Tortura

. A lua alta alumia pelas frestas o corpo caído e respirando na cela imunda, os olhos sanguinolentos procuram por respostas escondidas em entranhas machucadas. No céu o pai observa o filho como um carrasco, o coração quer chorar, mas o dever tem que ser mais forte. Sentia em cada pancada que recebia uma grande pena de seus agressores, como eles estavam perdidos por ideologias e escravizados pelos prazeres do mundo, estavam todos cegos, o orgulho dos poderosos os hipnotizavam. As distorções eram imperceptíveis, depois de serem enganados por muito tempo, já não percebiam os erros, a mentira era mais importante do que a verdade, ele perceberá que a palavra não valia mais nada.

Uma dor o afligia, uma dor que jamais sentira, essa dor era muito difícil de curar, pois essa dor era a da revolta. Um grande ódio se apossou de seu corpo. Pensou porque ele precisava passar por aquilo? O que ele fez? Apenas ajudou os pobres. Pobres que agora ele acreditava eram mais ricos do que seus agressores. Teria ele o direito de se revoltar? Pensou muito remoendo duvidas e chorou, pois os homens estavam perdidos num ódio de sua ignorância. E o pior, não enxergava isso. Ali caído naquela cela imunda pensou em se revoltar, mas sentia que esse seria o caminho mais fácil, tinha algo dentro de si que fazia com que amasse a todos. Levantou-se e deixou que os raios da lua lhe alumiassem, depois orou e sentiu uma grande misericórdia, sentiu.

uma força interior muito grande se purificou de pensamentos ousados e aos pouco se acalmou e aceitou seu destino.

Lá fora em seu trono o general sorri se sentindo mais forte, de repente uma angustia se apodera de seu corpo, e seu choro abre caminho, ninguém entende, todos correm até ele, mas ele os rechaça com brutalidade.

A mãe chora rodeada pelos amigos, todos estão perdidos caminhando pelos cantos estéreis do lugar como que suplicando pela liberdade do Justus. O fogo se alastra por sobre os barracos trazendo sobre eles o cheiro de plásticos e carnes se queimando, os guardiões ditam ordem batendo em cristãos desamparados e tristes. Grandes dragões de fogo espantam os últimos moradores que correm com suas crianças e seus pertences. Amontoam-se sob viadutos e guetos, algumas mulheres fortes ajudam os mais fracos. A miséria da perda traz sentimentos solidários. Enquanto alguns rezam outros choram tristes e só.

Os gritos do general ecoam nos ouvidos de Justus sem clemência. Seus braços e pernas amarrados e sua mente pendente ali naquela cadeira de aço escovado. A morte está ali à espreita ela chega e entra em seu corpo, ela vai ser explicita, ela vai ser colocada por um jovem menino de olhos azuis, um Gabriel de cabelos longos, ali na frente de todos, me despem e o jovem Gabriel de olhos azuis com modos, se achega sem cerimônia me injetando a morte de maneira dolorida e sem volta. Sim esse Gabriel não traz a boa nova de um nascimento, mas sim ele traz a morte. Caído ali olho para todos que escarnecem de mim, o belo Gabriel se afasta, Justus sorri e pensa nos seios de sua mãe, sim foi lá que tudo começou como eram belos aqueles seios, ele se.

amamentou e cresceu com aquele leite. O jovem se veste e sai com os olhos do mau e o coração sem esperança. Sinto que a morte caminha dentro de mim, amiga dos glóbulos numa suave cumplicidade. O general empurra Justus para fora.

Ele caminha solitário pela cidade cinzenta e triste. Solitário compreende a mensagem do pai. O amigo amado chora ao vê-lo. A mãe e os amigos o abraçam chorando. Ali naquele mundo de esfarrapados e sem esperanças ele era o rei, seus olhos voltam a brilhar e seus amigos se animam. A fraqueza de dias nas masmorras se faz presentes em dias frios.

O tempo não perdoa nada, deixa todos amortecidos pelos acontecimentos. Alguns ainda lutam.

Natal Cardoso
Enviado por Natal Cardoso em 10/04/2018
Reeditado em 19/04/2018
Código do texto: T6304528
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