SOMBRAS...

Não falo das parcas sombras geradas pelo eucaliptal

Tão pouco dos sobreiros onde descansa o pastor

Ou das azinheiras que desafiam o meu tórrido Alentejo

Falo das sombras que assolam o dia a dia que me mede

Que traçam o calendário do tempo que me resta

E vão consumindo partes de um corpo que ainda é vida

Mas que vai morrendo à cadência cruel da natureza

Os meus olhos ainda são os mesmos

A linha do horizonte é que está mais perto

Assim quase ao alcance de duas mãos desesperadas por lhe tocar

De um adeus quando da tarde se faz noite

De uma noite cheia de luzes que se entrecruzam e confundem

Sombras de um estar dilacerado à luz de uma candeia

Pedaço de verdade que me ajuda a tatear

E me traz a felicidade de quem encontra o brinquedo perdido

Uma felicidade parca para quem tanto quer

Mas que as sombras obscurecem no seu culto de tirania

Tudo me parece cinzento

À minha vista o sol desapareceu para dar lugar ao nevoeiro

E chove…

Uma chuva miudinha que me lava a alma

E branqueia o sujo da dor que não me dói

Não sei se durmo porque nada vejo em meu redor

Como não sei se a morte será assim tão diferente

À sombra das minhas sombras me espero e me confino.

Ângelo Gomes
Enviado por Ângelo Gomes em 08/08/2015
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