Resiliência

Um suicídio uma traição uma separação. Assim nessa ordem, sem vírgula, sem tempo pra entender, sem pausa pra respirar. Três raios caindo no mesmo lugar, na minha cabeça. Três pilares desmoronando na minha frente: a vida, a confiança e o amor. Tudo em ruínas e eu só podia ficar e ver a poeira subir.

Todos nós atravessamos pontes na vida, toda fase prepara para a seguinte, todo processo leva para o próximo. Naquele momento minha ponte estava ali, destruída, e eu me via em suspenso, sem ter onde segurar, sem poder voltar de onde eu vim, e sem a mínima condição de chegar aonde eu ia, só me restava parar e esperar a queda, torcendo pra que depois dela ainda restasse algo de mim.

E a queda aconteceu, foram meus dias de piloto automático, que são só um borrão na minha memória, lembro de acordar, mas não de dormir, sem conversas, sem diálogos, uma caixa vazia guardada nos arquivos dos acontecimentos que eu sou.

Mas é aí que a gente conhece a tal resiliência, essa palavra bonita e clichê que todo mundo espalha por aí, essa capacidade de se erguer depois da queda, de juntar no meio dos destroços o que ainda serve e seguir em frente, de pegar os nossos pedaços que estão jogados por ali e se refazer do melhor jeito possível. Por mais que ainda doa, a gente faz uns curativos na alma, esconde umas feridas, e se torna uma versão melhor do que era, mais forte, mais bonita, mais completa, porque a gente sabe o que merece, sabe que tudo é finito, e aprende a não depender de muita coisa. A vida continua, a confiança outra pessoa ganha e o amor aparece quando a gente estiver pronto. A gente não volta à estaca zero pra começar tudo de novo, mas recomeça de algum ponto onde algo deu certo com tudo que a gente reuniu até ali, e refaz a ponte, ou faz uma escada, o importante é não continuar no caos, nos escombros, sendo soterrado.

Até que a gente percebe que o raio pode até cair na gente de novo, mas quando e se isso acontecer, não vai causar tanto estrago.