O PERCURSO...
Passei por florestas verdes e torradas
Pisei terras áureas e lamacentas
Afaguei braços no auge da ternura
Mas também quando em gritos lancinantes
Pediam socorro a quem se fazia de surdo
Assisti a festas de alguéns que proclamavam glórias
Que o passar dos anos tornaram irrascíveis
E que mais tarde caíram na desgraça
E mais tarde ainda só as moscas zumbiram no seu velório
Assisti a casamentos com palavras levianas como o ‘toda a vida’
Como se a vida se resumisse àquele momento
Assisti ao brotar de seres que se multiplicaram
E geraram outros seres
Bebi água de ribeiras cálidas e transparentes
Hoje fórmulas de venenos que até o solo dilaceram
Ouvi tantos nãos que queriam dizer sim
E a tantos sins que queriam dizer não
Como se a vida das pessoas fosse uma caixa
Decifradora das angústias alheias
Vi gente batalhar por pão com os insectos
E depois pelos insectos porque já não havia pão
Vi mortos em vida
E legados deixados após a morte
Vi rostos sorridentes com as cores do arco íris
Os mesmos rostos que brotaram lágrimas por felicidades perdidas
Já vi tanta coisa na minha vida
É longo o meu percurso.