Meia hora

Ideais.

Constantemente pronunciamos tal palavra.

Ideais, planos, carreira, estudo, futuro, estabilidade.

Na mesma bandeja diária, nos é servido uma pequena porção de: “Pra quê?” , “Por quê?” .

O mundo cresce, muda, evolui e... regressa. Faz sentido?

(...)

Era mais um sábado qualquer.

Entediada com o trabalho repetido, seguido do mesmo: “Olá, tudo bem?”.

Aquele intervalo rotineiro, levando-a até a padaria para tomar um café, comer qualquer “porcaria” e observar o “dia consumista” mais uma vez.

Pessoas.

Todos os dias abarrotando os caixas de supermercado. Crianças correndo, vibrando pelas guloseimas de Natal nas prateleiras. Aquela senhora perdida na prateleira de produtos de limpeza, um senhor degustando vinhos, a fila no açougue, aquelas frutas podres esperando para serem trocadas, umas verduras verdes rodeadas de olhos que as escolhiam.

Pessoas e mais pessoas. Gastando dinheiro para alimentar a família e talvez um animal de estimação.

Pessoas que trabalham, cansam, correm, perdem ônibus, batem o carro, trocam de carro, caminham depressa, olham vitrines, fogem do sol, tropeçam, xingam os vizinhos, adotam cachorros, lavam calçadas.

Pessoas que investem. Que ora desperdiçam ora economizam.

Tudo sendo movido pelas pequenas folhas de papel surrado, que passam de carteiras para bolsos, para contas bancárias, para impostos absurdos, para mãos cansadas e novamente caem nos caixas de supermercado.

E estas pessoas?

Acumulando gordura, fardos, contas, celulite, cartões, palavras, desculpas, gestos... Com fones de ouvidos gigantes, óculos coloridos, jeans extremamente curtos, outros colados, uns rasgados... E o desfile de cabelos coloridos, raspados, estranhos, grandes, arrepiados?

Era digital, consumista, depressiva... Tão cheia de entulhos superficiais e mentes vazias!

(...)

No caixa então, a mulher com o bebê de colo encosta seu carrinho, cheio de produtos úteis e indispensáveis para a passagem de mais um mês. A funcionária da ocasião lhe sorri, passa os produtos pelo leitor a sua frente, indicando o preço na tela do computador. A mulher que tenta acalmar a criança que chora, acompanha os valores que surgem na tela após cada "bip".

Finalizada as compras, ela abre aquela bolsa gigante, de onde quase cai uma mamadeira, tira uma carteira escandalosa, cheia de zíperes e entrega algumas notas grandes para a atendente, que as confere. Abrindo a gaveta do caixa, pode se ver muitas delas, notas surradas, cheias de digitais e histórias, gritando um apelo de movimentação contínua.

A atendente devolve o troco para a mulher, lhe agradecendo. A criança que antes chorava, agora dorme nos braços da mãe. Juntas elas seguem com o carrinho de compras, agora todas em sacolas, rumo a saída do supermercado.

(...)

Eram quase cinco horas da tarde, uma nuvem escura encobria o céu.

Iria chover em instantes. Mas o calor ainda dominava o dia.

Ela estava voltando para sua sala, com o olhar baixo, prevendo o tédio que seria repetir a mesma frase por mais algumas horas. Suas costas doíam, seu humor oscilava. Seu pensando focado em algumas quadras longe dali.

Novamente com seu crachá, enquanto aguardava o próximo cliente, através do vidro ela observava a movimentação angustiante das pessoas até os caixas do supermercado.

Continuava sendo um sábado qualquer. Sua meia hora de intervalo havia chegado ao fim.

Taie
Enviado por Taie em 26/11/2012
Reeditado em 28/11/2012
Código do texto: T4004965
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