A poesia
Quando já não consigo olhar o mundo com os olhos simples e lineares do cotidiano, a poesia consegue me manter lúcida, assim consigo seguir com um pouco de esperança, e então Ariano vem me dizer: "...vê-se, aqui, quem, na vida, bravo, ardente e indeciso, sonhou."
Quando os meus olhos já incharam de tanto chorar por minhas mazelas e pelas mazelas do mundo, a poesia torna-se a sustentação e traz o equilíbrio necessário para que continue a trilhar, então Vinícius assim me diz: " ...porque eu encostei a minha face na face da noite e ouvi a tua fala amorosa..."
Quando não consigo encontrar luz no arco-íris e beleza no crepúsculo, recorro à poesia, alimento-me de Pessoa, e sinto meu sangue novamente correr límpido em minhas veias: "Falhei em tudo. Como não fiz propósito nenhum,talvez tudo, fosse nada."
Quando a dor pungente dilacera minha alma e torna-se física e inconveniente, atrapalhando o meu curso, a poesia transforma-se em alento e remédio salutar...recito Camões: " Dor que desatina, sem doer..."
E quando essa alma já devastada pela angústia, pela melancolia e pela solidão transforma o coração e faz com que ele pulse de forma desconexa, vem o Poetinha e diz: "Resta essa faculdade incoercível de sonhar, de transfigurar a realidade, dentro dessa incapacidade de aceitá-la, como ela é..."
E, finalmente, quando a dor e a saudade definitivamente tomam morada em meu peito, somente o maior de todos, consegue trazer à tona minha emoção e compreender o vazio da ausência: " Quem foi que o beijo me embalou da infância / Entre as doçuras que do empíreo vêm?/ E nos beijos da célica fragrância / Velou meu puro sono? Minha mãe! / Se devo ter no peito uma lembrança / É dela que os meus sonhos de criança / Dourou..." (Machado de Assis).
E assim, sigo, sonhando...
E assim, sigo, poetisando...
Sigo, vivendo...