Escalando o Monte

Atenção: estes textos são de minha autoria. Estes textos são histórias de momentos que vivi quando mais jovem.

Escrevo apenas para investir o tempo que tenho sobrando em algo produtivo e quem sabe entreter alguém que goste de histórias simples como eu.

Se você leu meus textos anteriores, já está familiarizado com o tipo de texto que posto (memórias da minha infância e adolescência) e sabe que essas histórias se passam em um povoado chamado Carnaúbas na zona rural da cidade de Aracoiaba, no Ceará, onde morei praticamente quase toda a minha vida. Nos textos postados anteriormente por mim, dou mais detalhes sobre o lugar. Se te interessar, leia os outros três textos que postei antes, você não vai ficar tão perdido. Você também pode ir embora sem ler nada.

Hoje irei contar a história da primeira vez que escalei um certo Monte que ficava próximo da minha casa, a exatamente um quilômetro e meio dela, para ser mais preciso. Foi uma aventura e tanto. Nesta época, eu tinha uns 12 anos. Eu lembrava que desde de que meu cérebro começou a me disponibilizar inteligência suficiente para compreender histórias contadas por adultos, que eu escutava histórias sobre um certo monte da região, que se escalado, presenteava o escalador com uma visão panorâmica espetacular de toda a região. Lá de cima você teria uma visão muito bonita das serras, da vasta mata da região, dos campos, das plantações e das comunidades que rodeavam o Monte. As pessoas chamavam o Monte de "Serrote", sim... Isso mesmo, o nome do monte era esse. Eu não sei o porquê e muito menos sei quem começou a chamá-lo por este nome. Mas era assim que as pessoas o chamavam. Ele não tinha o formato de uma serra ou algo parecido. Ele era um amontoado de terra e pedras enormes, sabia disso porque já tinha passado muitas vezes próximo a ele, porque meu pai era agricultor, e o campo de terra que ele plantava ficava atrás do Serrote. Para chegamos ao campo do meu pai, era preciso contornar o Monte Serrote por uma estrada de terra.

Eu desde de muito novo frequentava aqueles lugares, pois quando tinha meus 5, 6 anos, costumava ir com meu pai e meu irmão apanhar castanhas e cajus em alguns cajueiros que meu pai tinha no seu campo de terra que ficava depois do Serrote. Eu lembro que todas às vezes que eu estava voltando para casa e chegava na parte do caminho na qual era possível vislumbrar o monte, ficava de boca aberta, imaginando como seria lá em cima. Mesmo muito criança, eu sempre fui muito curioso. Então eu fui crescendo e escutando meus amigos, da minha idade, todos comentarem como já tinham ido no serrote e como era incrível a vista lá de cima. Eu ficava com vergonha de dizer para eles que aos 10 anos de idade, e já tendo passado uma centena de vezes próximo àquele monte, eu nunca o tinha escalado.

Então um dia, eu resolvi pedir ao meu pai para que ele me levasse ao serrote, e ele disse que sim. Que me levaria. Eu fiquei muito entusiasmado. Minha mãe jamais me deixaria escalar aquele monte sozinho, aos 10 anos, por ele ser muito alto, e o caminho de subida em algums pontos ser íngreme e extremamente irregular. Era realmente muito perigoso.

Então, fiquei esperando o dia em que meu pai me levaria para a escalada. E nisso, um ano se passou. Eu já tinha onze, e nada de subir no Serrote. Ficava só na imaginação. E então passou-se mais um ano. Eu cheguei a conclusão de que meu pai nunca me levaria mesmo para subirmos juntos o Monte. Então resolvi bolar um plano para escalá-lo sozinho. Uma certa tarde, aos meus doze anos de juventude, resolvi falar para a minha mãe que iria até as nossas terras que ficavam do outro lado do serrote, porque fazia tempo que eu não andava para aqueles lados da região (isso era verdade), e gostava de estar naquele lugar, por ter passado muito tempo da minha infância trabalhando por àquelas terras. Ela concordou, era começo de verão. Por volta do mês de junho, quando as matas estão começando a secar mas ainda conservam bastante verde. Eu tinha ocultado da minha mãe, uma parte precípua do meu planejamento para aquela tarde.

