Indesejada
Eu queria que você pudesse sentir na minha pele o arder do seu desprezo ano após ano.
O acidente de percurso. A tarde de aventura que interrompeu seus planos. A imagem do seu erro e sua vergonha, ou como você preferiu rotular na véspera de natal ao revelar seu amigo secreto virando os olhos, "a maior surpresa da minha vida’’.
Sabe eu olho pra trás e tento buscar na memória uma imagem que não venha de fotografias, uma memória real onde sinto seu abraço, onde te vejo genuinamente sorrindo pra mim. E não encontro.
Encontro porém seu olhar de desgosto, de reprovação, sempre predisposta a me julgar, “você precisa emagrecer, você está muito magra, quanta olheira, eu não sei o que você quer da vida”.
Sei que soa frase de adolescente rebelde, mais eu sinceramente não pedi pra nascer, e pra ser bem franca, eu nunca te pedi muito.
Voce é esse câncer que eu finjo não ter, que Madalena uma vez disse que eu precisava vomitar se não eu iria morrer. Lembro-me que essas palavras perfuraram como faca.
Queira eu ou não, ela estava certa. Você é essa doença que vem crescendo silenciosamente, que me fragiliza. Que me destrói todas as vezes que eu tento me reerguer. Você me atinge porque vem de dentro.