Piscar d'olhos

Há muito tempo por aqui apareci olhando

montanhas, sanhaços, pintassilgos, beija-flores

beijando bem-te-vis, despencando de penhascos

gorjeando louvores. A pradaria murmurando

o vergel-lilás de suas flores. Era o lugar

que sonhava para os meus amores.

Então nada mais me faltava.

E foi ali que escolhi. O meu

alvorecer era em cores,

a chuva me iluminava,

o sol me inspirava

ao destilar de

deliciosos

licores.

No conforto informal, no

desejo de mais um mortal.

No crepuscular das tardes

de magia, embriagado ao tom

do doirado som a acariciar meus

ouvidos, qual a todos os lados naqueles

dias a mim consagrados. Tudo e a todos tingia.

Nesse mel de melaço, no mais puro regaço que no

profundo minh’alma regava, e me fundia em alegria.

Foram belos os meus dias os quais minha mente

arejava. À rede me embalavam as noites calmas,

meus pensamentos voavam em nuvens alvas.

O meu espírito se projetava além de coisas

humanas. Nas longas tardes de frescor-

rupestre dos fins de semana,

”muito além de Trapobana”,

aliás, estava pra lá de “Pasárgada,

onde eu era amigo do rei” e assim,

muitas vezes, pensei: “Jamais escolherei

qualquer mulher, pois, muito além dessa eu já

tinha, mesmo sendo amigo do rei”, com certeza

de tanta beleza, e convicto de que não a merecia,

por isso foi que não errei! Foi aí que compreendi:

sou um privilegiado e o meu lar construí dependurado

no topo de um monte encantado, porém, alicerçado com

cascalho dali. Belos e floridos jardins, com melífluo odor

de jasmim. Em cima do vale, com minha visão deslumbrada.

Minha família; presença marcada. Parece ter sido ontem.

O tempo passou ligeiro e neste comboio fui passageiro.

Meus filhos se casaram, meus netos se foram...

A minha companheira de tantos janeiros a

partir foi à derradeira, mas partiu pra va ler,

enfim, o meu coração se partiu por inteiro.

Restou-me a oração, pássaros e a canção

do meu velho travesseiro enfronhado de

emoção. Confessor e confessionário

esplêndido cenário passo o tempo

a escrever com alegria e prazer,

como se fora mais um otário

teimando em reviver. Não sou hipócrita

em meus apócrifos. E não quero me enganar.

Aprendi a ver a vida em sua plenitude, encaneci

com saúde e não posso reclamar. Partida é partida.

A existência é efêmera e, nem posso chorar.

Chegamos-voltando à frente de câmeras

registrando os relatos, de fato; relatando

os fatos. Alcovitamos em nossas câmaras,

regurgitamos desagravos ao nosso Criador

Pai. Melhor nos fora juntar os favos da gloriosa

e eterna Paz, do que os trapos que o mal sempre

nos traz. Caro irmão-leitor pense como for, mas,

por favor, não tenha pudor dessa falsa dor com pavor.

Nem seja acre, do seu coração tire o lacre, e no amor

seja craque sem o menor palor. É a realidade da vida, flor

em botão qual murcha dando-nos o seu tom chamando-nos

à atenção. Qual à bucha, com água e sabão, no banho é algo

estranho, verdadeiro estrebucho no antigo corpo de um bruxo.

Às vezes velho-tacanho aos olhos de estranho. Pode ser, mas não

é se ele sabe o que a vida é! Pois, fez-se amigo de tudo e

até da boa solidão, na realidade é sortudo, meu caro-querido

irmão, ele enxerga até pelo pé sendo provecto ancião. Solidão

pode ser desespero ou tempero de se encontrar com o “Eu”

por inteiro. “As aparências enganam”. A solidão pode ser uma

ótima companheira. Essa amiga vem para burilar a nossa alma

dando-nos a condição de vencermos a nós mesmos, já que o

nosso maior inimigo está no interior do nosso coração o qual

deve ser cinzelado com o amor da mansidão no universo dessa

eterna imensidão. Na realidade o meu coração mora nos universos

dos universos juntamente com o seu.

Esta historieta faz parte da vida deste modesto amanuense...

Muita paz e amor à sua pseudossolidão.

jbcampos
Enviado por jbcampos em 07/06/2018
Código do texto: T6358160
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