Eu iria às nossas terras, mas na volta, pela estrada de terra, viraria à esquerda e tomaria o caminho do serrote. Sim, você pode julgar que fiz algo errado ao ocultar isso, e se eu sofresse um acidente na subida? mas sinceramente, não me arrependendo de nada. Então às 14 horas, aproveitando que o dia estava parcialmente nublado, ou seja, com o sol frio, parti para a minha aventura. Eu sempre gostei de caminhar sozinho, especialmente por aquele caminho cuja a arborização ficava por conta da caatinga fechada da nossa região. Gostava de ficar pensando na minha vida enquanto caminhava. Então, após um quilômetro e meio andado. Eis que chego na parte do caminho na qual dava para se ver o serrote. Ele ficava à direita do caminho que levava às nossas terras. Eu fiquei olhando, e refletindo. Se seguiria em frente, cumprindo assim o que tinha falado para minha mãe e na volta tentaria escalá-lo, ou ia de encontro à escalada de vez. Decidi escalar e deixar a visita ao campo de meu pai para o futuro. Detalhe, meus amigos comentavam que costumavam usar uma vereda (trilha dentro da mata fechada) para chegar ao pé do monte e começar a subí-lo, mas eu não fazia a mínima idéia de onde ficava essa tal trilha e depois de um tempo, resolvi pegar um atalho pela mata, porque eu não sabia onde ficava a trilha, mas sabia onde ficava o serrote.

Então depois de lutar contra uma horda de árvores de tronco fino, plantas variadas e vegetação rasteira, cheguei ao pé do Serrote. Sua parte de baixo era composta praticamente toda de afloramentos rochosos, sólidos e em alguns pontos muito íngremes. Eu não saberia dizer exatamente o tamanho do serrote de uma ponta a outra, ou quanto ele tinha de altura, mas ali no pé daquele bicho, aos 12 anos de idade, eu me amedrontei. Mas não tinha o que fazer, eu já tinha ido até ali, continuaria. Então comecei, passei por algumas juremas, tomando cuidado com seus espinhos e escalei a primeira pedra, até com facilidade. Agora eu estava a uns 3 metros do solo. E já tive um baque, já dava para ver um bonita paisagem da onde eu estava. Imagina lá de cima? Fui subindo devagar, escolhendo os melhores lugares para ir caminhando, evitando os espinhos e as pedras, até que cheguei na metade. E aí me permiti contemplar a paisagem. Meu coração, ficou acelerado, deu até um suor frio. Mas era lindo. A imensidão de árvores era algo realmente arrebatador.

Então o choque passou, e eu continuei, e continuei. E cheguei ao seu topo. E foi lindo. Lá de cima dava para ver todo o povoado vizinho ao povoado que eu morava, as serras, a Pedra Aguda (montanha símbolo do município em que eu morava muito parecida com o formato de um vucão), a Tamanca (montanha também da região que era popularmente conhecida assim pelo seu formato semelhante ao de um sapato emborcado), o rio. O vento forte batendo em meu rosto. Se no princípio, lá embaixo eu tinha me sentido pequeno, naquele momento, no pico daquele monte, eu me senti um gigante. A Paisagem era deslumbrante. Eu confesso, até ali, era uma das coisas mais bonitas que eu já tinha presenciado.

E eu estava deveras contente comigo mesmo, por ter conseguido escalar finalmente aquele monte, aquela parte folclórica do meu povoado, que eu vi tantas vezes, só de fora deste a tenra idade. Se eu tivesse feito isso com outra pessoa, provavelmente não teria tido o mesmo efeito sobre mim. Eu estava me sentido muito bem comigo mesmo. Foi épico. Então eu tinha que voltar... Voltar para minha vida normal, monocromática e monótona. Mas eu não queria ir. Achei aquilo tudo tão incrível que por mim o mundo poderia acabar ali. Mas eu voltei. Despedi-me temporariamente daquela paisagem, dos rochedos, dos espinhos e da imensidão de árvores e fui descendo, fazendo o mesmo caminho que fiz na subida para descer. Eu sabia que iria voltar inúmeras outras vezes no futuro, e de fato isso aconteceu, inúmeras vezes sozinho, dezenas de vezes acompanhado. Mas aquela primeira vez foi épica. Foi realmente inesquecível. Só contei minha mãe sobre o meu feito meses depois. Guardei por um tempo apenas para mim a lembrança do dia em que escalei o Serrote. Não contei nem mesmo para os meus amigos, para os quais eu poderia me exibir. Algumas lembranças a gente guarda no coração, e a primeira vez que subi o Monte Serrote com toda certeza é uma delas.

Costa Joel
Enviado por Costa Joel em 11/04/2020
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