Sobre o amor em mim

Era algo grande, ocuparia tranquilamente um prédio inteiro, me preenchia, eu transbordava todos os dias com aquilo, enchia meus sorrisos e já não havia mais espaço para aqueles vazios. Nós alimentávamos a cada dia aquele sentimento e ele era cada vez maior, já tomava um quarteirão, nem de vizinhos eu precisava, porque eu estava cheia. Então, um dia você chegou e eu já estava esperando para alimentarmos aquele sentimento e você disse num tom seco: hoje não. Eu não entendi o motivo, mas o alimentei sozinha, ele ficou com fome, esperando mais, eu não podia lhe dar mais porque já tinha dado tudo que eu tinha. Passaram-se alguns dias e ele já estava faminto, dei mais um pouco e você de novo disse que não. Fiquei chateada, segui em frente. Na semana seguinte, foi a mesma coisa, mas o sentimento tinha fome e a cada semana se parecia mais com um monstro, ele devorava tudo que via e pedia comida para todos que passavam, eu continuei a alimenta-lo com tudo que eu tinha, até que um dia a fome era tão grande que ele me engoliu, foi bem rápido, mas muito doloroso, ele não me mastigou, mas fui esmagada e fiquei lá dentro até ser digerida, mas por algum motivo ele não conseguia, passaram-se semanas, eu mal via o mundo lá fora, não escutava ninguém, estava presa no monstro que eu mesma criei, você já nem ia mais visitá-lo, sem alimento ele foi diminuindo, até que um dia fui vomitada, foi bem nojento, mas já estava ficando sufocada, eu mal cabia lá dentro de tão pequeno que ele havia se tornado, eu parei de alimenta-lo para que ficasse cada vez menor, até que um dia ele não diminuia mais, peguei uma caixinha que cabia na minha mão, soquei-o lá dentro sem pensar muito para não sentir tanta dor, fiz ele caber e o tranquei. Hoje eu guardo ele onde ninguém pode encontrar e se me perguntarem sobre ele, direi que nunca existiu, mas só eu sei que quando te vejo ele se agita tanto que prece que vai sair da caixa, mas eu farei de tudo para mantê-lo sempre trancado em mim