PELA MADRUGADA...
Cai a noite…
Sobre as nossas cabeças paira uma névoa
Semelhante a um véu que nos persegue de forma cândida
O chão brilha como que envernizado para grandes ocasiões
Não há bailes, nem concertos, nem seminários agendados
Há uma porta aberta ao silêncio da madrugada
Onde os teus passos marcam a cadência de cada metro percorrido
Vagueio por ruas e ruelas mal iluminadas
Cobertas de segredos das vidas que repousam em leitos de conforto
Ouço alguns ruídos próprios da nudez das horas
O mar que rebenta nas margens o seu passeio constante
O poema imperceptível da coruja em direcção à lua
Os cães ou os gatos que procuram na noite os despojos do dia
A madrugada das insónias e dos arrependimentos
Da lista de pensamentos que o bulício não nos deixou ordenar
Caminho lentamente
Absorvo cada delícia de um tempo em que o tempo não conta
Protejo a face da brisa que corta como uma lâmina
Sinto uma calma que me evidencia dupla personalidade
Aquela parte onde não temos de responder aos energúmenos
De uma sociedade rachada como lenha que nos aquece
Gosto da madrugada
Gosto de caminhar pela madrugada
Onde consigo ser o corpo e a mente que me trouxe ao Mundo.