra trás e vejo meu reflexo em todos os rostos partidos, em todos os lares quebrados, minha sombra nos gritos abafados, nos sussurros exilados, nas mãos inúteis que tecem o sofrido clamor das palavras esquecidas e impraticáveis.

Inabalável sigo sem pensar, atributo ausente pela virtude da alienação. Compartilho com os irmãos da esperança comprada, da negociação do amor, da afinidade dos interesses, da exposição inflada do caráter submisso, da pedante imaginação de ter que ser o que gostaria e não o que é...

Antes comíamos pães enquanto víamos espetáculos, hoje comemos o expectador sendo devorados pelos leões com as patas nas costas.

Sem respirar adquiro alívio, enxergo sobre o pó da permanência buscando ancorar a possibilidade.

Me desvencilho do ardor colateral, vendo o imbatível perdendo força e o astuto nebuloso ser tão normal...