Meus 30 e poucos.

Pareciam tão distantes e assustadores.

Acreditei ser a linha de chegada; o fim da estrada.

Fechei os olhos pra fugir.

Não adianta tentar, não consigo me lembrar

por quanto tempo eu segui o ditado;

por quanto tempo usei o mesmo penteado.

Lembro-me apenas daquele enorme muro;

nunca fiz perguntas sobre o outro lado.

E agora, que o ponteiro passou dos trinta,

inacreditavelmente, fui invadida por uma magia.

Ser mulher.

Eu escalei o muro.

Todos os dias, revelo-me muito sobre mim.

Já não importa se foram mais nãos do que sins.

Fui invadida pelo calor do recomeço,

pelo frescor dos sonhos.

Guardei tão bem os meus segredos, quando os encontro

custo a acreditar que são meus;

intensos,

exagerados,

inteiros.

Eu os permito serem a mim revelados. Se joguem.

Sim, os meus olhos ainda brilham, apesar das bolsas

que se formam abaixo deles.

Ás vezes, vejo uma gigante;

tenho algumas marcas pra provar,

mesmo ainda não entendendo nada.

Viro-me, vejo uma menina,

que não sabe nada da vida,

deve ser pelas inúmeras vezes que me encolhi;

eu me guardei demais, me protegi e me esqueci.

Mas a sensação de lembrar-me, agora me potencializa.

Tropecei no espelho, encarei o medo e incontáveis receios;

precisei deslizar pelo meu corpo,

curiosamente cheio de medos bobos,

ardentemente cheio de desejos loucos;

e essa magia me fez distribuir muito bem,

os meus frágeis quilos que me pesavam tanto.

Eu escuto alguém dizer,

que já não tenho idade pra isso ou aquilo;

meus lábios sorriem quando percebo

que essa voz entra por um e sai por outro ouvido.

Eu sorrio pra lua.

Faço desenhos com as nuvens.

Me lavo com a chuva.

Transporto-me com uma música.

Acaricio meus pés na grama.

Beijo demoradamente.

Amo intensamente.

Choro com exagero.

Eu tenho medos.

Cuido com zelo.

Sou uma maluca.

Sou brega.

Sou careta.

Sou descolada.

Eu me atiro.

Me recuo.

Dentro de mim, mulher, tem muitos mundos.

Todos os dias, quando abro os olhos

fico extasiada quando me olho.

Sou tão minha,

pronta pra me entregar de novo.

Eu me dei de presente

quando o ponteiro chegou nos 30 e poucos.

Jusci Loiola
Enviado por Jusci Loiola em 01/11/2017
Reeditado em 29/03/2020
Código do texto: T6158993
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