A Viagem da madrugada

Hoje me bateu na memória as poucas viagens que tive com meu velho. Senti na mente o cheiro de orvalho a lenha queimada e a preguiça ao viajar. Era poucas vezes que tive coragem de acompanha-lo, eu muito jovem sempre com preguiça de acordar. Mas quando ele viajava de madrugada tinha o prazer em me chamar. Vez ou outra eu lhe acompanhava e cada viagem uma sensação diferente, um cheiro de café ao vento e o asfalto molhando da noite dando aurora. A lembrança dos faróis ainda aceso sendo esquecido pela luz do dia e da memoria. Eu com minha cara de sono em expressões com sua companhia, do seu cheiro de perfume no carro que misturava com a essência da vida. Acordei-me com essa sensação da lembrança. Das madrugadas que ele me chamava e se eu soubesse? Hoje eu não recusava! Hoje ficou na lembrança que aqueles momentos foram únicos. Era uma passagem da noite para o dia tudo muda tudo é mudo. É como se o dia tivesse acordando bocejando para acordar, é o cachorro noturno voltando pra casa, é burro mulo se preparando para trabalhar, é as flores desabrochando para sorrir, é o gato ainda dormindo na sacada da casa, é a terra molhada da chuva que caiu, é o orvalho tímido escorrido no para-brisa refletindo a fumaça da lenha queimada, é o café sendo fervido junto com o chá da calmaria, é o verde das árvores sendo iluminado pelo sol e o raiar do sol que brilha o seu caminho onde poucos minutos antes era escuridão. É o segredo da viagem da madruga perto do dia é a lembrança única com a sua companhia. Em breve viajarei na mesmo horario que ele viajava e certeza ele estará comigo. Porque ele não se foi, apenas passou a viver dentro de mim. E agora tudo faz sentido, o escuro e a luz, interpretando a transição da vida.

João Quintans
Enviado por João Quintans em 27/02/2015
Reeditado em 27/02/2015
Código do texto: T5152001
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