Desabafo

Eu gosto de escrever, porque é o que me faz ver além desse aspecto poluído e corrupto das coisas, é o que me faz ver além das aparências e o que me faz sentir mais do que esse imediatismo das situações cotidianas. Eu gosto de não ser apenas mais um pedaço do gráfico que compõe essa sociedade sóbria. Eu quero ser inédita mas, sou uma figura comum, uma cara comum, um rosto entre outros quase 7 bilhões, ou seja, uma face a mais na face da terra! É por isso que eu escrevo. Porque eu estou cansada da visão medíocre das pessoas, estou cansada do discurso pobre que está sempre preocupado com o que vestir, com a ladainha repetitiva de quanto mais, melhor. Estou exausta!

Somos feitos de carne e osso, ninguém é diferente disso mas, por alguma razão uns tem outros não. E não é por desejar ter ou por lutar ou não, muitas vezes é uma condição imposta desde a concepção e ainda assim o ter ou não ter é visto como primordial, é claro que estou falando de dinheiro mas, afinal o que isso acrescentaria ao meu caráter?

Há uma busca desenfreada por status, por acúmulo, por simples posse, e afinal o que isso realmente pode significar dentro de um contexto em que nunca se tem o bastante? Eu estou farta de fingir que compactuo com esse pensamento pequeno, eu sou grande demais pra isso, eu sou muito mais que o que eu visto e sou muito mais que o eu tenho, mais do que o que eu tive, sou muito mais do que o que eu já perdi, eu sou alguém. E pra muita gente isso significa nada, o que é ser alguém? Mas, precisamos ser alguém e deixar de ser algo, precisamos parar de nos tratarmos como objetos uns aos outros e a nós mesmos, para começarmos a nós tratarmos como pessoas. E é claro que tem aqueles que dirão, com desdém, que é demagogia e, mais uma vez olhando para o próprio umbigo vão sorrir de suas barrigas cheias, enquanto tantas outras pessoas não tem o que comer.

Só sei que cansei de fechar a minha boca e engolir as minhas palavras. Não cabe mais o silêncio, não cabe mais a conformidade, não cabe mais essas mentiras socialmente aceitáveis, eu preciso me olhar no espelho de frente e gostar do que eu vejo! Não porque o batom combina com a sombra, ou porque o sapato é da moda mas, porque minha alma está límpida, eu preciso perdoar as pessoas que me feriram e eu preciso amar sem limitações, eu preciso olhar pra aquele mendigo caído na rua e fazer algo pra ajudá-lo nem que seja dizer um "oi" pra que ele possa saber que eu não sou cego e que ele não é invisível. Eu preciso limpar meu coração e não ficar guardando as bagunças que os outros fizeram nele, eu não preciso ficar tentando arrumar tudo em seu devido lugar, porque eu posso simplesmente jogar fora e deixar com que tudo que há de bom dentro de mim habite ali. O bem não pode ferir bom, o bem não sabe ferir o bom, então se fere é porque é mal ou é o mau sendo ferido.

Eu preciso ser adepta da sinceridade, da tolerância, do amor, preciso ser parte de algo verdadeiro e não perecível, eu preciso ser uma extensão desta matéria da qual sou feito, porque eu não quero e não posso simplesmente voltar ao pó!

Eu estou mesmo muito cansada de ser vista superficialmente, de ser medida, de ser pesada, de ser comparada, de ser aprovada ou desaprovada por conceitos com os quais eu sequer concordo, ou por pessoas que não fazem a mínima diferença na minha vida ou na vida de qualquer pessoa que eu ame. Eu estou cansada de esconder os meus sentimentos por medo, de conter minhas gargalhadas por vergonha, de escolher minhas companhias por interesse, de aceitar as companhias por conveniência ou me privar da companhia de quem eu gosto por caprichos inúteis pregados pela moral e ética social, que já foi bem mais moralista e ética em momentos de carnificina e genocídio em massa. E é nisso que nos baseamos? É assim que separamos os lados? Afinal estamos de que lado? Eu estou do lado de mim mesmo? Ou eu luto exatamente contra mim? Eu tenho medo é de não ser capaz de ser diferente de tudo que eu quero mudar nesse mundo, e acabar mais uma vez abaixando a minha cabeça pra não olhar o que está à minha volta.

Priscila Neves
Enviado por Priscila Neves em 24/06/2013
Código do texto: T4355545
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