Buraco interior

Ao caminhar na praia, enquanto o único barulho capturado pelo meus ouvidos era a natureza, em seguida ouvi uma voz que gritava baixinho, pedia socorro. Ergui meus olhos para saber de onde vinha a voz.

Segui pelas pedras, o vento soprava quente, fui em frente.

Vi pernas estendida no chão perto de umas pedras grandes. Havia uma pessoa ali. Percebi que ela fazia movimentos estranhos. Achei estar alcoolizada, fui chegando mais perto.

- Me ajude, por favor! - A voz era masculina.

Cheguei perto o suficiente para sentir que não era problemas com alcool mesmo. O homem apresentava sinais de sofrimento na face perdida que procurava a luz. Estava sem controle dos movimento do seu corpo.

- Me ajude, por favor! - Insistia.

A voz estava entrecortada, quebradiça, sofrida e embargada. Quase não se ouvia o seu soluçar silencioso. Sempre tive boa audição, outro não conseguiria ouvi-lo na distancia que eu estava.

Sua expressão era taciturna, angustiada. Qualquer pessoa com sensibilidade cairia num choro ao ver aquela pobre criatura definhando num buraco que ele próprio cavara. Eu contive a minha emoção, já estava com lágrimas nos olhos, não por vê-lo naquele estado, mas pelo que eu senti vindo dele.

De frente para ele, eu sentei na areia sem medo nenhum de ficar perto daquele sujeito desconhecido, vendo-o chorar. Ele já estava sentado, parado, soluçando, encostado numa pedra da qual era ela que segurava seu corpo enfermo.

- Se acalme. Vai dar tudo certo. - Eu disse.

Ele respirou fundo e o choro foi cessando. Me concentrei nele, na sua solidão lagrimosa e tive empatia por ele. Nesse momento, eu consegui sentir o que estava nele, com mais intensidade. A minha percepção estava ampla. Respirei fundo, me senti pesada, com dor, vontade de chorar, um dor sem fim, quase o mesmo que marteladas no peito. Aceitei a empatia do momento.

Não era bom o que ele sentia, havia um aglomero de sentimentos ruins dentro dele, o trancando lá dentro.

- Só faça isso parar, por favor. - Ele suplicou.

Ele estava infestado de fragmentos de medo, de fracasso, de orgulho, de tristeza, espalhados por todo seu ser. Nem olhava para cima com receio de não obter o resultado que queria tanto. Estava com vontade de lutar. Fazia força, orava baixinho.

- Ninguém sentaria aqui e falaria comigo desse jeito, todo maltrapilho por dentro e por fora. Você é um anjo. Por isso peço, me ajude, não enxergo, não posso comigo mesmo! - Mais choros misturado com desespero.

Continuou no mesmo lugar. Estava em seus últimos momentos de cedência a tudo aquilo. Algo terrível de se vê, sentir e ouvir. Minha pressão baixou, eu me segurei para não cair, mas não desisti, eu tinha que terminar o que estava fazendo. Meu coração acelerava, uma dor profunda persistia em mim, uma depressão sem entendimento me rondava e mesmo assim eu não queria desistir.

- Você consegue, é só me ajudar. Será mais rápido e menos doloroso. Pode fazer isso? - perguntei.

Ele assentiu balançando a cabeça. Uma ansiedade me pegou de jeito, ele queria mais do que antes terminar aquela angústia depressiva. Tive de respirar profundamente com frequencia, o pobre nem sabia que eu sabia o que ele estava sentindo. Olhei para ele e fiz uma cara de que já estava terminando.

Concentrei-me nas árvores ao redor, e suguei a energia delas. Em seguida, já abastecida passei para ele. Ainda bem que eu tinha uma garrafa de água. Coloquei minhas mãos na água e fluidifiquei com todo meu amor e bondade. Fiz uma oração e pedi que ele bebesse da água.

Ele bebeu e ficou calado. Parecia não sofrer mais daquele jeito. Respirou. Abriu os olhos devagar para se acostumar com a claridade que a luz da lua emitia. Olhou para mim e sorriu.

- Obrigada! Não sabe o quanto esperei por isso.

- Eu não fiz nada. Só fui usada no momento certo, para a pessoa certa.

- Tava escuro, muito escuro.

- Eu sei. Por que deixou isso acontecer?

- Eu não sei. Talvez a falta de percepção. Eu não sabia onde estava. Não via nada.

- Se soubesse você saberia sair. Mas vagou por recintos incertos.

- O que você fez ninguém quis fazer.

- Por que cada um tem sua própria bagagem. E quando mal administrada, dá nisso. Um peso enorme.

- Achei que não ia mais conseguir sair.

- Era só questão de tempo. E sem vontade nada acontece.

- Preciso me recuperar e não deixar isso acontecer de novo.

- Boa. Isso mesmo. Agora tenho que ir embora. Cuide-se.

Me levantei e fui caminhando na mesma direção que apareci.

- Ei?!

Me virei e olhei, sabia que ele ia perguntar.

- Onde exatamente eu estava?

- Preso, dentro de você.

Virei as costas e fui de vez.

Belly Regina
Enviado por Belly Regina em 06/02/2014
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