Sobre ser-se.
Por exato, a vida não é a mesma. Deturpadamente vemos o outro como figura nossa. A alegoria da vida nos passa pela imagem de que os outros nos tem. Embora pareçamos nos ser, estamos constantemente limitados ao que os outros nos imaginam; ao que nos é consagrado. Ser é limitado. Mas, ainda que por isso, tenho em mim o gosto e admiração pela palavra dita brutalmente, pela carne crua que dilacera a voz do meu falso ser. Elas, verdadeiramente, não me alienam por aquilo que sou, por aquilo que tenho e posso ter. Posso, na medida em que ouço o que é me hiato. A partir disso, nasce minhas ideias, o meu ser; único e particular, que vive em vista da internalização do contrário, das possibilidades da contramão. Viver conforme o que se diz, sendo este, o que se quer ouvir, gera erro contra nós mesmos e nos faz caminhar pela superficialidade da vida, gerando uma criação desumana do grito articulado que não me é exterior por medo do vácuo profundo em que me insiro, no qual , meu som, não pode ultrapassar. Ouvir a palavra não dita, o verbo não conjugado, me faz ser pleno de mim mesmo, excluindo toda a inanidade que se vive. Eufemizar a vida é, pois, torná-la aprazível à minha noção do que não sou. Lembro-me de ter interdito a maneira que sou na medida que me achei em sociedade. Logo eu, que gosto, por vezes, de me refugiar no abstrato das coisas.