SOMBRAS...
Não falo das parcas sombras geradas pelo eucaliptal
Tão pouco dos sobreiros onde descansa o pastor
Ou das azinheiras que desafiam o meu tórrido Alentejo
Falo das sombras que assolam o dia a dia que me mede
Que traçam o calendário do tempo que me resta
E vão consumindo partes de um corpo que ainda é vida
Mas que vai morrendo à cadência cruel da natureza
Os meus olhos ainda são os mesmos
A linha do horizonte é que está mais perto
Assim quase ao alcance de duas mãos desesperadas por lhe tocar
De um adeus quando da tarde se faz noite
De uma noite cheia de luzes que se entrecruzam e confundem
Sombras de um estar dilacerado à luz de uma candeia
Pedaço de verdade que me ajuda a tatear
E me traz a felicidade de quem encontra o brinquedo perdido
Uma felicidade parca para quem tanto quer
Mas que as sombras obscurecem no seu culto de tirania
Tudo me parece cinzento
À minha vista o sol desapareceu para dar lugar ao nevoeiro
E chove…
Uma chuva miudinha que me lava a alma
E branqueia o sujo da dor que não me dói
Não sei se durmo porque nada vejo em meu redor
Como não sei se a morte será assim tão diferente
À sombra das minhas sombras me espero e me confino.