Anjo implicante

Todos os meus dias me mantêm em brigas comigo mesmo, não que eu tenha uma vida indigna, porém, a imperfeição desta existência me traz à tona pensamentos quase insanos a esta minha vida de personalidade nobre. Não quero, jamais, parecer arrogante com esta conversa de “nobreza”, pois, tenho a consciência de que sou mais um ser humano mortal, igualmente aos demais que navegam por este mar de adversidades incríveis. Aliás, “não tem pra ninguém”, todos os seres humanos estão muito longe do conhecimento pleno sobre a face de um ínfimo planeta degredado nos confins dos universos. Desde os primórdios da humanidade ninguém pôde vislumbrar vida além deste grão de areia cósmico.

Dentro de mim mora um anjo, não sei ao certo se, bom ou ruim, o que realmente sei é que ele exerce enorme influência sobre minhas atitudes. Este anjo nasceu comigo para me acompanhar nesta jornada perigosa. Sabe, meu irmão de caminhada, viver é muito perigoso! Porém, somente com o decorrer do tempo pude percebê-lo ao meu lado, sempre a fremir aos meus ouvidos palavras sedutoras. É aí que começa a minha beligerância interna. Tenho de conservar a minha personalidade idônea, tenho de me manter consciente de meus atos. Este anjo às vezes me dá alguns conselhos de atravessado e, quando posso, rejeito-os, e quando isto acontece, sinto-me fortificado. Pois, creio estar vencendo o meu ego. O meu anjo de tanto me fazer errar, está aprendendo a se evoluir, soprando à minha mente de que é errando que se aprende. Está cada vez mais humano, plagiando frases soltas pelo ar. Tem mudado bastante, hoje ele é outro anjo, e eu outra pessoa. Fundimo-nos em erros e acertos. Assim foi por longas décadas. Este anjo danado é enigmático como a própria existência.

Às vezes me vejo no Édem, aquele mesmo; criado pelo Senhor de todas as coisas. Aí aparece o cara, todo encantado, insistindo para que eu saboreie um suculento fruto. Já cansei de falar que não quero me atrever, porém, ele é cheio de sedutoras palavras, ainda bem que tenho acordado destes sonhos paradisíacos, pois, pouco a pouco o paraíso começa a tornar-se insuportável. Talvez seja aquele mesmo Anjo Torto, do poeta Carlos, que foi logo colocando aquela pedra no meio de seu caminho para que o nobre poeta nela tropeçasse e fosse gauche pela vida...

Um dia desses, estava sentado sobre a soleira do portão lá de casa, rua pacata, vizinhança pacífica, quando me apareceu Elifaz, o meu anjo, a me chamar à atenção: Oi Véio! - Por que não vai ver um daqueles programas policiais do qual escorre o sangue da impunidade pelo monitor de plasma de sua moderna tevê? Pensei que tinha sido algum desajuste de minha fértil imaginação, mas ao testificar vi que era realmente ele com um sorriso maroto e com olhar de soslaio. Em seguida ouvi três estampidos advindos da próxima esquina à esquerda, então tomei a óbvia atitude de entrar à minha casa, enquanto, Elifaz piscava maliciosamente para mim.

jbcampos
Enviado por jbcampos em 01/09/2013
Reeditado em 19/06/2016
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