SINTO-ME NU...
Vagueio pelo convexo e pelo côncavo das curvas
Para que não me vejam cambalear nas retas
Não vá alguém vociferar que estou embriagado
Ou, pior ainda, ache que deveria ser internado num hospício
Vivo num pedaço de terra onde me empurram sem piedade
Empurrões que não sendo físicos me descalibram a mente
Como se em mim quisessem instalar a voz do único sentido
Sinto-me nu… ou melhor, imaginam-me nu
Não vá qualquer peça de roupa infringir a lei
Através do cheiro ou da cor que possa amolecer o legislador
E assim, revoltado por dentro e impotente por fora
Vou comendo as sobras que restam do último banquete
E tentam calar-me sem serem precisas palavras
Mostrando o espectro da fome que mata os que ainda pensam
Sinto-me nu, ou melhor, imaginam-me nu
Depois de tanta lavagem, como se um homem fosse um carro coberto de poeira
Ou um miserável acabado de se salvar do pantanal
Doem-me os joelhos de tanto tropeçar
A garganta de tanto gritar basta
O pescoço de tanto girar na procura da rota certa
Mas mantenho-me de pé
Quero vê-los cair antes de entrar num hospício.